O ASSASSINO DA PISCINA DO CONDOMÍNIO
A explosão da mudança entre a tranquilidade e a monstruosidade dentro de um ser é medida por um curto estopim. As coisas vão bem... entrando nos trilhos, mas talvez descarrilhe logo a frente sem aviso prévio.
A vida de Jairo melhorava financeiramente, recebera um bom aumento na empresa depois de uma promoção desejadíssima, seria supervisor noturno na empresa de segurança onde trabalhava há mais de cinco anos, seu mais longevo emprego. Vivera de aluguel desde que saiu da casa dos pais e decidira dar rumo à sua história, sozinho. Passados mais de dez anos da morte de seus pais e com mais de quarenta anos, era o momento certo de utilizar o dinheiro da velha casa deixada como herança e a venda do velho fusca, ano 86 para comprar a tão sonhada moradia. Seu desejo era um apartamento pequeno dentro de um condomínio fechado e com boa segurança. Eram poucas opções em relação ao que podia pagar, porém, a sorte caminhava a seu lado, sem saber que Jairo procurava um novo lugar, um de seus comandados na empresa lhe mostrou o anúncio no jornal onde uma imobiliária oferecia apartamentos de baixo valor em um empreendimento que já estava quase completo, restavam os que não pegavam sol, ao lado do play ground, de frente para o salão de festas e com a janela direcionada à piscina. Ele imaginou que ver a água balançando com o vento e crianças brincando, lhe trariam paz e muita alegria.
O consultor de vendas marcara pela manhã, oito horas em ponto, teria que sair antes do término de seu turno de trabalho, algo que não havia problema, a confiança adquirida por ele na empresa lhe proporcionava algumas regalias. Ainda se acostumando com o ritmo noturno, ao chegar no condomínio, o silêncio lhe convidava a fechar negócio. E assim foi. A visita no local foi agradável e positiva, confirmou a compra. — Estás fazendo uma ótima compra.
— Falou o consultor.
— Tenho certeza disso. — Respondeu Jairo.
Mudou-se imediatamente ao novo lar e no primeiro dia, a certeza de tranquilidade e dias de sono foram por água abaixo. Observou que a tranquilidade era apenas pelas manhãs, onde crianças estavam em aula, adultos trabalhando e desocupados dormindo. A face real do local era de barulho insuportável. Jairo trabalhava a noite e chegava em casa depois das dez da manhã, precisava dormir de dia, momentos de piscina cheia, muita gritaria e música alta.
Tentou resistir usando protetores auriculares e colocando travesseiros sobre a cabeça, mas nada era suficiente. Vivia agora como um zumbi. Pensou em se mudar, tentou vender o apartamento, mas ninguém se interessava, apenas Jairo não conhecia a fama daquele imóvel. Algumas famílias tentaram viver lá, mas nunca duravam mais que seis meses. Os vizinhos faziam questão de contar aos possíveis compradores o que sabiam sobre o que os antigos moradores passaram e principalmente da questão da piscina e do barulho. Jairo entendeu que apenas ele visitou o local antes do horário de abertura da piscina. Os interessados em seu atual anúncio marcavam sempre para a tarde. Muitos nem chegavam a entrar no imóvel, ao perceber a localização agradeciam e iam embora. Os poucos interessados ofereciam valores muito abaixo do que ele precisava para poder comprar outro apartamento.
Jairo lembrou do que passou para conseguir realizar o sonho de ter seu lar, pensou em seus pais e da venda da velha casa deixada a ele, do seu fusca que sempre fora seu sonho e de tudo que passou para chegar até onde estava e retirou o anúncio de venda do apartamento.
Tomado por uma raiva absurda, imediatamente seu cérebro cansado procurava meios de conseguir dormir, algo que se tornara quase impossível. Enquanto trabalhava, elaborava métodos de acabar com aquela bagunça. Não reclamava ao síndico, julgava que isso pioraria a situação e desvalorizaria mais o apartamento.
Com a exaustão cerebral chegando ao limite, saiu mais cedo do trabalho e chegou em seu condomínio antes das seis da manhã, percebeu ratos mortos perto da caixa de esgoto. Juntou todos e de trás da câmera de segurança, jogou na piscina. Naquele dia a recreação aquática foi fechada. Foi então o primeiro dia de sono desde que chegara no local.
No outro dia tudo voltou ao normal e ele retornou aos seus planos, pagou um dos meninos do condomínio que era taxado de pestinha, para quebrar a câmera da piscina. Prontamente o vandalismo foi executado. Um dos moradores viu o momento em que o menino danificou o aparelho. Porém, ao questioná-lo, o menino alegou que só estava brincando e que havia sido um acidente. O condomínio apenas advertiu seus pais.
Com a câmera em manutenção, Jairo foi até o motor da piscina e colocou vários panos na tubulação, danificando a filtragem. Mais um dia de sossego. No dia seguinte, Jairo já estava sem ideias e para piorar o pestinha do plano da câmera, o chantageava, pedindo mais dinheiro, do contrário, contaria toda a verdade. Jairo obrigou-se a ceder à chantagem e deu mais dinheiro ao menino.
Na noite de domingo, a primeira em que passava em casa, Jairo teve ideias um pouco mais violentas. Juntou algumas garrafas, quebrou em pedaços e de sua janela, jogou na piscina. Na manhã seguinte, as crianças começaram a entrar na água e quando já havia cinco, uma delas sentiu uma pequena fisgada no pé, imediatamente a água começou a avermelhar. Com o susto as outras saíram forçando os pés na piscina cortando-se também. A piscina ficou interditada por dois dias. Os melhores momentos de Jairo naquele lugar.
O síndico mandou instalar mais câmeras, dificultando as ações de Jairo, ocasionando uma fúria descontrolada no homem que só queria dormir, e para isso precisava de silêncio.
Com a piscina mais vigiada, Jairo não conseguia fazer mais nada contra seus vizinhos.
Com os últimos acontecimentos, o concelho do condomínio resolveu melhorar algumas questões em relação à segurança na área da piscina, isolando o local marcando uma reinauguração em dez dias. No convite dizia:
"Com a ampliação da área de piscina, no evento, faremos o banho inaugural com todos entrando juntos na água. Aguardamos confirmação de todos."
No dia seguinte mais de cem pessoas haviam confirmado.
Jairo pensou e lembrou de um antigo amigo que trabalhava em uma empresa química lhe devia importantes favores. Ligou e solicitou ácido, precisava de muito, cem litros. O amigo achou estranho, mas concordou, e na manhã seguinte, cinco frascos já estavam em seus poderes.
No dia anterior a reinauguração. Jairo vestiu-se com o uniforme do responsável pela manutenção que havia roubado do vestiário, foi até a piscina e despejou o ácido na água. Um morador passava e perguntou:
— Quase pronto? Amanhã é o grande dia!
Jairo cobrindo o rosto com o boné, respondeu:
— Claro! graaaaaande dia.
Circulou a piscina com fita de isolamento para que ninguém chegasse perto da água e foi embora. Tomou um demorado banho, vestiu uma roupa nova e foi para seu trabalho. Passou a noite cantarolando feliz. Saiu mais cedo naquela manhã, queria estar de camarote na hora da tão esperada reinauguração. E assim foi.
Às dez horas em ponto, após a síndica falar um pouco sobre a obra, os moradores circularam a piscina e após a contagem regressiva, todos começaram a pular. Os gritos de alegria misturavam com os berros de dor. A água ficou vermelha, a pele das pessoas começou a cair e logo vários corpos boiavam e afundavam. Os poucos que não pularam tentavam ajudar, mas acabavam caindo também. Jairo ria sozinho de sua janela com vista privilegiada bebendo um copo de vinho e saboreando um sanduíche de queijo.
O clímax da alegria foi ver que o pestinha chantageador estava entre os mortos.
Jairo fechou a janela e foi dormir.