VODU
Era um dia de verão, no passeio,
Chegamos num espetáculo bem mágico
Com a alegria o espírito cheio,
Transformou-se neste relato tão trágico!
Nunca cri em minha vida inteira,
Naquelas superstições de pura crendice,
Acreditei serem senão a besteira
De um povoado embrenhado em tolice!
E aquele boneco de simples pano,
Com alfinetes pelo corpo todos espetados,
Era o vodu do velho negro africano
Pelos séculos consideravam amaldiçoados
Quando começou a encenação
Dos ritos ancestrais eu ri daquilo tudo,
E a platéia nesta vil excitação
Zombaram todos daquele velho mudo!
Sua esposa interveio e solicitou
Que meu escárnio era uma coisa nova
Para crer na magia me indagou,
Se eu não queria ser a cobaia em prova!
Ergui-me de onde estava sentado
Dirigi-me para o palco imundo e vazio,
E aproximo-me do negro trajado
Foi quando senti um pavoroso calafrio!
Com um murmúrio em mandinga
O velho começara seu demoníaco ritual
Levava as mãos – charuto e pinga
Para iniciar essa transmutação espiritual
Ouvi cânticos em loucos dialetos
Hipnotizado neste transe sequer sentia,
Eriçados os pelos do corpo eretos
Preso no transe a mente nada presumia!
Que minh’ alma seria aprisionada
Dentro do boneco com traços humanos
E para sempre a vida amaldiçoada
Dentro das vestes cosidas com panos!
Senti certo sono pesar-me tanto
Pensara por fim em dormir rapidamente
Deitei em certo espaço no canto
Por ventura refazer-me lentamente!
Quando acordei estes olhos miúdos
Avistaram na parede uma certa prateleira
Meus ouvidos tampados e surdos
Pareciam estarem costurados a cabeceira
Foi nessa hora que vi meu corpo,
Que estava em decúbito e desmaiado,
Estaria eu vivo? Ou então morto
Acordei, mas sinto-me tão espantado!
Ao meu coração a dor não cabe,
Quando a diabólica imagem sobreveio
Quem nunca morrera jamais sabe
O desespero vindo do tenebroso receio
Agora meu corpo sem vida nem alma,
Quando notei que me havia transformado,
Nada restara sequer a sincera calma,
Neste boneco sou agora refém aprisionado
E aquele velhaco se aproximou
Rindo como se tudo fosse uma charada,
A praga maligna enfim recitou,
Agora sou o brinquedo da filha amada!