De olhos bem fechados
A sensação, de estar diante do proibido, despertava mais deleite do que propriamente o ato prestes a ser praticado. Não era sempre que Armando tinha Laura descamisada, sobre seus braços fortes, com o quarto onde os pais dela dormem servindo como alcova para o pecado a se suceder. Se lá fora, a noite era negrume, com uma lua encafurnada pelas nuvens em meio ao céu “desestrelado”, dentro os corpos eram como carvão crepitante, com as peças de roupas se esgarçando diante da tão ávida lascividade.
Os dois se amavam com volúpia, degustando a cama que não lhes pertenciam, por entre as cobertas que já cobriram os corpos de outro casal, talvez até durante núpcias que nove meses depois permitiriam a chegada de Laura ao mundo, a mesma Laura que experimentava ali a excitação descabida, no palco de sua fecundação.
O soído da cama, acentuado pela intensidade do movimento corporal, deixava Laura em ainda mais êxtase, enquanto Armando se via cada segundo mais atraído pelo hiperbólico sussurro da amante. E assim seguiram, experimentando, cada vez mais acometidos pela jubilação, até alcançarem juntos a plenitude da fruição!
De olhos bem fechados, antes que o véu retornasse ao seu rosto, sendo tragada a nudez de um murmúrio encantador, Laura seguiu para os braços do seu galanteador, ensaiando um beijo deveras refolegado. – Pena que acabou – lamentou a ruiva, com charme, tocando seu longo e avermelhado cabelo. Ainda despida, deixou a cama que testemunhara a travessura, caminhando languidamente até ao banheiro.
- Será que devo ir embora? – perguntou Armando, ainda arfante. Apesar de atleta, daquele que passa horas debruçado sobre aparelhos de ginástica na academia, faltava-lhe forças para domar os ímpetos da bela ruiva!
- Meus pais ainda vão demorar muito a chegar! Você pode dormir algumas horas, mas precisa ir embora antes de amanhecer! – respondeu Laura, antes de ligar a ducha. Impotente diante do esforço descomunal, sofreguidão praticada durante àquelas horas, Armando não podia se fazer de rogado e aceitou repousar sobre a cama dos sogros.
Fatigado, não demorou a sucumbir, sem perceber os passos dados na suíte. Sequer percebeu a figura postada em frente à cama, velando seu sono de maneira acintosa. Após alguns minutos, deslocava-se compassadamente em direção ao banheiro, deixado com a porta entreaberta. A luz paca, que emergia da lâmpada do espelho, era suficiente para deixar perceptível o vapor proveniente do chuveiro elétrico.
A água, pelando, escorria pela vermelhidão capilar e de lá percorreria todos os cantos daquele corpo exuberante, seios inebriantes, pernas tonificadas, que instantes atrás estavam sedentos pelo prazer cintilante. Mesmo que estivesse se banhando com o líquido frígido daquela noite gélida, ainda permaneceriam acesas as labaredas, bastava rememorar algumas daquelas traquinagens e quantas. Por um instante, chegou a se sentir mal, como se tivesse invadido a intimidade dos pais, profanando seu antro de amor, mas a vontade de se render ao proibido acabou sendo mais austera. Apenas Armando havia lhe despertado essa espécie de libido e ficou assim a pensar, como era bom ter encontrado a pessoa certa.
- Eu acho que vou acabar me casando com esse cara – pensava, exultante por experimentar sensações dessa magnitude, ao contrário dos outros relacionamentos aviltantes os quais acabou colecionando. Laura desligou o chuveiro, apanhou uma toalha pendurada no cabide e passou a se enxugar, começando pelos cabelos, depois as pernas, passando para as partes íntimas. Quando sentiu que poderia sair, sem deixar inundado o banheiro dos pais, deu conta que estava sendo observada por Armando.
- Meu amor, você está acordado! Por um momento, ao desligar o chuveiro, pensei ter ouvido o seu ronco. Você nunca gostou muito de me espiar tomando banho. Juro que se tivesse lhe visto antes de terminar, iria te convidar para aproveitar a água quentinha... – Laura resolveu parar de falar compulsivamente, ao perceber o silêncio do namorado.
O vapor do banho quente havia formado uma espécie de bruma e com a fumaça gradativamente se dissipando, Laura pode perceber que havia algo estranho no semblante do namorado. Ostentava um olhar enegrecido, barba por fazer, diferente de minutos atrás, o cabelo também possuía algumas mechas brancas. O que mais lhe assustou foram os olhos vermelhos, revelando um vazio nunca antes testemunhado, parecia até exalar maldade. Como em minutos, o namorado gracioso, dava lugar aquela persona tão controversa, apinhada de dualidades!
Exibia um sorriso caliginoso enquanto a olhava fixamente, intenso a ponto de despertar desassossego. – O que está acontecendo? Você está tão estranho! – indagava Laura, já em prantos. Armando, ou aquilo que tomava sua forma, limitou-se a responder: - Putinha, suja! Você é uma vadia realmente devassa! – bradou com voz repulsiva, em seguida, deixando o banheiro a passos trôpegos.
Com a toalha cobrindo o corpo, a ruiva não se permitiu nutrir raiva pelas duras palavras e adornada pelo medo seguiu até ao quarto, encontrando Armando ainda prostrado sobre o leito, em estado de pura letargia. Ainda enrolada na veste improvisada, sem vestígio da estranha aparição, faltou-lhe coragem de procurar seus rastros pela casa. Apenas deitou ao lado do namorado, também ansiava por um repouso, faltavam algumas horas para os seus pais chegarem.
Exaurida, buscou refúgio entre a amplidão de músculos braçais do desfalecido amante. Destinaria algumas horas para dormitar, mas sem piscar, mantendo a cada segundo seus olhos bem abertos!