Sessão das dez.
Meus amigos e eu queríamos ter uma noite cultural. Decidimos então ir ao teatro. Já havia um bom tempo que não frequentávamos esse tipo de evento.
Pesquisamos alguns espetáculos em cartaz e o único que nos chamou atenção começava as dez da noite.
Era uma tragicomédia sobre a banalização da violência, que parecia ser bem divertida pela sinopse. Infelizmente, não conseguimos assistir.
Quando entramos no teatro, percebemos que poucas pessoas estavam na plateia. Acredito que além dos meus amigos e eu, mais umas quatro pessoas estavam lá.
Depois do terceiro sinal, as luzes se apagaram, as cortinas se abriram e o foco âmbar iluminou o proscênio. Alguns acordes eram tocados no piano, quando de repente um grito nos assustou. A atriz entrou em cena usando apenas um vestido preto. Ela não usava roupas íntimas. Por alguns segundos fomos observados por ela; era como se a atriz nos julgasse com o olhar.
Aos poucos, o som do piano parou e a atriz começou a chorar. Logo em seguida, dois atores entraram em cena segurando duas facas, que à princípio, pareciam ser reais.
Nenhum dos atores havia dito uma palavra.
O iluminador acendeu a luz da plateia e a atriz apontou na direção de um casal que assistia o espetáculo. Os dois atores foram até o casal e levaram uma garota para o palco. Chegando lá, vendaram a espectadora que estava assustada. O rapaz que a acompanhava se manteve inerte, nada fez.
Depois de vendar a mulher, a colocaram sentada numa poltrona e amarraram suas mãos. Nesse momento ela começou a reclamar dizendo que não queria estar lá. Gritou pelo seu namorado, mas ele continuou sentado na poltrona, apenas observando. Levei um tempo para perceber que o rapaz já estava morto.
Em questão de minutos, a garota que acabara de subir ao palco estava degolada no chão.
Um dos meus amigos se desesperou e tentou se levantar da poltrona. Foi golpeado logo em seguida.
Demorei para perceber, para aquilo não era um espetáculo teatral, e não digo isso como crítico de arte. Realmente não era um espetáculo, pois todo o elenco estava morto no camarim. O iluminador e sonoplasta agonizavam na cabine de som.
Eu só queria que aquilo acabasse. E eu sabia que em algum momento acabaria.
Perdi a noção de quanto tempo fiquei sentado na poltrona. Eu estava colado nela. Assim que tentei me mover, um pedaço da minha pele grudou no assento. Era uma dor sem fim. Mas como eu disse, eu sabia que em algum momento acabaria, e foi com uma faca atravessando minha garganta que a sessão das dez teve fim.