CORONAVÍRUS E AS MÚMIAS CHINESAS.

Steven Dacross, um ex fuzileiro americano, deixou Seul para trás. Alugar um bom carro foi fácil. Duas semanas na capital sul coreana. Estava satisfeito com a culinária e o karaokê da cidade cheia de luzes de neon. Era um estudioso da cultura asiática. Steven queria mais. Queria adrenalina. Voltar a Ásia era um deleite. A família no Arkansas mandava mensagens de WhatsApp. Steven tinha enjoado de cuidar do gado da fazenda do pai. A vida no campo era boa mas a guerra transformou o vaqueiro. Lutara na guerra do Golfo e participara da operação que matou Sadan, no Iraque. Um ombro deslocado, um dedo faltando no pé esquerdo, marcas de estilhaços de granada na testa eram as reminiscências de guerra no antigo soldado. As marcas no espírito não eram visíveis mas estavam lá. Um ano de análise e terapias. Alguns amigos se afastaram pois o veterano ficava nervoso facilmente. Steven cruzou a fronteira com a China. Já conhecia Hong Kong muito bem. A Coréia do Norte era um destino muito arriscado, até para um louco como ele. Uma floresta. Um rio. O carro saiu da estrada para não atrair a atenção de guardas chineses. Tinha vários documentos falsos mas não queria correr riscos. Levava muitas armas e dólares. Steven era formado em história e arqueologia. Falava espanhol, alemão, mandarim e russo. Devorava livros. Dirigiu por dias inteiros. Tinha muita comida enlatada e barrinhas de cereais. Dormia na floresta. Uma pequena barraca e um saco de dormir bastavam. Uma semana de viagem visitando vilas, degustando ratos assados, carne de cachorro, besouros e morcegos. Steven estava acostumado a passar fome no Iraque. Aqueles bichos estranhos eram, pra ele, uma iguaria. Espalhara sensores entre as árvores, a fim de detectar intrusos ou curiosos. Um notebook. O celular. A bússola. Passava horas observando as constelações no céu. Acreditava em UFOs. Jurava ter visto Ovnis no Arkansas. Um mapa da China. Longe da fronteira, o americano entrou numa aldeia. Comprou roupas chinesas e um grande chapéu. Os óculos escuros escondiam seus olhos azuis. Se comunicava em mandarim perfeito. Steven abandonou o carro ao chegar ao deserto de Taklamakan. O veículo branco ficou sob a sombra de uma árvore. As montanhas cercando o deserto. As dunas. Andou por três dias. As botas em péssimo estado. Muita areia e sol. A água acabando. O sol escaldante de dia, o frio a noite. Esquecera o saco de dormir no carro. Um erro grave. Fez uma fogueira com pedras e chumaços de capim seco. Uma habilidade de dar inveja a Bear Grills. Por um momento se arrependeu da aventura. O rio Tarin. Um oásis. Um sorriso. Steven pulou na água. Estava feliz. -"Aqui era a antiga rota da Seda. Comércio entre a Europa e o Oriente. Aqui encontraram as famosas múmias ruivas chinesas. Povos altos de quatro mil anos atrás que migraram da Europa e formaram o povo chinês. As múmias têm cabelos ruivos e narizes longos!!!!" Steven fotografava o lugar. Era maravilhoso estar alí. O celular ficou sem bateria. Uma caverna. O americano decidiu entrar. Andou por vinte metros. Um rochedo. Sentiu um arrepio ao entrar na caverna. Uma revoada de morcegos passou por cima de sua cabeça. A lanterna. A submetralhadora na mão. O punhal na cintura. Um barulho de pedra caindo. Steven sentiu uma pancada forte na nuca. Tudo ficou escuro. Ele disparou alguns tiros, aleatoriamente. Caiu desacordado. -"O que faz aqui, americano???!?!" Steven ouviu mas não conseguiu abrir os olhos. Sentiu uma picada de agulha no braço. -"Dormiu por dois dias, americano!!!" Disse alguém que lhe deu um tapa no rosto. Estava algemado e preso numa maca. Abriu um olho. Luzes fortes no seu rosto. Sua cabeça estava presa. Ele não sentiu as pernas. Estava com um roupão. Um homem com farda do exército da China o observava com uma prancheta. Enfermeiras o cercaram. -" Apliquem nele o coronavírus!!! O presidente deve saber que um americano caiu em nossas mãos!! Um presente maravilhoso!!!!!" Steve sentiu a picada da agulha da injeção. Uma semana preso, isolado num quarto com câmeras. Um soldado trazia-lhe água e comida. Por quatro dias sentiu o ar lhe faltar nos pulmões. Febre, coriza, tosse seca, diarréia, náuseas e fraqueza. Um médico o visitava várias vezes. Steven foi colocado em máquinas de ultrassom e raios X. Tiraram sangue dele e amostras de cabelos. Colocado numa maca foi deslocado até um outro setor. -"Estou morto ou delirando???!!! Isso é um inferno!!!" Era como se afogar mas num ambiente seco. Centenas de redomas de vidro com corpos boiando num líquido esverdeado. Pareciam zumbis. -"Americano, aqui estamos na sala dos nossos amigos do rio Tarin. Não o deixaremos morrer pois será muito útil pra nós, seres superiores!! Trouxemos um vírus letal do espaço pra acabar com a humanidade! Testamos nos gafanhotos, morcegos e abelhas. Os gafanhotos ficaram loucos e formaram uma grande infestação na Africa, abelhas morreram aos montes, infelizmente. Morcegos infectados comeram frutos que os porcos comeram depois, infectando irmãos chineses. Isso nem estava nos nossos planos." Disse um chinês gordo com uniforme militar. Steve sentiu grandes mãos o pegarem e o suspenderem no ar. Cinco extraterrestres enormes o levantaram da maca. Tinham a cabeça ovalada e narizes pontudos. Muito parecidos com as múmias chinesas, diferentes na pele esverdeada e olhos grandes ovalados. Eram como grandes lagartos. Steven foi colocado numa redoma de vidro. Um dos etês se aproximou. -" Eis o remédio para o coronavírus, americano. Nossos cientistas, infiltrados entre os humanos, darão a vacina ao mundo no tempo certo!!! Por ora, a pandemia colocará o mundo num caos econômico!!!" Disse o alienígena, em mandarim perfeito. -" Olhe bem para mim, americano do Arkansas!! Somos descendentes de Huang-Di, o imperador amarelo. Ano de 2,697 antes de Cristo. O primeiro imperador, lendário, perfeito e sábio. Ele fundou a cidade proibida e as bases da cultura chinesa. Como arqueólogo você deve saber disso!!! Ele voava num dragão mas, que na verdade, era uma nave espacial, até a estrela Sinus PW57790. Nossas naves estão vindo para a retomada da terra!!! Idiotas. Querem ir pra Marte mas não cuidam de seu planeta!!!!" A redoma de vidro foi enchendo do líquido esverdeado. Steve temia se afogar. -" Acalme-se, americano tolo. Esse líquido é o soro do Corona. Sua mente será parcialmente apagada. Um chip instalado dirá o que deve fazer. Aqui temos homens e mulheres de todos os países de seu rico planeta. Serão infectados novamente e mandados aos quatro cantos pra espalharem o vírus. Realizada a tarefa, o chip será destruído e adeus. Morrerão, logicamente." Steven ficou inconsciente por um dia inteiro. Acordou preso numa cadeira. Estava com roupas civis. Não sentia mais febre nem secura na garganta. Respirava normalmente. -" Está curado do coronavírus, americano!!!" Disse um dos oficiais. -"Sempre que a China está em apuros financeiros, inventamos um vírus que abala a economia mundial e nós nós recuperamos!!!" Riu o militar. Steven estava horrorizado. Ele teve o cabelo raspado. Cinco oficiais o cercaram. Um extraterrestre estava com eles. Um telão saiu da parede. Imagens e desenhos da história da humanidade foram passando. Steven com os olhos arregalados. Era uma aula de história na ótica alienígena. O Egito e seus deuses, Alexandre, o Grande. O extraterrestre disse. -"Cleópatra era uma de nós, americano. De outra estrela, mais distante!!! Demos aos humanos o fogo, a roda, o alfabeto, a escrita, calendários, maquiagens, remédios, a máquina a vapor, a eletricidade, o telefone, cinema, fotografia, penicilina, aviões, celulares e ultimamente a tecnologia cinco G." Steven se remexeu. Estava algemado. -"Malditos!!!" Soldados colocaram uma fita colante em sua boca. A aula continuou. -" Americanos capturaram alguns extraterrestres em 1947, no estado do Novo México, em Roswell. Seres inteligentes, vindos de outras estrelas e isso permitiu a eles chegar até a lua. Extraterrestres trabalham juntos de cientistas americanos no desenvolvimento de novas tecnologias. Os extraterrestres deles desenvolveram naves parecidas com as nossas, numa área proibida no deserto. Em breve, a China será mais poderosa que os EUA. Já somos mais numerosos!!!!" Steven foi colocado num elevador. Uma pedra se abriu no alto de uma montanha. Steven foi colocado numa nave. Uma poltrona com cintos de segurança. Um forte barulho. Dois extraterrestres pilotavam a nave. Steve nada sentiu. Uma janelinha se abriu. Steve reconheceu as grandes ilhas japonesas. Uma altura absurda. -" Por enquanto, voamos apenas sobra o Oriente. Da China ao Japão em dez segundos!! Melhor que Usain Bolt, que aliás, é um extraterrestre disfarçado!!!!! Einstein e Pelé também!! Hora de voltar a base!!!" A janela se fechou. Mal fechou os olhos e abriu, se viu novamente na montanha. Um chip foi colocado na cabeça de Steven. Dias depois, ele andou e entrou num caminhão militar. Steven e outras quarenta pessoas foram levadas ao aeroporto. Cada um deles seguiria para um país diferente, Tinha uma maleta cheia de dólares. Nenhuma arma. Documentos e passaportes novos. Steven seguiria as ordens do chip em sua mente. -"Quando espalharmos e o corona explodir na China, será o momento de saírem nas ruas e espalharem o corona nós seus países. Alguns pensarão que o apocalipse chegou. Hologramas nossos projetarão sinais de anjos e cidades flutuantes nos céus. Adeus, oficial Steven!!!" Disse o motorista do carro militar. O americano entrou no avião com destino a Nova York. Ele agia mecanicamente. Um militar chinês, a paisana, observava o americano. Ele dormiu a maior parte da viagem. Chineses o receberam no aeroporto dos Estados Unidos. Eles falavam em mandarim. Steve foi levado a um apartamento perto do Central Parque. Dezembro de 2020. A cidade enfeitada para o natal. As luzes. A neve. As ordens do chip diziam pra ele aplicar o vírus em si mesmo. Steven obedeceu. O sangue escorreu pelo braço. A injeção no tapete da sala. Andando como zumbi, ele saiu de casa e conversou com muitas pessoas. O parque imenso no coração de Nova York. Um lugar ideal. Chineses desconfiados observavam o ex fuzileiro. O dia inteiro com um cartaz pedindo um abraço. Steven dava um sorvete de palito infectado a quem lhe desse o carinho. Jogava água contaminada em caixas eletrônicos e tossia sobre alimentos em mercados. Assim ele infectou centenas de pessoas. Viajou pra Dallas, Chicago, Detroit, San Francisco e Nova Orleans. Fevereiro. Ordens para conhecer o carnaval brasileiro. Rio e Bahia no roteiro. Steven viajou para o paraíso tupiniquim. O loiro bombadão de olhos azuis fez sucesso e beijou dezenas de foliãs e travestis. Uma semana de folia e pousadas luxuosas. Noites em claro ao som do samba e marchinhas. Apertava as mãos de garçons e hóspedes do hotel. Steven espalhou o vírus no Brasil. Epidemia instalada na China. Muitos mortos. Hospitais construídos em tempo recorde. A cidade vazia. O povo em quarentena. Steven acompanhava tudo pela televisão. Um sorriso irônico. A Itália em histeria com centenas de mortes. Espanha, Portugal, Alemanha, Coréia do Sul, França. Uma pandemia pois os primeiros casos surgiam na América do Sul e África. Os idosos no topo da lista dos mais vulneráveis a morrer de complicações do vírus letal. Um contágio mais rápido que a Mercedes de Lewis Hamilton. Nenhuma vacina. Nenhuma esperança. O papa orando. As igrejas fechadas. Uma histeria coletiva. Idosos morrendo aos milhares. Crematório lotado. Médicos heróis. Os governantes aflitos. Quarentena. Caminhoneiros sem postos de alimentação. Os preços de gás e alimentação subindo. Steve deixou uma lágrima cair ao se lembrar dos pais e avós no Arkansas. Era preciso fazer alguma coisa. Era um ex fuzileiro e agira contra seu país e os valores do bem. Uma parte de sua mente despertou. Não dava mais ouvidos as ordens do chip. Steven vasculhou o apartamento. O celular certamente estava grampeado. Uma carta. Deixaria uma carta a polícia contando toda a verdade sobre o coronavírus. Sabia de tudo. Sabia onde tinha a vacina. Acabou de escrever a carta. Contou do chip. Por ele saberiam ir até a montanha e descobrir a vacina sonhada pela humanidade desesperada. O mundo seria alertado sobre a iminente invasão dos extraterrestres. Amarrou o lençol na janela do apartamento. Uma volta do pano no pescoço. Fechou os olhos e saltou pra morte. Um estralo nos ossos. O corpo dele pendeu contra a parede do quarto andar. . As pessoas aflitas com aquela cena horrenda. Os gritos. Os sinais vitais fracos ativaram um alerta no chip. A cabeça de Steven explodiu, assim como o apartamento. O mundo não conheceria a verdade!!! Um carro chegou a aldeia de Hu-Xing. Um homem de branco desceu e entrou numa casa de pescadores. -" Encontramos esse homem há seis dias nas margens do rio, doutor Hoo. O carro dele está além das rochosas." O médico abriu as pálpebras do moribundo. Olhou bem a boca e os sinais vitais. -" Insolação. Pés em carne viva são sinais de quem atravessou um deserto. Pernas e braços quebrados, um corte na fronte. Certamente caiu de um penhasco!!!" O doutor preocupado. Os moradores curiosos. -" Ele delirava, falava coisas sem nexo!! Múmias, doenças, chip...coisas loucas!!! Tem documentos americanos." Disse o pescador, dono da casa. O médico meneou a cabeça negativamente. O moribundo abriu os olhos. -" Não fale, amigo!!! Somos amigos!!!" Steven fechou os olhos e morreu. F I M

marcos dias macedo
Enviado por marcos dias macedo em 28/03/2020
Reeditado em 30/03/2020
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