196 - Quarentena
Chegou aqui depois de muito tempo. Recordava-se de coisas menos importantes que poderiam até ser memórias falsas. As certezas, com contornos seguros, dão-na a resistir a entrar na Escola. Depois sabe-se vaidosa, a orgulhar-se dos seios, a provocar com o olhar, a sentir que ninguém a merecia, que todos tinham algum defeito inibidor, que ainda era nova e poderia esperar outra cor e novo mar. Um dia, deu consigo numa maturidade vazia. Aceitou entrar no que achou ser o seu último barco que afinal não seguia para férias. E gastou-se. Filhos que descuidou, marido alheio, casa de quadros tortos e sem livros, seios flácidos, saúde instável. Ainda esperava por ser a única coisa que fizera para iludir o tempo. Muitas vezes não sabemos que maré nos cabe e não vamos, outra vezes embarcamos para o destino errado e temos medo de voltar por ser o regresso tão incerto como a vinda, por ser esta mediocridade o lado mais seguro para estar ao abrigo dentro da nossa cadeia.