A LENDA DA MÃE DO OURO.
1954. Roberto dormia o sono dos justos. Ele, a esposa e os quatro filhos ocupavam a terceira casa na colônia da fazenda Esperança. Era mês de agosto. Lua cheia no céu.-" Seu Roberto!!!! Oh, seu Roberto!!!!" Um moleque descalço gritava, do lado de fora da casa. O homem se levantou. Reconheceu a voz do Vivaldinho, filho do capataz. Porta de madeira apenas encostada, sem trancas, como antigamente. A esposa se virou, na cama de colchão de palhas de milho. -"Que foi, Vivaldo????" O rapazote juntou as mãos, como se estivesse fazendo uma prece. -" Noite. O senhor me perdoe atrapalhar seu sono mas é que o pai está chamando. Precisa de ajuda." Roberto ergueu a mão direita. -" Já vou, oras! Deve ser importante! Só vou colocar a botina." Roberto entrou. Acendeu a lamparina. Calçou a botina. Colocou uma camisa de flanela. Pegou o chapéu de couro. -" Onde vai, homem????" A mulher acordou. -" O João Paulo me chama, mulher!!! Deve ser importante." Ele saiu. Vivaldo tinha ido embora. Roberto atravessou o pátio de secagem do café. Passou em frente da antiga senzala, agora um celeiro de grãos. Um barranco e uma estradinha que dava pra casa grande. Os jardins floridos. A fonte. Dois homens o esperavam. Semblantes preocupados. O capataz segurava um cavalo selado. Fabiano segurava duas mulas. -" Boa noite, gente!! Estou aqui." Disse Roberto. -" Boa noite. Desculpa te acordar, Roberto. Os três cavalos de raça do coronel sumiram. Não estão no estábulo." Roberto percebeu que era algo grave. O coronel amava aqueles cavalos. O Stabile, um italiano morador da fazenda, tinha visto homens suspeitos rondando a fazenda. Será que roubaram os cavalos do coronel??? Roberto pensou no pior. -" O coronel foi dormir. Eu o acalmei e prometi a ele que traria os cavalos de volta! Já sumiram uma vez. Devem estar pastando por aí!!! Eu irei procurar na região do Rio das Cobras, onde há pasto verdinho. Estavam lá da outra vez. Fabiano irá procurá-los no limite com a fazenda Itajubá. Podem ter seguido pela estrada pra cidade. Você, Roberto, vai procurar os abençoados cavalos na gruta da velha Catarina. Alí tem umas frutinhas que os cavalos adoram. Podem estar lá." Roberto concordou, meneando a cabeça, afirmativamente. -" Boa sorte pra nós, então." Disse o Fabiano, passando as rédeas de uma das mulas para Roberto. Cada um deles seguiu por uma direção distinta. Roberto estava preocupado. Olhou a grande lua no céu. Coçou a cabeça. -" Diacho. Sair de madrugada, nesse frio. Oxalá não tenham roubado os cavalos do patrão!!!!" Ele escutou um uivo. Fez o sinal da cruz. Pensou em lobisomem. Teria de cavalgar por uma hora. A gruta da velha Catarina tinha fama de ser mal assombrada. Foi lá que a bela Januária se matou, há trinta anos, desiludida por um amor impossível. A prima do dono da fazenda se apaixonara pelo vigário. Deixou uma carta de despedida, antes de ingerir veneno. Alguns colonos juravam ter visto o espírito da moça naquela gruta. A mula estacou. Roberto percebeu o nervosismo do animal. -" Calma, Ruanda!! Calma!!! É só uma lebre!!!!" A gruta estava a um quilômetro dele. Roberto ouviu um barulho. Olhou em direção do cafezal. A mula quase o derrubou, assustada. Um brilho saiu dos cafezal e subiu aos céus. Era como fogos de artifício no ar. Um brilho dourado que logo se dissipou. Roberto se benzeu. -" Calma, calma!!! É a mãe do ouro." Disse a si mesmo. Já tinha ouvido falar dessa lenda mas nunca tinha visto aquilo. -" Alguma carcaça de vaca ou cachorro deve estar alí, no cafezal. Os gases, presos nos ossos, se soltam e queimam no contato com o ar!!! É isso!!! A professora Josy explicou isso para meu filho Nicolau!!!! Os antigos chamam isso de mãe do ouro mas que assusta, assusta!!!" Roberto sorriu. Seguiu procurando os cavalos. -" Malditos cavalos. Queria estar dormindo!!!" O filho Nicolau. Roberto sempre achou o filho inteligente. O rapaz de quinze anos vivia numa cadeira de rodas. Roberto dava surras homéricas no filho. Numa delas, o rapaz caiu num buraco, lesionando a coluna. Nicolau era odiado pois descobrira um caso extraconjugal do pai. Roberto tinha outra esposa e um filho com uma mulher da fazenda vizinha. Frequentemente o homem cobria a esposa oficial de pancadas. Roberto gostava de roubar porcos e galinhas nas casas da cidade. Passara por sua cabeça roubar e vender os cavalos de raça do coronel. Renderiam um bom dinheiro. -" Os cavalos não estão aqui. Vai embora, moço!!!!" Roberto olhou para os lados. Não viu ninguém. A gruta diante dele. -" Vai embora, moço ruim. Ela não gosta de homem ruim!!!" Roberto viu o fantasma de uma bela mulher. A moça apontou para a gruta. -" A mãe do ouro leva os maridos ruins com ela. Eu te avisei. Sua esposa vai encontrar um novo esposo, bom e carinhoso!!!!!" Roberto deu uma gargalhada. A mula estava com medo. -" Mentira, assombração!! Você não existe. Mãe do ouro não existe!!!" Uma bola de luz intensa surgiu no céu e avançou sobre o homem. O lugar ficou iluminado. Duas horas depois, Fabiano voltou para a sede da fazenda. Trazia os cavalos do coronel com ele. O capataz sorriu, aliviado. A mula de Roberto retornou sem ele. Os moradores da fazenda fizeram buscas mas não encontraram Roberto. A polícia foi chamada. O delegado Fernando, após seis meses, desistiu de achar Roberto. Nenhum sinal do corpo. Roberto foi declarado morto. Nicolau contou pra mãe toda a verdade sobre Roberto. Stabile, o colono italiano, se aproximou da mãe de Nicolau. Eles engataram um namoro e se casaram seis meses depois. O rapaz cadeirante gostava muito de conversar com o italiano. O europeu era muito trabalhador e gentil. Aquela família foi muito feliz!! Stabile incentivou Nicolau e o rapaz se formou em Direito. Atualmente, algumas pessoas afirmam terem visto luzes sobre a gruta da fazenda Esperança!!! FIM