Mesmo depois de morrer
Eu vi do alto daquele prédio aquela jovem se atirar. Enquanto seu corpo voava, de cabeça para baixo, rumo à morte, meu coração disparava de prazer. Há. Como é divertido ver o fim da vida de alguém chegar, ainda mais sendo do jeito que foi; com o corpo estraçalhado na calçada e com sangue salpicando nas paredes e nos carros estacionados no meio fio. Lentamente fui descendo as escadas e formulando em minha mente todo o cenário. Pessoas ao redor, com olhares de espanto e admiração; uns tirando retratos e alguns virando seus rostos pelo horror que o ocorrido se mostrava.
Era uma adolescente. De cabelos loiros, olhos verdes, com semblante cansado. Estava com uma saia curta, de cor preta, e uma camiseta branca tingida de vermelho sangue. Cheguei à calçada e pedi licença. A moça estava caída de bruços, sua cabeça estava virada do avesso e seus olhos me olhavam como se pedissem misericórdia. Mas eu não tenho compaixão desse tipo de gente. Pois elas merecem esse destino cruel, por serem fracas, por aceitarem as tristezas sem ao menos lutarem contra suas fraquezas.
Um senhor que usava suspensórios botou um jornal para esconder o rosto da moça, mas o vento passou e levou aquele pedaço de papel recheado de notícias ruins, e a morte daquela moça seria mais uma nas estatísticas no índice de suicídios. Como se não tivessem mais nada a fazer o povão foi por ali ficando. Era como se um artista famoso lá estivesse, a cantar seus maiores sucessos para uma multidão em polvorosa.
O carro da polícia parou e eu vi saltar duas mulheres que mal olharam o defunto e deram sua rápida conclusão do caso. A moça estava morta, morta instantaneamente. Devido à queda de mais de dezesseis metros de altura. Coitada, preferiu morrer a ter uma vida toda pela frente. Seu corpo foi colocado num caixão de ferro todo enferrujado e levado rumo ao IML.
Após o furdunço a multidão se dispersou, e eu atravessei a rua. No meio do meu caminho dois carros e uma colisão frontal, um moço arremessado contra o poste e uma mulher com o corpo dependurado entre o para-brisa e o capô; no outro veículo um homem com o rosto cheio de sangue de braços caídos e de olhos esbugalhados, ele ainda sorria mesmo depois de morrer.