Joca Tatu e a Sexta-feira 13

Existe nos arredores de uma pacata cidadezinha do interior, como que reinando sobre todo aquele infindável horizonte azul, bem lá no alto de uma grande e verdejante colina um gigantesco, imponente e secular jacarandá.

Localizado bem no centro de um grande descampado que mais parece um enorme tapete verde e cercado por uma densa vegetação que começa bem às margens de uma estrada de terra batida que corta aquela região.

Sobre ele existe uma história muito antiga que os mais antigos costumam contar. Dizem que desde os tempos dos escravos que em todas as meia-noites de sexta-feira 13, as almas penadas costumam se reunir ao pé daquele velho jacarandá, onde oferecem sacrifícios macabros para os espíritos, razão pela qual ninguém jamais se atreve sequer a passar lá por perto em tais noites.

Mas eis que em certa ocasião; exatamente em uma sexta-feira 13, estava por aquelas bandas passando férias na casa de parentes um cara muito gente boa, mas que era muito conhecido também como falastrão e fanfarrão, pois gostava muito de contar vantagens e histórias de coragem e valentia, em que ele era sempre o principal protagonista. Seu nome era João Carlos, mais conhecido como 'Joca Tatu', porque era 'fissurado' pela carne de tatu, um animal muito comum naquela região.

E foi justamente na tarde de uma sexta-feira 13, quando bebia com amigos em um barzinho que ele, por uma boa quantia em dinheiro, foi desafiado a provar a sua coragem; e ele aceitou o desafio.

O desafio era o seguinte: A turma iria preparar para ele um saco de dormir e uma lanterna, para que ele passasse aquela noite sózinho lá ao pé do jacarandá. Eles o levariam até a estrada, de onde ele tinha que seguir sózinho até lá. E quando o relógio estivesse marcando exatamente meia-noite, ele deveria virar a lanterna para a estrada, onde ainda estariam os seus amigos e piscar três vezes, provando que cumpriu a primeira parte da missão, seus amigos então iriam embora, deixando-o lá sozinho, voltando pela manhã bem cedinho para pegá-lo.

Ele ainda esnobou a turma, dizendo que além disso ainda levaria o seu celular para tirar lá uma 'selfie', focalizando a meia-noite no seu relógio, para mostrar a todos a sua coragem.

E a primeira etapa foi de fato cumprida conforme planejado; até então tudo estava correndo dentro daquilo que fora planejado...

Já na manhã do dia seguinte, bem cedinho, lá estavam os seus amigos para buscá-lo. Mas, cadê o Joca?

Eles esperaram por por ele por um bom tempo. Depois, pensando que ele pudesse estar ainda dormindo, alguns dos jovens sairam ao seu encontro. Chegando até o grande jacarandá eles não o viram. Acharam estranho, porque o saco de dormir ainda estava fechadinho, como se não tivesse sido usado. Resolveram então dar uma olhadela pelos arredores e logo o avistaram; ele aparentava estar de cócoras e de costas, com as duas mãos apoiadas em uma pedra de uns dois metros de altura. Eles deram uma grande gargalhada quando viram aquela cena e se aproximaram ainda rindo muito pensando que ele estivesse fazendo sabe-se lá o quê...

Mas eis que aquele momento de alegria pelo reencontro acabou se transformando em momento de pavor quando, ao chegarem mais perto, seus amigos presenciaram o seguinte quadro: Com a sua bermuda arriada até os joelhos, de cócoras e de frente para aquela pedra ele estava imóvel e com as duas mãos apoiadas nela... Ao se aproximarem ainda mais, eles vislumbraram uma cena que difícilmente será apagada de suas mentes; seu amigo, o Joca, tinha sido empalado por uma garrafa daquelas de cidra, semelhantes àquelas de champanhe, que lhe fora introduzida quase que totalmente. Ainda saia das suas entranhas um pequeno filete de sangue, que escorria lentamente por sobre uma folha de bananeira, que servia de calha até uma pequena bacia de barro, que já transbordava de tão cheia ...

Apavorados eles saíram dali em desabalada carreira. Contaram o que tinham visto aos outros que tinham ficado na estrada e voltaram todos para a cidade, para as devidas providências.

Mais tarde a perícia chegou. Quando eles viraram o corpo do Joca constataram que, fora a garrafa de cidra, ele ainda foi supliciado com sete charutos que, enfiados todos de uma vez, lhe estouraram a boca. E em seu peito desnudo havia sido gravado à faca, com cortes bem profundos: DCLXVI. Talvez fosse a mensagem deixada para que não pairasse nenhuma dúvida a respeito da autoria daquela dantesca obra.