Wayne apaixonado - DTRL 35 - Fan Fiction
O sol da tarde sumia lento detrás da torre. Os raios solares ainda teimavam em irradiar sobre aquela parte do planeta, contudo, àquela altura, tudo era tão somente um rubro desbotado. Assim, assentava-se uma melancólica penumbra anunciando a escuridão inevitável. No ateliê improvisado no fundo da casa, os jovens fabricavam faixas, flâmulas, bandeiras e panfletos.
Mariana, a esquerdinha caviar, como apelidaram-na os colegas devido ao seu status financeiro, cortava delicadamente as faixas. O cabelo em coque deixava o pescoço branco à mostra. Robson ao longe observa atento seus movimentos graciosos. Amanda coordenava tudo na maior rigidez, sabia que se baixasse a guarda os materiais não estariam prontos para o ato no dia posterior.
- É muito injusto – esbravejou Cenoura. Enquanto estamos ralando aqui no pesado, o seu Gilmar fica só na boa e não faz nada. E amanhã ele é quem pega no microfone e leva os créditos da parada.
- Deixa de preguiça e vai trabalhar pivete – retrucou Amanda.
- Relaxa Amanda – intermediou o velho Gilmar, fumando seu inseparável cigarro. Os velhos têm a história nas costas e os novos tem-na a sua frente. No meu tempo as lutas se davam de outras maneiras. Eu não levo os créditos de nada, só tenho mais experiência do que vocês...
Um corpo nu em chamas rolou pelo telhado da casa vizinha e caiu sobre a mesa de tinta, interrompendo a conversa ao mesmo tempo em que estragara todo o penoso trabalho daquele dia.
*****
- Então me diz qual é o segredo dos poetas, nego.
- Ah meu bem! Não tem segredo nenhum. A gente só tira de onde não tem e coloca aonde não cabe.
- Seu besta – Disse sorrindo Thomas.
Robson agarrou Thomas fortemente e roçou a barba rala sobre seu pescoço. O companheiro amava isso. Haviam três meses em que os dois estavam juntos e esses foram, certamente, os melhores três meses de toda a vida de Robson. O mesmo não era possível dizer sobre Thomas, pois ele não se lembrara do que aconteceu antes que caísse denudo no ateliê naquele fatídico dia. O certo é que Robson tratou de seus ferimentos e queimaduras e, talvez por isso, entre ambos brotou uma irresistível e arrebatadora paixão.
Beijaram-se livremente naquela calma e ainda inocente manhã. A cada beijo aflorava mais o desejo de ir além. De ir a um lugar onde não existe lugar nenhum, mas que somente as almas apaixonadas sabem que existe. E isso não era poder de outro mundo, era apenas o poder do amor.
- Cuidado! Tem manifestação hoje – alertou Robson!
- O mundo pode esperar – insistiu Thomas.
- Mas a educação não. Você sabe os impactos que estes cortes vão gerar a médio e longo prazo...
- Relaxa amor – interrompeu Thomas. Você não quer dar uma aula de conjuntura para mim né?
Naquele dia a marcha ocorreu no centro da capital, denunciando os retrocessos na educação levado a cabo pelo novo Governo. Embora Thomas não lembrasse da vida pregressa, mostrou-se muito identificado com as ideias progressistas, portanto, lutar contra o Governo de extrema-direita que acedeu ao poder naquele período foi muito fácil.
Robson fazia parte de um grupo de jovens poetas chamado “Palavras Rebeldes” cujo objetivo consistia em distribuir poesias no metrô, bem como grafitá-las em muros e paredes, deixando, consequentemente, as cidades muito mais do que uma imensa montanha cinza. Faziam parte de algumas comunidades virtuais para divulgarem sua arte – o site Recanto das Letras era o que mais adoravam. Sua tarefa em dias de manifestação era postar os vídeos em redes sociais: Youtube, Facebook, Whatsapp entre outros. Portanto, seu dever não era gastar a sola do sapato na rua, porém, continha a mesma nobreza, pois era da sala de sua casa que os vídeos invadiam as redes e denunciava os desmandos das autoridades, bem como a extensão dos protestos.
Naquele dia 26 os protestos se estenderam até a noite. Thomas que não possuía afinidade com a tecnologia, ou pelo menos se algum dia obtivera, escondeu-se em algum lugar junto com as lembranças do seu passado, deixava o companheiro em casa e ia para a rua marchar juntos com os milhares que sempre se reunia na praça da cidade.
Já era noite e o vento andava apresado sobre as árvores da cidade. As pernas trêmulas de caminhar queriam arrego. Uma cerveja, deitado sobre o sofá assistindo ao sucesso da mobilização no Jornal Nacional, era tudo o que desejava naquele momento. Certamente Robson já deveria ter preparado algo para o jantar, então não tinha muito para se preocupar naquela noite.
Quando se aproximou de casa estranhou as fortes marteladas do portão sobre o batente. “O Robson nunca deixa o portão aberto” pensou. A luz acessa era o único sinal de presença humana naquele recinto. Thomas adentrou em silêncio e sobre o tapete da porta de entrada já pôde observar vestígios de que uma luta houvera ocorrido ali.
O computador jogado ao chão, o sofá de pernas para o ar e uma imensa poça de sangue que dava uma nova coloração ao piso de madeira, provocou infinitos espasmos em seu coração. Acompanhou o caminho de sangue que dava até o banheiro da casa e presenciou a cena mais abjeta que já houvera vivenciado.
O corpo de Robson jazia sobre a banheira imerso em rubro. O membro genital foi-lhe decepado e enfiado na própria boca e escrito em sangue sobre a parede do banheiro: “Abaixo a ditadura gayzista”.
Thomas caiu de joelhos sobre o cadáver do amado.
- Você não acha que foi longe demais Clarck? Perguntou a Mulher Maravilha que assistia a cena por um monitor na casa vizinha.
- Estamos em um país doente Diana. Aqui esse tipo de evento é natural, às vezes até incentivado. Ele precisava de um choque para voltar a realidade.
- Não se faz uma omelete sem quebrar os ovos – suspirou Questão.
*****
Três meses atrás...
O chamado para a torre da Liga da Justiça veio direto do Ministro da Justiça. Batman poderia ter enviado qualquer membro de hierarquia inferior para atender a demanda, contudo, há algum tempo o Questão já havia lhe informado sobre perigosas transações entre este país e Lex Luthor, portanto, resolveu examinar pessoalmente.
A missão consistia em capturar um poderoso traficante de drogas sintéticas que houvera se estabelecido em uma favela da cidade e que a Polícia Federal, ligada ao Ministro da Justiça, conseguira rastrear.
Batman deveria ter desconfiado da informação, ter atendido à sua intuição que soava estridente no ouvido. Ocorre que ele estava muito mais preocupado em desbaratar mais esta trama política que afetava mais um país Sul-Americano, do que os perigos inerentes a ela. O traficante estava realmente no local informado, o que Bruce Wayne não sabia, no entanto, era que todas as instituições já estavam alinhadas a Lex Luthor e que junto ao traficante havia-se instalado uma bomba cujo propósito era dar cabo a sua vida.
A bomba explodiu no exato momento em que Wayne adentrava na casa da favela, jogando-o, consequentemente, em chamas sobre os telhados das casas vizinhas.
*****
Chovia fino sobre o cemitério enquanto bandeiras vermelhas envolvia o corpo de Robson que descia para o local onde deveria descansar eternamente.
- Pronto para voltar para casa patrão Bruce – disse Alfred para Thomas enquanto este jogava as últimas flores sobre a urna.
*****
Nem Bruce Wayne nem tampouco Batman, só conseguia ser Thomas. Nem Diana nem Selena, seu coração apenas tinha espaço para Robson.
Resolveu então viajar novamente para o Brasil a fim de que as lembranças lhe arrancassem da amargura. Quando foi entrando pela porta do Café Insurgente, local em que viveu intermináveis tardes agradáveis ao lado de Robson, seu mundo quase veio a baixo. Não era possível. Aquele cabelo, aquela pele. “É ele! ”.
- Robson! – gritou.
O rapaz virou com um olhar de estranheza e respondeu:
- Não, sou o Rodrigo. O Robson era meu irmão gêmeo. Foi assassinado alguns meses atrás.
Saiu transtornado. Mas pôde ver, pela vidraça da parede, Mariana sair do banheiro e sentar-se à mesa junto com Rodrigo.
Alfred encontrou o patrão pela manhã com uma corda amarrada no pescoço. Sobre o criado mudo um bilhete:
“Abaixo a cultura homofóbica”.
Tema: Gêmeos