O Monte maldito

O Monte 61

Foi dado o nome de monte 61, ao morro do qual dava pra ver quase toda a cidade, ele fica localizado, no quilometro 61, da rodovia 061, na cidade de Vila dos Novos.

Podíamos ir de carro até as caixas d'água, com suas estruturas sobre madeiras maciças. Ali era o inicio da trilha que levava o alto do morro.

Era onde meus tios, meu pai, e depois de um tempo meu irmão mais Velho, iam orar. Minha mãe não podia ir.

Mulheres eram curandeiras do lar, cuidavam da casa e dos filhos pequenos.

O grupo saía sempre na ultima sexta feira do mês, um pouco antes da meia noite, e quando voltavam de madrugada, diziam que haviam recebido o espirito santo.

Nas suas bíblias sempre havia mato queimado, e seus olhos eram mais negros do que de costume.

Lembro muito bem quando meu irmão foi batizado pra começar a frequentar o monte 61.

Segundo meu pai, a passagem dele não foi fácil, passagem é o que dizem quando se batiza no monte. Quem não consegue ser batizado por seja lá qual for o motivo, não é bem aceito pela família. Meu primo Leandro, foi mandado para estudar na capital, depois de não passar. O que foi dito é que ele havia trancado antes do ritual, e se apaixonado perdidamente por uma impura.

As coisas que descrevo aqui, são caóticas e sem nexo, para a vida que vivemos agora, vivemos no futuro de tecnologia e celures com todas informações disponíveis. E é neste tempo atual, que estas coisas bizarras ainda acontecem.

Meu irmão chegou todo arranhado. Os cortes eram profundos. Na minha obscura adolescência, ficava me perguntado que merda era aquela. No fundo eu queria ser como meu pai e meus tios, ansiava pelo meu momento de batismo, queria logo a minha bata, costurada com couro de animais. Mas tinha medo, ainda tenho enquanto transcrevo toda história familiar que vivi até aqui.

Meu irmão ficou amuado, por dias. Primeiro foi a febre, depois a perda de peso. Minha mãe dizia que Denis melhorava a cada sessão de cura, e que a demora era normal, devido aos fins dos tempos que se aproximavam.

A noite eu podia ouvir do seu quarto ruídos e sabia que ele estava tendo os piores pesadelos.

Não tive coragem de perguntar ao meu pai, nem muito menos a minha mãe o que estava acontecendo com Denis, mas sabia que era a coisa ruim do Monte.

Por mais que eles viessem com toda esta fé de Espírito santo, eu sei que não era bom o que havia la.

Mas existem coisas que ficam melhores ocultas. A faca que corta a carne crua, não é mesma na mesa de jantar.

Depois de alguns dias Denis melhorou, voltou ao normal, e começou a frequentar o morro, com meu pai toda ultima sexta feira do mês. Misteriosamente os seus cortes desapareceram.

Eu tinha quinze anos, Denis me motivava à aguardar com fé o meu momento, mas a pressa que se tem em descobrir os absurdos ocultos, tomou conta de mim, e depois do meu aniversario de dezesseis anos decidi segui-los até o monte, foi a pior escolha da minha vida.

Minha mãe havia realizado diversas sessões de cura, e não percebeu, que como um gato, eu fugi naquela noite, um pouco depois que meu pai e meus tios saíram.

Fui atrás deles sorrateiramente, me cansei e quase fiquei sem folego, o morro era enorme, parecia que não ia acabar nunca, eles tinham nas mãos a luz vinda de uma lanterna ambar, já eu não tinha nada.

Estava distante deles, mas uma hora a distância diminuiu até acabar.

Era o fim do morro, a parte mais alta. Eles apagaram as lanternas e não pude ver muito até que meus olhos se acostumaram com a pouca luz, e tudo me foi revelado.

Primeiro ouvia orações, quase em latim, uma língua oculta que os mais velhos murmuravam, depois os mais jovens entoavam junto.

Eles estavam em um circulo, e dentro deste circulo diversos animais mortos. Tinha de tudo, alguns com sangue fresco, outros com um negrume que eu podia sentir de longe, outros pareciam ter sido desenterrados. Vi com a cabeça decapitada o cachorro de meu primo Tom, ele havia morrido à dois dias, atropelado, mas a cabeça não dava pra entender, o porque da cabeça separada do corpo.

Tento reprimir tais imagens, horríveis que tomam minha mente, mas elas existiram e sem estarão aqui, como se fossem atuais. Eu quase corri, eu estava morrendo de medo, mas não tinha batismo, de ninguém, e parecia que a bizarrice acabaria ali.

Não acabou, luzes apareceram, barulho de asas, rinchos, ate gritos. Veio o vento, tudo ficou gelado, e depois voltou a temperatura normal.

Todos tiraram as roupas, e ficaram de braços abertos. Mais risadas, mais gritos, não eram bruxas, tinham asas, tinham chifres e corpos quase que femininos.

Uma delas, uma daquelas malditas coisas, era a lider, era a maior, ela comandava o show, indicando quem ficaria com quem.

Eu vi, aqueles homens sendo violentados, como se não fosse nada, jogados no chão e sendo possuídos por uma coisa que não parecia humana. O que eles faziam era sexo, mesmo não parecendo sexo. As coisas com vozes de senhoras de idade, gritavam coisas vulgares, das mais pertubadoras.

Primeiro elas usavam como queriam o corpo dos mais jovens, e depois eram os mais velhos.

Não pude olhar varias das coisas que aconteceram naquela noite, meus olhos se fechavam.

O pior foi o final, e também foi o pior que me aconteceu.

As coisas malditas, fizeram todos se vestirem, e se ajoelhar, depois disso todos que ali estavam começaram a servi-las, tudo que estava no circulo, toda aquela coisa morte e desenterrada ou captada. O pior é que elas comim com gosto, riam com dentes afiados.

Eu vomitei e fui ouvido.

Nem respirei, e já estava sendo agarrado por uma mão enorme. Depois suas asas bateram e logo eu estava, no meio deles.

Nunca esquecerei o olhar de meu pai, naquele dia, a decepção, a raiva, e seu passo a frente contido pela mão de um dos meus tios.

A coisa maldita, sorrio e disse que há séculos não comia nada vivo,

Seu cheiro era podre, seus dentes demoníacos, como destas bruxas estereotipadas em filmes.

Meu pai deu outro passo que não foi contido, se ajoelhou e implorou. A maldita pediu algo em troca, que meu pai apenas assentiu com a cabeça.

Logo eu estava no chão, e como se não fosse nada, a mão de meu pai foi arrancada e ficou sendo mastigada como chiclete na boca daquela desgraçada. Meus tios seguraram meu pai, e as coisas desapareceram.

Me levaram embora, sem falar nada comigo, no outro dia quando acordei, minha mãe estava com minhas malas arrumadas. Eu iria viajar.

Hoje vivo com uma tia, na capital, nunca mais falei com meu pai, nem com ninguém daquele lugar. Nas fotos em redes sociais estão sempre felizes meu pai, minha mãe e meu irmão. Meu pai até tatuou o braço que a mão foi arrancada, parece não ligar. Eu nunca mais voltei para Vila dos Novos.

Hoje faço dezoito, está é ultima sexta feira do mês, e sem saber o porque sinto que é o meu batismo. Enquanto escrevo fica mais gelado, penso até que já ouvi sussurros na janela.

Termino aqui o meu relato, e seja lá o que estiver lá fora estou pronto, e não irei sem lutar. Amo a todos.

Tiago Saartu
Enviado por Tiago Saartu em 30/12/2019
Reeditado em 07/01/2020
Código do texto: T6830502
Classificação de conteúdo: seguro