O Menino do Espaço - DTRL35
Em um campo aberto, à noite, um homem e uma menina conversam enquanto observam o céu estrelado.
- Papai, um dia eu quero conhecer o espaço.
- Claro, filha. Um dia você chega lá!
- Vai ser muito legal, né.
- Sim, meu amor. Vai ser uma grande aventura.
- Te amo, papai.
- Eu também te amo, filha. Agora vamos voltar. A mamãe já deve estar preocupada com a gente.
Anos se passam.
Alto-falantes tocam o jingle da Turismo Gideon.
- Sejam bem-vindos, senhores passageiros. O cruzador com destino ao planeta Tundra irá decolar. – Por favor, apertem seus cintos e deitem suas cabeças – em casos de enjoo, aperte o botão do assistente inteligente de bordo ou espere por uma de nossas aeronautas atendê-lo.
Fim da mensagem.
Os motores de propulsão começam a vibrar com a combustão.
Esta é a primeira viagem de Najila como aeronauta.
- Pai, eu queria que o senhor me visse – pensou a jovem. Estou tão feliz.
O alto-falante da sala dos comissários de voo liga.
- Bom dia, equipe! Aqui é o Capitão Matias falando. Gostaria de desejar primeiramente um bom voo para todos. Segundo, hoje temos no hall de passageiros alguém muito especial – e rico – é o menino Ney. O grande goleador da Copa Interplanetária. Por favor, tratem-no com muito zelo.
A equipe ficou animada. Era a primeira vez que uma celebridade voava com aquela empresa de turismo planetário.
O capitão continuou a falar.
- Nosso destino é o planeta Tundra. Os mais ricos da Terra passam férias lá, no entanto, atravessar a atmosfera é sempre difícil por causa das densas nuvens de gelo que se formam em meio às nuvens gasosas. Por isso, em caso de algum incidente, deem prioridade à segurança do menino.
O som dos propulsores aumentou. Aquele era o sinal de que a nave estava pronta para decolar.
- A nave está pronta. Vamos partir. Câmbio, desligo.
O capitão empurrou a alavanca de partida.
As turbinas cuspiram fogo e fumaça.
A nave fez um barulho como um trovão, e rapidamente seu bico já atravessava a atmosfera.
Para trás, um imenso planeta azul, à frente, um enorme vazio cheio de pontos brilhantes.
Na cabine do cruzador.
- Copiloto, ative o navegador e o coalizador de matéria-escura. Vamos realizar o salto.
Sam ativou o que pediu seu capitão.
O computador ligou um mapa holográfico que mostrava a rota até Tundra, o planeta do inverno.
A voz mecânica da Inteligência Artificial informou.
- Coalizador pronto para salto. Esperando confirmação de voz.
- Pode saltar – disse o capitão.
- Comando de voz confirmado. Salto em 3... 2... 1.
O espaço visível deu lugar a um borrão de cores.
O cruzador foi sugado pelo miúdo buraco-negro.
Em microssegundos, milhares de quilômetros de anos-luz foram atravessados.
A nave apareceu no quadrante mais externo da galáxia de Andrômeda, sistema que abriga o planeta.
Najila conversava com Andrea quando um alarme em seu capacete mostrou que um passageiro precisava de ajuda.
- Vamos conversar mais depois. Alguém precisa de uma mão – disse Najila.
- Tudo bem, amiga. Vai lá e boa sorte – respondeu Andrea fazendo um sinal de ok com a mão.
O visor inteligente do capacete mostrava para Najila qual era a cabine.
Era uma da classe premium.
- Eu não deveria atender gente premium – pensou a novata.
A aeronauta atravessou corredores e encontrou com outras equipes de comissão antes de chegar ao quadrante das cabines.
Os premium ficavam em quartos que proporcionalmente cabiam setenta cabines simples de oito metros quadrados cada.
A comissária parou em frente à escotilha, que mostrava uma holofoto do jogador.
- Senhor, aqui é a aeronauta Najila.
A escotilha se abriu.
Neymar realizava supinos em uma máquina de exercícios gravitacional.
Seu corpo era forte e definido, uma obra da medicina biomolecular dos últimos anos.
- Senhor qual o problema?
- Olá, eu preciso de ajuda – disse o menino Ney enquanto realizava a última série – eu perdi o meu anel.
A novata não gostou de ser chamada para algo tão sem importância.
- Desculpe, senhor. Não entendi a sua requisição.
- Escuta aí, razão da minha libido!
- Senhor, este comportamento é intolerável. Por favor, contenha-se.
- Ai, ai – disse o jogador lambendo os lábios. – Você é bela, eu sou rico. O que você quer para que eu a tenha?
- Acho que você precisar orar!
- Ha ha ha – é assim mesmo que eu gosto – quanto mais santinha, mais quente é na cama.
A aeronauta deu às costas para o jogador, que olhava fixamente para seu corpo.
Najila suava frio - ela nunca pensou que passaria por uma situação tão inconveniente - sua beleza era um atributo expressivo, mas a jovem não gostava de usá-lo como recurso para conquistar seus objetivos.
- O que foi que aconteceu, Najila? Questionou Andrea.
- Nada de mais, talvez uma perda de pressão... coisa de principiante, né.
- Tá bom, vai retocar o batom que logo iremos descer.
O jingle da Gideon tocou outra vez.
As luzes da nave piscavam de maneira intermitente e os alto-falantes começaram a passar uma mensagem de pouso.
- Senhores e senhoras, a nave entrará em processo de pouso, por favor, apertem os cintos.
A carcaça da nave rangeu um pouco, efeito da densa atmosfera do planeta Tundra.
No deck do foguetoporto, luzes piscavam sinalizando a pista de aterrissagem.
Em terra, todos os passageiros foram devidamente desembarcados. Uma música de boas-vindas tocava na entrada do foguetoporto.
- Ei, Najila! Gritou Gustav – o capitão quer falar com você.
A aeronauta de bordo se virou para respondê-lo.
- Agora?
- Sim, ele está no convés da administração.
- Pra qual lado fica?
- Você segue em direção ao setor E, de lá tome um planador para o primeiro andar. Vai haver centenas de controladores. Lá é o convés administrativo.
A jovem memorizou tudo o que Gustav falou.
Ela chegou no setor E, mas achou estranho que lá não havia planador e nem andar superior. Havia apenas centenas de enfileiradas prateleiras cheias de caixas.
- Será que é por aqui mesmo? Pensou alto.
No fim do corredor, uma sombra se projetou na parede.
- Ei, ei! Aqui é o setor E?
A sombra torceu sua forma e desapareceu, reaparecendo em uma parede mais ao fundo.
- Espera aí, aqui é o setor E? – disse Najila andando de maneira apressada.
Quando quase alcançou a sombra, um homem vestido com um tipo de roupa cerimonial apareceu.
Ele se forçou sobre ela, forçando junto um pano molhado sobre seu nariz e boca.
Najila desmaiou.
Quando voltou a si, ela sentiu o cheiro de incenso e muito frio. Seu corpo estava rígido. As pontas de todos os seus dedos estavam dormentes.
Ela percebeu que estava acorrentada a uma pedra de cor vermelha, que brilhava com a luz das velas à sua frente, centenas delas formavam um decagrama.
No centro, uma velha Baba Yaga com uma enorme corcunda cantava um antigo ritual.
- Zigurati, Oranis Yasu Lamarius Grasai Criole Naschiterá Salmonai – venha até a mim filha das estrelas, grande meretriz, senhora das hordas – as chamas das velas tremulavam como se dançassem.
Um vento percorreu o interior do recinto e o encheu de névoa.
Najila se esforçava para enxergar algo. Ela via apenas a silhueta da bruxa se contorcendo em meio à névoa.
Houve silêncio.
Depois passos na neve. Ela não estava em um lugar fechado, mas em meio à uma floresta de árvores de troncos brancos e galhos sem folhas.
- Ainda estou em Tundra – pensou a jovem.
Nua e acorrentada, a jovem gritou.
- Socorro!
A Baba Yaga pulou para calar sua boca. A bruxa apertou com tanta força a boca de Najila, que ela sentiu as unhas da feiticeira ferirem suas bochechas.
- Desgraçada! Você que me matar? Gritou a jovem para sua captora.
- Cale-se! A caçada vai começar.
- Que conversa é essa?
Um grupo de pássaros da neve levantaram voo.
Neve caía levemente sobre seu corpo.
As correntes se afrouxaram, fazend0-a cair da pedra cerimonial.
Solta, ela percebeu que no seu ventre havia um símbolo desenhado, uma espécie de tridente, que na língua Baba quer dizer – sacrifício -.
- Corre! Corre!
- Pra onde? Perguntou para a bruxa.
- Ele vem. Veja – disse Baba Yaga apontando para um homem conhecido de Najila.
Era Neymar, o jogador.
Ele não vestia nada para se proteger do frio. Na sua mão, uma lança de pedra lascada e no rosto um sorriso demoníaco.
- O que está acontecendo aqui? – perguntou a jovem protegendo os seios que estavam à mostra.
A lança percorreu os ares, acertando de raspão sua perna direita.
A aeronauta percebeu que era sério. Ela precisava sobreviver àquilo.
Determinada a viver, ela se levantou e correu floresta à dentro, chegando à beira de uma queda d’água congelada. No fundo, estacas de gelo esperavam como dentes para mastigar a carne de alguém.
O jogador a seguiu por causa do sangue na neve. Ela estava encurralada.
Quando a viu, ele se atirou para cima de sua presa.
- Eu a terei de um jeito ou outro – disse o menino.
- ME SOLTA! ME SOLTA!
Os corpos rolavam pelo chão.
Ele a pressionava contra a neve para consumar seu desejo.
Ferida, a jovem tateava o chão em busca de uma salvação, e ela veio em forma de galho - grosso o suficiente para acertar a cabeça do jogador - que levou um golpe entre os olhos e nariz, que se quebrou.
O predador se levantou de cima da sua presa para levar suas mãos até seu nariz quebrado, que jorrava sangue.
Najila viu a oportunidade de correr para longe dali.
Mas antes que pudesse alongar alguma distância, um disparo a paralisou.
No meio da testa, um buraco fumegava.
Seu corpo caiu inerte na neve.
Neymar gritava a algumas centenas de metros.
- Shut up, man! I told folks... He was weak to the Game – disse Trump vestido com um uniforme rajado
- MINHA PRESA! Gritava o menino Ney.
- Tá, ok – na próxima meu filho vai ser a companhia de caça dele, tá, ok? Respondeu Bolsonaro ao presidente norte-americano.
- Good... very good!
- Ei, companheiros – disse Lula – Que merda é essa?! Já acabaram?
- Já, o garotão se empolgou.
- É uma pena. Na próxima ele se acostuma. Vamos beber?
- Let’s!
- Eu quero cerveja!
- Boa, Messias, eu tenho pinga.
Os jogadores foram se afastando, deixando para trás apenas o ruído de seus passos abafados pela neve e Neymar gritando sua dor.
Ali ficou Najila, encarando o céu branco de Tundra com seus olhos mortos.
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