O último prego do caixão
Uma chuva miúda noturna caía no Cemitério Última Morada, em Botafogo. Setenta pessoas compareceram para assistir ao enterro de Sidcrey Nevis. Amigos? Parentes? Admiradores? Não. Mil vezes não! Eram todos inimigos de Sidcrey Nevis, o síndico do condomínio Trezentos Espartanos, em Copacabana, que conseguiu a proeza de unir gregos e troianos do mesmo lado, ou seja: contra ele. Arrogante, autoritário, intolerante, maldoso e vingativo, estas eram as qualidades (ou defeitos) que despertavam a ira de quem conhecia Sidcrey pessoalmente. Cada um dos setenta desafetos do morto recebeu, na entrada do campo-santo, uma cartela de bingo das mãos de Ranulfo, porteiro do prédio no qual Sidcrey era síndico. O prêmio? Bem, o prêmio era ter o privilégio de martelar o último prego no caixão de Sidcrey. Todas as 70 testemunhas queriam muito ganhar o prêmio, mas só uma teria este prazer. Que nem o Highlander: só pode haver um! Após vinte minutos de sorteio, Matias Mandy, o morador mais antigo do Trezentos Espartanos, grita, feliz da vida: “ bingo!” Depois de Ranulfo conferir a cartela com duas testemunhas, Matias ganha o direito de fechar o caixão de Sidcrey. No exato momento em que o idoso de 77 anos bateu com o martelo no último prego do caixão do síndico, o defunto saiu do caixão quebrando tudo como uma bomba. Sidcrey tocou o terror no cemitério: arrancou cabeças, decepou mãos, braços e pernas de seus desafetos até não restar nenhum deles para contar a história. Além de síndico, Sidcrey era um morto-vivo da linhagem de Vlad Dracul e um excelente espadachim, mas nenhum dos moradores do Trezentos Espartanos sabia destas suas peculiaridades. Azar o deles...
FIM