A Lenda da Pequena Izah

Em uma linda e clara noite de lua cheia, ao som de tambores e de uma alegre cantoria, os nativos festejavam mais um aniversário do seu cacique e pajé. Ele estava duplamente feliz porque, ao mesmo tempo em que comemorava seu aniversário, já comemorava também o nascimento do seu primeiro filho que estava para nascer a qualquer momento. Estava mais feliz ainda, porque a velha e experiente india parteira lhe havia garantido que, pelo jeito e tamanho da barriga; era um menino, seu primogênito e herdeiro.

A festa estava super animada até o momento em que ele foi chamado para ir até a tenda onde sua esposa estava em trabalho de parto; o neném tinha nascido. Mas tão logo ele pegou a criança em seu colo, uma terrível transformação ocorreu no seu semblante. Aquele ar radiante de felicidade, súbitamente se transformou em numa expressão de de decepção ódio jamais vista em sua face. Saindo de lá totalmente transtornado, ele simplesmente acabou com a festa.

Sem ter entendido nada do que tinha acontecido, alguns indigenas ainda permaneceram por lá durante algum tempo, mas foram aconselhados para voltarem para as suas tendas. Qual teria sido o motivo daquele seu súbito rompante?

A razão de tudo que aconteceu, foi que aquele tão esperado primogênito do caique, não era um filho, era uma filha; uma bela e rechonchuda indiazinha. E ele, que também era o pajé da tribo, conhecia muito bem os costumes de sua tribo. Segundo os costumes, o filho primogênito do pajé tem que ser um menino, já que é ele o seu futuro sucessor. No caso de nascer uma menina, quando completar uma semana de vida ela deve ser enfeitada com muitos colares de pedras coloridas e no meio da noite, ser atirada no rio como oferenda ao deus da pesca.

O cacique não quis nem olhar mais para a sua pequena indiazinha, pois já sabia qual seria o seu inevitável destino. Mas a sua mulher, mãe de primeira viagem, não teve como não ser tomada de amor e carinho pela sua bela filhinha. Decidiu cuidar dela com muito amor até a chegada daquele fatídico dia. Os dias que se seguiram pareciam passar voando para aquela sofrida mãe.

E foi então que na véspera do dia do sacrifício da pequenina Izah, foi esse o nome escolhido para a indiazinha, sua mãe tomou uma decisão inusitada; decidiu fugir com a sua filhinha, não permitindo o seu sacrifício. E no meio daquela noite escura, aquela jovem india embrenhou-se mata adentro com sua filhinha nos braços, desaparecendo para sempre. Já no dia seguinte, notada a sua ausência buscas foram feitas, mas elas não foram encontradas.

Algum tempo se passou. O cacique já tinha, talvez até por precução, arrumado duas esposas, já que isso lhe era permitido e uma delas já estava prestes a lhe dar o tão esperado primogênito. Muito ressabiado, ele resolveu não comemorar nada até que tivesse a certeza de que dessa vez viria o seu sucessor. E não deu outra; nasceu um belo e forte indiozinho. Ele logo tratou de providenciar uma grande festa para comemorar a chegada do seu herdeiro. A sua alegria foi maior ainda quando soube que a sua outra esposa também já estava nos seus primeiros meses de gravidez

Só que aquele menino que nasceu esbanjando saúde, ao invés de se desenvolver naturalmente começou, sem nenhuma causa aparente a definhar lentamente, vindo a falecer com poucos meses de vida.

O cacique ficou apavorado, porque além de ser o pai daquele menino, era também o pajé da tribo e como tal tinha a obrigação de saber explicar a causa da sua morte e isso ele não tinha como explicar, porque o menino nasceu forte e sadio e se alimentava bem. Ele simplesmente não podia entender porque ele foi emagrecendo tanto a ponto de morrer tão seco.

Mas a boa notícia é que a sua segunda esposa, também grávida já estava prestes a dar à luz. Ele, tal como já havia feito anteriormente, aguardou até o nascimento da criança; nasceu outro menino. A festa foi ainda maior que a anterior. E dessa vez ele providenciou para que tudo desse certo com aquele menino. colocou dois guerreiros de guarda, dia e noite, diante da tenda onde ficavam a mãe e o menino, para que ninguém dele se aproximasse, pois desconfiava que alguém poderia dar a ele alguma coisa que pudesse lhe fazer mal.

Quase que diárimente o cacique vinha, como pajé, verificar se tudo estava bem com o menino. Nas primeiras semanas, como já acontecera anteriormente, tudo estava bem. Mas pouco tempo depois já se verificava que algo de anormal tinha acometido com aquele menino, porque ele também já começava a definhar. Foi então que o cacique, além de reforçar a guarda, começou a dar uma 'incertas' durante a noite na tenda onde ficavam a mãe e o menino. E foi durante uma dessas suas investidas que, ao entrar na tenda ele notou algo meio brilhante que pendia da rede onde estavam mãe e filho, aproximando-se cuidadosamente e levou um grande susto com que acabava de vera; enrolada sob a rede onde os dois dormiam, uma enorme caninana mamava no seio da mãe, enquanto o menino, gulosamente chupava a ponta da sua cauda. Com um forte grito ele chamou os indios que estavam de guarda para que matassem aquela cobra, mas eles se acovardaram e ficaram como que, paralisados diante daquela gigantesca cobra, que saiu rápidamente por onde havia entrado, desaparecendo na mata.

O cacique reuniu imediatamente um grupo de guerreiros e saíram em seu encalço conseguindo encurralá-la em um canto onde a mataram. Ela era tão grande que foi preciso vários homens para arrastá-la até o centro da aldeia, onde no dia seguinte seria mostrada como troféu e oferecida ao deus da caça.

Já na manhã do dia seguinte uma multidão estava em volta daquela enorme cobra, aguardando a presença do cacique que, como pajé iria presidir a cerimônia. Logo assim que ele chegou, chamaram-lhe a atenção para o fato de que no ventre daquela serpente havia um volume, que poderia ser algum animal que ela tivesse engolido. Então ele mandou que lhe abrissem a barriga e, qual não foi a surpresa que tiveram quando verificaram que não se tratava de nenhuma caça, aquilo era na verdade um crânio humano que, pelo seu tamanho era de uma criança. O espanto foi geral e aterrorizante quando, ao espetarem nele um galho para erguê-lo e retirá-lo do ventre daquela cobra, perceberam que dos dois orifícios onde seriam os seus olhos, pendiam alguns vistosos e coloridos colares de pedras, justamente aqueles que a pequenina izah usaria no dia em que seria sacrificada...