NÃO APOSTE A CABEÇA COM O DIABO
Certa vez um amigo meu,
Apostara com o matreiro diabo,
Dizendo: - Dele ganho eu
No pôquer, gamão e até no dado
Era um libertino já bem sabia
E nas mesas de carteado,
Sempre com trapaça ganharia
Na aposta com o diabo!
Sem relutar ele sempre fazia,
Disputas que tenham certa aposta
Até com o capeta celebraria,
Caso recebesse uma boa proposta!
Uma noite, ainda lembro-me bem,
O fato narrado enfim ocorreu,
Algo tão macabro e digo-lhe além
Minha mente nunca esqueceu
Caminhávamos por essa rua deserta
Com o luar pelo meio fio,
Senti a vibração do mal que desperta
Senti com medo o arrepio
Um senhor com seu traje abastado
Fitou meu amigo ao passar,
Observando-o ao muro recostado,
E pôs-se então ao dialogar:
- Estive alguns minutos só olhando
Que o muro desta mansão
É alto e aos poucos se vai elevando
Não se pode pular o portão!
Meu amigo de imediato redarguiu,
Respondeu com muito prazer,
Com malícia no olhar assim sorriu
- Certamente é fácil de fazer...
- Mas digo-te o seguinte,
Que nunca meu senhor se esqueça
Com todo esse requinte,
Até com o diabo aposto a cabeça!
O velho disse: façamos o trato
Se perder sua cabeça será meu troféu
Creia ser piada esse meu fato,
Mas eu hei de guardá-la no mausoléu
Disse meu amigo: - Pois assim seja
Eis aqui vinte reis de libra,
Poderá meu jovem, beber a cerveja
Nesta sua alma que vibra!
Então volvi os olhos e lhe disse,
Que ao pular sobre esse vão tão fundo
Não cresse tanto em sua crendice
Caso caísse seria apenas outro defunto
De nada adiantou eu lhe alertar
Ele sempre seguira sua insana intuição
Correu e com esforço ao pular,
A taquicardia aumentou a transpiração
No ar rodopiou aquele corpo,
Em certo instante o pulo não terminou
Na lança jazia como um morto
Quando por fim a cabeça se deslocou
Naquele momento pude claro ver
Que aquele velho de terno com o cajado
A cabeça retorcida viera recolher
E percebi que era a encarnação do diabo!