MEU CONTO OU VOCÊS CONTAM?

Desde que conheci a internet, na casa de minha avó, em Porto Alegre, onde eu passava minhas férias, percebi que era algo que revolucionaria as relações a distância, ou seja, tudo mudaria. Não tinha nada disso em minha cidade que era o interior dos interiores, então com certeza demoraria muito para chegar todas essas novidades. Tive contato real com tudo isso, quando fui estudar em outra cidade e cursar informática; desde o começo percebi que estar em uma cadeira em frente de um monitor não era o que queria da vida. Olhava para os lados e só via parede. Ora, eu guri do interior ficar preso que nem passarinho em gaiola? Aguentei um dos três anos que demoraria o curso, fui reprovado e desisti, voltei para o meu mundo real.

Sempre demorei para entrar em redes sociais, todos tinham o ORKUT, fui o último dos amigos. Depois Facebook, WhatsApp, Twitter e tudo mais dessa tal facilidade que nos vendem até hoje, também relutei, mas aderi. Sabe quando na infância, todos no seu grupo de amigos fumam? Sim, fumei também, não porque gostava, mas para me sentir igual.

O mais interessante é quando alguém pergunta se tenho Instagram, digo que não e automaticamente recebo um olhar fulminante e como se eu tivesse uma doença contagiosa é lançado sobre mim e o questionamento maior é “como vê lives?”. Simples… Não vejo, na verdade, quando alguém me convida, dou um jeito, mas normalmente assisto depois.

Com isso que falei quero explicar o porquê de minhas dúvidas e questionamentos dessa facilidade que temos de fazer amigos de outras partes do Brasil e até do mundo, mas também dos perigos que nos aguardam do outro lado.

A História:

Conheci através de um Blog que escrevo, dois escritores de São Paulo, logo trocamos WhatsApp e começamos a trocar ideias sobre escritas e tudo mais. Depois começamos a trocar fotos e histórias de vida, tudo muito legal, é bom conhecer pessoas novas.

Tudo certo, mensagens de áudio, interações no ‘blog’, trocas de experiências, ajuda nos textos, enfim, vida normal. o trio estava formado, Daniel, Leandro e eu.

Em um desses comentários sobre a crise, falta de trabalho e principalmente a escassez de dinheiro, conversando com o Leandro Severo, o mesmo me convidou para passear em sua cidade, ele teria ganho um prêmio, que gostaria de dividir comigo e disse que Daniel estaria lá também. Bem, se é assim, de graça, vou.

Não tinha dinheiro, mas teria onde ficar. Já passei por São Paulo, mas conheci quase nada, dessa vez iria desfrutar dessa cidade tão conhecida mundialmente. Perguntei ao Leandro se sua mãe se importaria, mas ele disse que ela ficaria feliz com minha visita. Então fui.

No dia da viagem, peguei um ônibus, fui para o aeroporto, comprei a passagem com dinheiro emprestado por outro amigo, pois o Leandro disse que reembolsaria lá, e embarquei. Antes da decolagem, mandei uma mensagem para o Daniel, dizendo que estava a caminho, ele respondeu com emogi de sorriso. Desliguei o celular, preparei a poltrona, abri o livro 'Social Killers.com' de RJ Parker e JJ Slate, não é meu estilo favorito, mas era o único que estava em minha bagagem de mão. Adormeci com o livro em meu rosto. Acordei e percebi que não havia lanchado o que era servido no avião, e quando abri a caixinha que tinha sido deixada no meu colo, vi apenas uma caixa de fósforos, achei estranho, mas alguém me sacaneou.Chamei a comissária de bordo, questionei, solicitei outro, mas ela disse que era um por passageiro. Não iria fazer escândalo, então amassei a caixa, peguei os fósforos, coloquei no bolso e desisti.

Do auto falante o comandante avisou que estávamos preparando para pousar, minha primeira viagem aérea tinha sido ótima e sem turbulências, o que na verdade esperava que tivesse acontecido, só pra ver como é. Desci do avião, fui pegar minha bagagem e esperar que algum deles estivesse me esperando, conhecia seus rostos, então me pus a procurar. olhei para os lados, caminhei em direção a saída, mas não enxerguei ninguém, liguei o celular e havia umas trinta mensagens do Leandro e mais outras várias do Daniel.

Quando fui preparar os áudios, eis que um homem grande, todo de preto, e bem-vestido chegou ao meu lado e perguntou:

— Cristian Canto?

— Sim! Sou eu. — Respondi.

— Acompanhe-me, meus senhores o esperam.

Eu ri, imaginei que o prêmio do Leandro teria sido muito bom mesmo, havia montado um teatro de terror para me esperar, achei legal a atitude, mas me surpreendi mais ainda quando vi a limousine que me aguardava.

— Ah, sério! Tudo isso para mim?

O homem apenas meneou a cabeça positivamente e abriu a porta para que eu entrasse. Perguntei o nome do nobre motorista e ele respondeu:

— Meu nome é Daniel.

— Ta bom! Só falta dizer que seu sobrenome é Batista Andrade?

Ele riu e fechou todas as janelas do carro e um gás começou a surgir de pequenas fissuras do assoalho. Gosto de suspense, mas não precisava gastar tanto dinheiro comigo, porém, meus olhos começaram a lacrimejar e doer, meu coração parecia que saltaria da boca e desmaiei.

Acordei em uma bela sala de uma mansão, sentado em um grande sofá de veludo azul cercado por obras de arte moderna e cabeças de animais empalhados. Comecei a rir novamente, tudo estava perfeito, eu estava dentro de uma casa de contos de terror. As dúvidas voltaram a pairar em minha cabeça quando o motorista entrou na sala dizendo:

— O que achou da recepção, Cristian?

— Muito real. — Respondi.

— E ficará mais real ainda, lhe apresento o leandro Severo II.

Eu o olhei para aquele homem alto, muito branco, sem nenhum fio de cabelo na cabeça e com cara de poucos amigos e mais uma vez caí em gargalhada, e ele sem muita paciência, apenas gritou:

— VAMOS ACABAR COM ESSA PALHAÇADA!

Eu Calei imediatamente e ele continuou:

— Sim, Te trouxemos aqui para terminar com mais uma farsa, sou o Leandro Severo II e ele que você achou ser o motorista é o Daniel Batista Andrade.

— Como assim? — Questionei.

— Exatamente isso, vamos parar com essa conversinha sem rumo, conseguimos te enrolar direitinho e te trazer para cá. Somos caçadores de escritores ruins. Quem você pensa que é para escrever aquelas loucuras que tu chamas de conto e postar para os outros lerem? Tenha a santa paciência. Ninguém merece aquilo.

— Então quer dizer que não é piada. — Perguntei já com lágrimas nos olhos, e completei: - Se for, ta muito bem feito, parabéns.

Nisso o primeiro homem, que era o motorista, mas agora eu já estava acreditando ser o Daniel ligou um monitor e começou a mostrar minha escrivaninha no Blog e sem pestanejar, apagava um por um dos meus textos.

Naquele momento não importava mais nada, se eles tiveram acesso a minha senha, parecia que era tudo verdade.

Começaram a comentar meus textos, falando que não sabiam a razão das leituras, e que eu estava pagando pessoas para os lerem.

Eu dizia que não, e que inclusive hoje teria lido alguns textos deles e que gostava realmente do que lia e como eles podiam ver, eu era eu mesmo.

Daniel olhou em meus olhos, não o reconhecia, tudo que eu conhecia era a foto das redes sociais, do blog e a sensibilidade poética que ele carregava, o que nada parecia naquele cara sisudo e de barba mal feita que me olhava com cara de reprovação balançando a cabeça negativamente e andando de ponta a ponta naquela longa sala.

Quando eu tentava buscar algo para falar ele disparou:

— Gosta é? Então fala o nome de alguns de meus textos.

Minha memória é péssima e com essa pressão toda, lembrei apenas dos contos de terror, sabia que ele escrevia várias categorias, mas nada vinha a minha cabeça e disparei:

— Azevinho e Repetentes.

Eles me olharam e riram muito e quando pensei que a calma voltaria a reinar, Leandro mais uma vez gritando disse:

— Esses não valem, era obrigatória a leitura, e os meus, qual você conhece?

Sem lembrar de nada comecei a pensar pedindo ajuda aos anjos e principalmente a meu cérebro que não lembrava de nada. Até que saiu um som de dentro de mim, dizendo:

— Pó de giz e… e…

Daniel interrompeu:

— Obrigatório não vale, competição não!

Eu não estava amarrado, não estava sendo agredido, e nem tinha uma arma apontada para minha cabeça, mas não tinha reação, era tudo muito bizarro. Eu sentia muito medo, aqueles dois que eu chamava de amigos, estavam querendo terminar com meus textos, parecia que era o objetivo de vida, algo que finalmente eles estavam concluindo.

— Vamos Cristian Canto, conta um conto. Disse Daniel agora com um copo de suco sem gelo na mão e debochando de mim.

Leandro fazia o mesmo, mas nesse momento estava virado para um lindo e gigante quadro com a imagem de uma bela praia. Ele fitou seus olhos nos meus e disse:

— Eu não minto, eu nunca estive lá, mas depois que te elimináramos, vamos tirar férias em Cancún. Merecemos!

Eu mais que depressa perguntei:

— Eliminar? Vocês vão me matar?

— Não! Não somos assassinos, deixa de ser idiota, se usasse essa imaginação pra escrever, talvez a história seria outra, e preste atenção: Estamos aqui para tirar de sua cabeça a ideia de escrever. — Disse Leandro.

- Mas porque eu? Sou só um amador. — Questionei.

Nesse momento Daniel veio em minha direção parecendo que iria me bater, mas parou encostando sua mão em meu ombro e disse:

— Amador? Amador? Você é uma fraude, e pelo que estamos investigando… O último.

Agora o desânimo entrou como uma flecha em meu coração. Olhei para o monitor e perguntei se podia fumar um último cigarro lendo algum conto que eu havia escrito e eles disseram em coro:

— Que seja o seu último desejo, e de hoje em diante não irá escrever e nem postar mais nada.

Ouvindo aquilo e percebendo meu fim, levantei do sofá, fui em direção ao monitor, cliquei em rascunhos e comecei a ler um texto que ainda não postei, mas foi o que mais fiquei feliz de finalizar. Coloquei a mão no bolso, tirei o maço de cigarros, pedi fogo e eles riram dizendo que não fumavam. Lembrei da caixa de fósforos que ganhei no avião, tirei do bolso, os dois me olharam com semblante de medo e apavoramento e quando correram em minha direção, risquei o único palito que restava, desejando que tudo fosse um mal-entendido ou um sonho bobo e que eles voltassem a ser como eu imaginava.

Um clarão tomou conta do ambiente, meus olhos fecharam automaticamente e quando os abri, já estava de volta a frente do computador, em minha casa e escrevendo mais um conto. E que com certeza irei postar!

Para ter certeza de que tudo voltou ao normal, e descobrir se era verdade ou conto, espero que meus amigos, Leandro Severo e Daniel Batista Andrade comentem.

Abraços mil.

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Conto criado a partir do desafio entre meus amigos recantistas Leandro Severo II e Daniel Batista andrade.