MEU FILHO!


    Estou desesperado! Não sei mais o que fazer ou a quem recorrer. Desde que meu filho Marcelo foi encontrado depois te ter sido raptado ele não é mais o mesmo!

    A polícia me contou que ele foi resgatado com outras crianças que teriam sido sequestradas por dois indivíduos já suspeitos de rapto de crianças e até pedofilia, que foram encontrados mortos próximos do local do resgate do meu filho, num furgão. Como os sobreviventes são apenas crianças, as versões do que ocorreu são contraditórias. Até hoje eu não entendo lá muito bem o que realmente aconteceu. Ao menos nós agora estamos junto do nosso filho!

    Só sei que Marcelinho não foi mais o mesmo depois daquele incidente. Ele ficou cada vez mais calado, ficou muito mais sensível à luz, irritadiço e com espasmos musculares eventuais. Sua pele foi ficando com manchas avermelhadas irregulares, tendo também ansiedade, febre e delírios cada vez mais frequentes.

    Os primeiros médicos disseram que isso poderia ser o efeito psicológico do que ele poderia ter passado, sendo isso somatizado no corpo do meu filho. Tentamos terapia, mas se ele não falava nem conosco, que somos o pai e a mãe dele, tampouco se comunicava com o terapeuta! Nesse meio tempo, os espasmos pioraram e passaram a ser generalizados. Meu filho começou a ter convulsões, além de ter uma salivação intensa.

    Os médicos suspeitaram que fosse raiva. Mas que o desenvolvimento da doença já estava muito avançado para darem as injeções, que são o tratamento convencional. Conversei com alguns contatos da firma e, enfim, uma empresa médica nos ofereceu uma possibilidade de cura, a custo zero, com um tratamento experimental que já teria salvo alguns casos mais graves. Era isso ou ver o nosso filho morrer de forma pavorosa, em sofrimento severo.

    Assinei a papelada. Fui cientificado de que ele seria mantido em isolamento, em sedação profunda e respirando por aparelhos. Foi um grande choque para nós ver ele em uma cama hospitalar com tantos tubos enfiados em seu corpo frágil!

     Semanas se passaram. Após os primeiros dias, nós sequer podíamos visitá-lo.

     A mãe dele preferia assim. Ela não aguentava a imagem de ver seu filho entubado e praticamente apodrecendo em vida naquela cama.

    Eu estava estranhando aquilo tudo. Já fazia quase um mês e os médicos não nos falavam nada, quando se manifestavam usavam frases genéricas e termos que mal compreendíamos. Estava cheio daquilo. Hoje eu iria ver o meu filho!

   Eu me lembrava muito bem do quarto em que meu filho fora isolado no Hospital Regional de São Cipriano. Eu iria aproveitar a folga do trabalho e forçar a minha entrada lá. Por bem ou por mal!

    Então, fui para lá tentar conversar com a atendente, que me indicou uma salinha e que, em breve, o médico responsável iria me ver. Esperei por meia hora e nada. Pensei em reclamar. Mas percebi que havia um vulto no outro lado da porta. Parecia ser um segurança ou algo do tipo.

    Levantei-me e abri a porta. O segurança se virou e perguntou: “Pois não?”

    Naquele momento, por cima do ombro do segurança, vi o médico que internara o meu filho passar por uma porta, se escondendo em outra sala.

    Protestei, chamei por ele, mas mal me lembrava do seu nome.

    O segurança me segurou, dizendo para eu ficar calmo.

    Calmo uma ova! Empurrei-o de forma tal que ele caiu no chão e ficou lá, estatelado. Corri rumo à sala onde sabia que meu filho estaria internado. As pessoas me olhavam como se eu fosse um louco. Os funcionários do hospital tentavam me deter. Mas, naquele momento, enxotava-os todos como quem se livra de moscas inoportunas.

    Notei que o segurança se recobrava da queda e vinha em minha direção. Naquele momento, começou a ter uma variação na rede elétrica. Ora ela vinha, ora caía. Segui determinado naquele lusco fusco até encontrar o quarto do meu filho.

   Quando a luz voltou, aquela cena cortou meu coração. Ele estava com unhas enormes, com a pele estranha, com parte dela caindo, podre, e outra esverdeada. Parecia que havia ossos brotando da pele da cabeça e dos cotovelos. Mas ele seguia ligado aos tubos. Havia duas pessoas retirando a maca dali, com os equipamentos e tudo para outra sala às pressas.

     Meu filho estava sendo tratado como um animal e sua situação estava ficando cada vez mais crítica! Ele estava amarrado àquela maca que mais parecia um tubo de ensaio gigante, que o isolava por completo do ambiente.

    Com as idas e vindas da energia elétrica, via de relance que meu filho estava se debatendo, em profundo sofrimento. Tinha de fazer algo para tirá-lo dali e leva-lo para um lugar onde ele recebesse um tratamento digno.

    Segui a equipe e, quando os alcancei, soquei-os sem piedade até que ficassem no chão. Levantei-me e apertei todos os botões possíveis do painel que havia acima da maca, até que finalmente o tubo se abriu. Meu filho estava lá, se debatendo. Eu o estava ajudando a se desvencilhar das amarras que o seguravam. Quando eu estava quase terminando, o maldito segurança me imobilizou pelas costas, acompanhado de outra equipe médica.

    Lembro-me bem que a janela daquele quarto estava aberta, porque as cortinas balançavam com o vento, e de lá dava para ver as luzes da cidade, setores estavam sem energia, outros com. A energia elétrica continuava variando.

    Vi meu filho de pé, tentando se desconectar dos tubos. O segurança me deu mata–leão. Só me lembro dos médicos cercando meu filho novamente, até que desmaiei. A última coisa que ouvi foi um urro de dor.

 
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Manassés Abreu
Enviado por Manassés Abreu em 01/04/2020
Reeditado em 15/05/2020
Código do texto: T6903261
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