Não Darei Sono aos Meus Olhos - DTRL33 - Minicontos de Terror

A moça estava sentada, olhando para o chão, quando o homem de preto entrou no quarto.

– Oi, querida. – Ele disse, com uma voz doce. Ela permaneceu imóvel. – Meu nome é Paulo. Soube que estava com problemas e vim ajudar.

– Você é psiquiatra?

– Não. Sou só alguém que veio conversar. – Janaína olhou para o copo com água já quente e a cartela de pílulas ao seu lado, depois olhou novamente para o chão. Sua mãe teve medo de dar-lhe pílulas para dormir, mas era necessário.

– Veio me convencer a tomar o remédio?

– Você não precisa fazer nada que não queira. Apenas me diga: por que o medo de dormir?

– Não tenho medo de dormir. Tenho medo de acordar.

– Como assim?

– Toda vez que durmo, quando acordo sozinha, vejo um corvo me observando.

– E por que ele te assusta tanto?

– Os seus olhos são... demoníacos. E depois que olho para eles, vejo... coisas...

– Há muitas razões pelas quais vemos algo que não está lá. Mas creio que, no fundo, você sabe que não é real.

Ela ia xingar o sujeito por não lhe dar crédito, mas quando levantou a cabeça para olhar seu rosto, estremeceu. Logo exibiu um sorriso triste e decidiu não responder mal.

– Você não tem cara de psiquiatra.

– Eu disse que não sou psiquiatra. – Respondeu, satisfeito porque a moça estava começando a se abrir. Ele realmente estava preocupado com ela, há três dias não dormia. – Vamos fazer o seguinte: conte-me como tudo começou, coloque o que está sentindo para fora, depois tome uma dessas pílulas e descanse um pouco. O desabafo expulsará o corvo. Se vê-lo de novo, é porque realmente tem algo ruim te atormentando, então te ajudo a se livrar dele, combinado?

A menina riu, um misto de tristeza e zombaria.

– Qual o problema? – Ele perguntou, Janaína apontou para o espelho. Hesitou por alguns instantes, levantou-se e foi até lá. O reflexo era de um padre sem cabeça. Levou as mãos ao rosto, podia sentir que havia uma cabeça lá, mas o espelho provava que não era verdade.

Enquanto o fantasma enfrentava a crise existencial, a menina engoliu várias pílulas. Suicídio era a única saída daquele tormento, a única maneira de não ver mais aquelas coisas terríveis. Deitou-se na cama e deixou-se vencer pelo cansaço. Quando adormeceu, o corvo surgiu e a ficou observando. Sua mãe teve medo de dar-lhe pílulas para dormir. Era um placebo.

TEMA: FANTASMAS