O Homem sem Memória
Acordou com o corpo todo dolorido, num banco de praça da capital fluminense. Não sabia quem era, nem como foi parar ali. Sua memória era como um HD (Disco Rígido) completamente vazio. Mexeu nos bolsos de seu terno preto em farrapos. Não havia carteira, dinheiro, nem nenhum documento que o identificasse. Numa loja próxima, havia um espelho. Ao ver sua imagem refletida nele, não se reconheceu. Não sabia o nome do homem de meia-idade, de cabelos dourados ralos e alto como um arranha-céu que via no espelho. A situação era tão surreal que parecia que ele era um personagem de algum dos livros do genial escritor Franz Kafka! Na banca de jornais, o homem sem memória tentou ler as manchetes dos jornais pregados do lado de fora dela, mas sem sucesso. Tentou conversar com o jornaleiro para pedir informações, mas o vendedor de revistas e jornais não entendeu uma palavra do que ele dizia. A recíproca era verdadeira: o homem sem memória também não entendeu o jornaleiro. Sem escolha, o desmemoriado caminhou mais um pouco e entrou num restaurante. Olhou o menu e não entendeu nada do que estava escrito. Estava faminto, num país que não era o dele e sem um tostão no bolso. Triste sina. O homem sem memória tentou, então, se comunicar através de mímica com o gerente do restaurante para ver se conseguia alguma comida, mas não teve êxito. O gerente não era do tipo que dava comida de graça para mendigos. Desesperado foi a um supermercado. Neste local, surrupiou um pacote de biscoitos de chocolate, mas foi surpreendido pelo vigilante do comércio no momento em que saía sem pagar. Acabou sendo conduzido para uma delegacia. Lá, finalmente, entendeu tudo. Pelo exame de impressões digitais, soube que seu nome era Pedro Augusto Nevist, que era brasileiro, natural de Minas Gerais, e ... analfabeto! Além disso, descobriu que ninguém entendia o que ele dizia, porque ele tinha extraído sua laringe, provavelmente por causa de um câncer, ou seja: Pedro Augusto achava que falava, mas, na verdade, não conseguia emitir nenhum som com sua boca. Por outro lado, Pedro Augusto Nevist não compreendia o que falavam com ele, porque... era completamente surdo! Quem atestou a ausência da laringe e a surdez de Pedro Augusto Nevist foi o experiente médico legista que o examinou na delegacia. Entretanto, os policiais descobriram que o homem sem memória sabia um pouco de Libras, a Língua Brasileira dos Sinais, utilizada pelos deficientes auditivos para se comunicar, e foi nesta língua, com a ajuda de um intérprete, que os policiais e o desmemoriado conseguiram se entender.
Após descobrir tudo isto, Pedro Augusto Nevist foi liberado e encaminhado para um abrigo. Mas, não foi para lá. Após sair da delegacia, lembrou-se de tudo. De sua profissão (era matador de aluguel), do terno preto que vestira para ir ao enterro de sua mulher (que assassinou pelo fato dela querer deixá-lo para ficar com um zé ruela) e recordou-se também de sua fuga apressada de Belo Horizonte para o Rio de Janeiro. Por último, lembrou-se que foi assaltado assim que saiu da rodoviária carioca e apanhou à beça do ladrão por não ter muito dinheiro consigo. Um psicopata assassino a solta, no Rio de Janeiro: este era Pedro Augusto Nevist...
FIM