A História de João Baiano

Era início dos anos cinquenta. E foi lá, em pleno sertão, na serra de Japeri, que essa história aconteceu. E foi assim:

Mais ou menos lá pelo meio de uma grande serra de mata fechada, existia um descampado onde, em um humilde casebre de taipas morava o João Baiano. Ele era um velho ranzinza e encrenqueiro, que quando mais jovem tinha sido um carvoeiro, como quase todos os habitantes daquela região. Mas agora sobrevivia da venda de porcos e galinhas que criava e vendia na feira dominical do pequeno vilarejo.

Muitos achavam estranho o fato dele; um negro velho e rabugento, já beirando os seus oitenta anos, ter como mulher uma índia chamada Jurema, que certamente tinha menos da metade da sua idade e que ainda por cima era a mãe da pequena Lia, que tinha cerca de uns três aninhos de idade.

Ele transmitia a todos a imagem de ser um bom chefe de família, o que era de se estranhar, porque tinha a fama de ser muito ciumento e brigão, principalmente quando ele enchia a cara de cachaça nos bailes que os carvoeiros costumavam organizar quando recebiam o pagamento pelo carvão que produziam e que eram vendidos para um comerciante do lugarejo.

E foi justamente a partir da semana seguinte à realização de uma quermesse no vilarejo, onde depois de mais uma vez ele ter abusado da cachaça e ter sido visto brigando com sua mulher quando voltavam para sua casa que, nem ele nem a sua família foram mais vistos naquela região.

Tendo se passado cerca de um mês sem que se tivesse qualquer notícia deles, alguém resolveu comunicar o fato ao delegado da região. O delegado então foi até a aquela humilde casa, que já parecia estar há muito tempo abandonada. Arrombando a velha porta de madeira, entrou para investigar.

À primeira vista, com tudo muito bem arrumadinho, parecia que a família apenas tinha saido em viagem, deixando tudo pronto para quando voltasse. Só que olhando melhor o quarto do casal, o delegado observou que um cobertor estava muito bem estendido, só que em debaixo da cama, enquanto que em cima dela só estava um velho e surrado colchão. Com o seu faro investigativo, ele sentiu que alguma coisa ali não combinava; havia algo estranho no ar...

Então ele pediu que seu auxiliar puxasse o cobertor para fora. E quando isso foi feito, uma cena dantesca chocou a todos que ali estavam; diante dos seus olhos, esquartejado e dividido em quatro partes, cujas bordas já estavam até disformes, comidas que foram pelas minhocas ou formigas, surgiu aquilo que um dia fora o corpo do velho João Baiano. Foi um alvoroço total...

Quem teria feito uma atrocidade daquelas com ele? Perguntavam-se mútuamente a si mesmos. Deve ter sido a sua esposa Jurema... Era a única resposta plausível que encontravam. Mas, se foi ela; cadê ela? Cadê a india Jurema???

Ninguém até hoje jamais conseguiu a resposta para essa pergunta; nem aquele delegado.