Mal assombrada
Um casal, Carlos Tito e Ieda, alugou uma casa. Uma vida pela frente eles tinham. Eram recém-casados.
A casa era antiga, construída no começo do século 20. Ficava num bairro nobre. Desses, onde residem famílias de classe média alta.
Mudaram-se. Antes, claro, tinham ido ver o imóvel. Gostaram do ambiente, da rua.
As coisas (utensílios) foram colocados em seus devidos lugares. Um sábado aquele dia.
Ficaram no primeiro quarto, logo depois da sala.
----- Gostei daqui, Ieda… É aconchegante a casa.
----- Também gostei, Carlos, embora seja um imóvel já antigo.
O tempo correu. Chegou a tarde, depois a noite. Os dois decidiram ir a algum lugar se divertir, relaxar. E comer alguma coisa.
Foram a uma pizzaria. Comeram, beberam, momentos agradáveis para eles.
----- Bem, voltemos. Quero descansar, estou exausto – pediu Tito.
Regressaram à casa, o casarão. Quase meia noite. Ele guardou o carro na garage.
Ao abrir a porta, a chave engatou, não queria abrir. Mexeu, mexeu, conseguiu abri-la. Entraram.
Tentou acender a luz – nada. Às escuras estava a casa. ---- Meu Deus! Exclamou Ieda, uma morena de bonito corpo. Tenho pavor de escuridão…
Ouviu-se alguns trovões, iria cair um temporal. Era março, tempo das águas, chuvas fortes.
De repente uma lâmpada se acendeu. Na cozinha. Um susto para o casal. Alguma coisa estranha ocorria.
Paralisaram. Ieda agarrou-se no marido, trêmula.
------ Fique calma, disse-lhe Tito. Silêncio pleno. Então a chuva desabou, relâmpagos, barulho de água no telhado, na rua.
Eis, a lâmpada da cozinha apagou. De novo escuridão. Carlos Tito foi à cozinha. Teria de ir, precisava fazer alguma.
O corredor deveria ter uns 15 metros. A esposa não quis ficar lá, na sala, sozinha. Foi junto. Caminharam. Lógico, estavam com medo. Quem não estaria?
Foram, apoiando-se na parede, tateando. Na metade do caminho a lâmpada da cozinha acendeu. Outra vez.
Mais susto, medo, pavor. A chuva ainda castigava a cidade, o barulho no telhado, na calçada da rua. Raios.
Seguiram. Estava mais claro. Viram próximo à porta da cozinha um gato. Negro, todo negro. Encarou os dois, olhos amarelados.
A jovem gelou, mais temor a abatia. ----- Como esse animal entrou aqui? Ela perguntou ao marido.
Ele, claro, não sabia. E o gato ali, parado, a lhes encarar, olhar agressivo, de querer atacar.
Carlos Tito foi à porta da cozinha, a abriu. O animal correu, foi pra baixo da mesa. Pegou a vassoura, pôs o gato para fora. Chuva torrencial. O animal sumiu nas trevas, sob as águas.
Fechou a porta. A lâmpada da sala acendeu, sozinha.
----- Deus, esta casa é mal assombrada – disse Ieda.
----- Sim, é. Bem, temos de ficar aqui neste lugar, nesta casa, é o jeito – respondeu.
Foram à sala desligar a lâmpada. Iriam dormir, estavam cansados – e agitados com o que acontecia.
Escutaram vozes. Vinham da rua, pessoas ali conversavam. Deveria ser quase 1 da madrugada. A chuva terminara.
Tentavam os dois ouvir o que os estranhos (e desconhecidos) seres conversavam. Uma voz feminina dizia: ---- Vamos embora, já fizemos o serviço.
Uma voz, agora de homem, respondeu: ----- Sim, sim, vamos. O corpo está lá, na casa. Foram embora, a mulher e o homem desconhecidos.
Dentro de casa, Tito e a mulher ficaram em silêncio. Nada mais ouviram.
Quem seriam os dois estranhos? O que teriam feito?
Foram para o quarto. Acenderam o abajur, fez-se uma penumbra. A mulher disse ao companheiro: ------ Não vamos ficar, nesta casa assombrada…
E ele: ----- Não, não. Amanhã vou conversar com a proprietária, dona Erecê. Vou desfazer o contrato…
A vítima fora morta a facadas. Lhe levaram dinheiro e joias. O gato preto foi encontrado morto, à porta da casa do idoso.
Silenciaram. Queriam pegar no sono. No quarto, a penumbra. Carlos dormiu logo. Eis que Ieda ouve miados. Vinham da cozinha. Fica nervosa, paralisada. De novo. Imagina ela: deveria ser aquele gato preto, certamente.
Não quis acordar o marido. O gato miava. Criou coragem – foi à cozinha. A lâmpada estava acesa.
O animal era ele, aquele gato estranho. Quando a viu, avançou contra ela, raivoso. Deu um salto, agarrando-se nela.
A arranhou, deixando-a sangrando na barriga.
Macabra cena, pavorosa. Ela deu um grito. O marido acordou, correu. Foi à cozinha.
Deparou-se com o animal, o felino, agarrado no vestido dela.
Rapidamente ele retira uma faca da gaveta – desferindo golpes no gato negro. Medonho.
A mulher grita, tomada de terror. Sangrando, o animal corre, foge, indo para a sala. Carlos Tito vai atrás, acende a luz. O procura. E nada. Sumiu. Misteriosamente.
No outro dia o casal soube que um ancião fora assassinado, na casa onde morava, na esquina, na mesma madrugada.
------ Creio que foi aquele casal, o que ouvimos conversando na rua… Eles assassinaram o indefeso idoso – disse Ieda.
----- É, certamente foram eles, os dois desconhecidos – concordou Tito.