A Dama de Preto
Dois de novembro de 2018 foi um dos dias mais tristes da vida de Edgar, só não foi pior que o dia da morte de sua mãe, que morreu de ataque fulminante. Sua primeira visita ao túmulo de sua mãe foi agoniante, suas lágrimas não se cessaram em momento algum, a dor em seu peito era tanta, parecia que estavam enfiando facas em seu corpo.
Já era tarde da noite e não havia mais ninguém no cemitério, Edgar queria ficar ajoelhado sobre o túmulo dela sem ninguém por perto, ver mais pessoas chorando em sua volta, só lhe faria ficar ainda mais triste, estar sozinho seria melhor, assim poderia expressar todo o seu sentimento, sem vergonha alguma.
Um som de choro bem baixo ecoa em meio aos túmulos, Edgar não sabia ao certo de onde vinha o som, mas olhava atentamente para os lados, parecia que estava sozinho, mas o som aumentava cada vez mais, começou a ficar perto o soar do choro, só que ele ainda não tinha localizado a origem do som. Edgar estava de joelhos sobre o túmulo, intrigado com aquele barulho incessante, ele se levanta olhando em direção do fundo do cemitério, sua visão detecta somente as folhas das árvores balançando no fundo do ambiente, não havia nada além de árvores e túmulos, mesmo se houvesse mais alguém por ali, seria muito difícil de notar com a terrível escuridão que dominava o lugar. Uma corrente fria de ar se espalha dentre os túmulos, no exato momento em que o barulho se silencia, dando espaço para os grilos fazerem seu show.
Edgar, se vira trombando de cara com uma mulher de vestido preto, o susto foi inevitável e lhe causou arrepios dos pés a cabeça. Instantes depois, desculpas são trocadas entre os dois, seguido de palavras de lamento pelas perdas de ambos.
A moça tinha perdido seu marido à menos de dois meses, quase o mesmo tempo que a mãe de Edgar se foi, os pais da moça já tinha partido quando ela era ainda criança, um acidente de avião levou a vida deles, deixando-a sozinha para morar com a avó, que partiu tempos depois de velhice.
Os dois se confortam com palavras trocadas de autoestima, nenhum queria se deixar entrar em depressão pela recente perda, sem se dar conta, eles já estavam se abrindo um com outro, contando detalhes íntimos de suas vidas, momentos felizes e tristes dos quais passaram, parecia que se conheciam a anos e só estavam relembrando de seus momentos, uma química no ar fazia com que se sentissem bem, o choro e a agonia não existia mais, aquela atmosfera pesada dava lugar para uma leve e confortante conversa.
O tempo foi passando e Edgar resolve ir embora, antes de partir ele pede o telefone da moça, sorrindo ela diz que se ele quiser vê-la novamente, terá que voltar ao mesmo lugar que a encontrou, no mesmo horário. Edgar responde que tudo bem, quando percebe que ainda não sabe o nome dela, ao perguntar, ele é interrompido pelo guarda do local, que o apressa para ir embora, já tinha passado e muito da hora de fechar, só faltava os dois para saírem e ele trancar o cemitério.
Edgar começa a caminhar para o portão de saída, mas ao olhar para trás, ele vê a linda moça voltando para o túmulo que ela estava antes de se encontrarem, ele clama pela moça, chamando para irem embora, mas ela parecia não ligar muito, e continua caminhando sem olhar para trás, o guarda estava irritado com a insistência de Edgar, e pedira pela última vez para que fosse embora, Edgar corresponde a expectativa do guarda e parte do cemitério, voltando para sua casa, em todo o trajeto até chegar em sua residência, aquela moça linda (assim como a Paige – WWE) não saia de seus pensamentos, mesmo com a tristeza que sentia pela perda de sua mãe, seu coração também abastecia sentimentos bons por aquela moça, Edgar não via a hora de poder voltar para o cemitério e vê-la novamente, só de pensar nos dois juntos, sua alegria ficava eminente em seu rosto, a noite nunca fora tão longa para ele quanto aquela, a ansiedade de tê-la ao seu lado era tanta, que em certos momentos podia jurar que a paixão dominava-o.
No dia seguinte, Edgar não falava sobre outra coisa com seus amigos, a não ser da bela moça, na maioria das vezes ele era zoando por eles, mas em outros, uns diziam para ter calma com esse envolvimento, afinal, ele nem a conhece e só a viu em um cemitério, não é um bom lugar para se encontrar uma esposa, ou em outros casos um marido. Ele ouvia atentamente os conselhos, não ficava com raiva e nem se importava com as piadas, somente interessava conquistar aquela mulher de vestido preto.
A noite chega e o horário que combinaram se aproxima, Edgar se arruma e parte em direção do cemitério, chegando em frente o local, ele se depara com o portão fechado, não poderia ser verdade aquilo, suas esperanças estavam indo por ralo a baixo, vendo que não tinha muito a se fazer, ele chega até o guarda e pergunta o motivo do cemitério não estar aberto, o guarda responde que somente no dia dos finados que o horário de funcionamento se estende um pouco mais, nos outros dias o fechamento era até às seis da tarde. Edgar se lamenta por ser esse o jeito de funcionamento do cemitério, em um último gesto de desespero, ele pergunta se o guarda sabia onde a moça de antes morava, o guarda parecia não saber do que ele estava falando, Edgar insiste no assunto, dizia que depois que ele foi embora, somente ela ficou no lugar, o guarda dizia que não havia mais ninguém no cemitério, a não ser ele, em todas as rondas de rotina, não avistara ninguém naquele lugar. Edgar estava inconformado com aquilo, ele achava que o guarda não queria dizer para proteger a privacidade da moça, mas não tinha jeito, o guarda permaneceu afirmando que não havia moça nenhuma no lugar. Edgar desiste e se vira para ir embora, um vento suave passar por seu rosto, dando-lhe uma sensação de frescor e paz, aquilo fez com que ele virasse somente o olhar para dentro do cemitério, sem virar o rosto, no canto de seu olhar passou aquela linda moça do dia anterior, rapidamente ele vira seu corpo e estende o olhar para ela, a mesma sorrindo se vira e caminha dentre os túmulos, Edgar olha para o guarda e começa a pensar que ele pode ser membro da família da moça, ou até mesmo quem sabe, ele gostasse dela também. Ele sabia que o guarda jamais o deixaria entrar no cemitério, então ele deu a volta no quarteirão, e pelos fundos entra no cemitério, pulando o muro quando ninguém estava olhando, sem se dar conta, Edgar já estava do lado de dentro do cemitério, nem mesmo aquela escuridão toda lhe tirava o sorriso do rosto, os grilos que cantavam lhe transmitia uma linda sinfonia. Fazendo o mínimo de barulho possível, ele caminha sussurrando pela moça, em poucos instantes ele a encontra sentada em um túmulo, ela estava com o mesmo vestido preto de antes, de longe lhe dava impressão que ela estava chorando, era baixo o som, mas dava para escutar soluços, o puxar da respiração pelas narinas entupidas, seguidas pelo engolir de suas salivas. Edgar chega perto dela e pergunta o porquê de suas lágrimas (pergunta tola ele pensou logo em seguida) a resposta era obvia e foi respondida num tom seco e amargo. Ela disse que sempre que estava naquele lugar, suas lágrimas derramavam. Dessa vez ele não perde tempo e pergunta o nome dela, a moça responde, Catrina. Ele gentilmente diz seu nome e também.
Depois de vários minutos de conversa, Ed percebe que atrás deles, um grande número de corvos pousa em diversos túmulos, não teve um instante se quer que ele não dava ideia para que partissem para outro lugar, em momento algum, Catrina demonstra interesse em sair daquele lugar, ele achava aquilo estranho, mas ela insistia para que ficassem.
Nos portões de entrada e saída luzes são ligadas, era o guarda com uma lanterna, ele estava se preparando para fazer sua primeira ronda da noite, Edgar se desespera e tenta ir embora e levar Catrina contigo, ela diz não poder ir embora, e para ele ter calma que o guarda não chegaria a ir até lá, ele sempre rodeava até metade do local e voltava para trás, o medo não o deixava ir até o final do cemitério, podia soar besta um guarda com medo do próprio serviço, mas a realidade era que até o Edgar estava com medo de ficar naquele lugar, se não fosse por seu interesse em Catrina, ele nunca ficaria ali aquele tempo todo.
Como Catrina disse, o guarda termina sua ronda sem ir até o fim do lugar, depois ele volta para sua cabine e ficara lá dentro vendo sua televisão.
Edgar já não aguentava mais ficar só conversando com Catrina, em um gesto suave ele pega em seu cabelo e o joga para trás de seu ombro, com um olhar fixo nos olhos dela, ele se aproxima de sua boca, com uma mão em sua cintura e outra em sua nuca, ele a beija com todo fogo que continha em seu corpo. Os dois não quietam um segundo se quer depois do primeiro beijo, pareciam dos adolescentes apaixonadamente loucos por desejo, em um dos momentos que eles estavam se beijando, uma luz forte ilumina seus rostos, seguido de palavra em tom forte e raivoso, era o guarda gritando com Edgar, e mandando embora para nunca mais voltar. Edgar se espanta com o guarda e se levanta de susto, quando Edgar diz que eles já estão indo embora, o guarda começa chamá-lo de louco com a lanterna apontada rumo a seu rosto, o guarda ficava repetindo que ele estava louco, não havia mais ninguém no local, a não serem os dois, Edgar não entende porque o guarda sempre dizia isso para ele, Catrina estava ali quando foram interrompidos, então porque continuar dizendo que não tem mais ninguém além deles, foi então que Edgar disse gritando para o guarda, pra que ele olhasse para o lado e visse a moça que estava com ele, o guarda retira a luz da lanterna dos olhos dele e aponta para os lados, Edgar vira junto para olhar onde está Catrina, nenhum dos dois conseguem avistar ninguém, Catrina já não estava mais ali, onde ela se encontrava estava totalmente vazio, Edgar não fazia ideia do porque não estava ali, mesmo assim ele ainda pensava que ela teria fugido antes do guarda pegá-la com ele, não importava o que diziam para Edgar, nada o faria acreditar que ela não existia, o guarda já estava com muita raiva quando gritou dizendo para ir embora, Edgar resolve ir com o guarda, quando os dois se viram para frente... vários corvos voam diante de seus rostos, gritando ao vento e assustando os dois, ambos ficaram com os corações acelerados, tremendo e suando de medo, risos sem graça foram lançados pelo guarda, Edgar também sorriu e brincou com a situação, os dois caminharam de volta para a saída conversando sobre o serviço de guarda do cemitério, o serviço não era nada agradável, concluíram ao fim da conversa, antes de ir embora para casa, Edgar recebe conselhos do guarda, que aparentemente passou a gostar dele depois da situação com os corvos, o guarda disse para ele parar de ir ao cemitério, porque aquilo estava fazendo mal para ele, não existia nenhuma moça presente naquele lugar, e ele não se lembrava de nenhuma com as mesmas características que ela por lá. Edgar volta para casa pensando no que o guarda disse, na mesma noite ele acorda com dor no peito e sentindo vertigem, tudo após um sonho que ele teve com Catrina. Em seu sonho, ele estava diante do túmulo de sua mãe, do nada um calafrio sobe seu corpo e o possui, Catrina então, sai do chão puxando sua perna, com essa cena, ele acorda passando mal, ele fica ruim a noite toda e por incrível que pareça, seu único pensamento foi com a Catrina.
Na manhã seguinte, Edgar vai até o cemitério, sua intenção é observar quem está enterrado no túmulo que ele sempre a encontra chorando, assim que chega no local, ele pede para o guarda somente deixá-lo ir ver o túmulo e voltar, o guarda concede e Edgar vai até lá ver, chegando em frente o túmulo, o choque que sofreu foi grande. Uma foto linda estampava o túmulo com um nome caligrafado em baixo – Catrina Prado de Lima – seu espanto foi de imediato ao ler aquilo, Edgar não sabia o que fazer, nem sabia se era realmente verdade, como seria possível ela estar morta? No dia anterior os dois estavam aos beijos, tocando os corpos um do outro, tudo tinha sido tão real, a sensação, o toque, todo aquele prazer era de verdade.
Edgar não se conformou com a lápide de Catrina, para ter certeza de que ela estava realmente morta, ele voltou ao cemitério durante a noite, no mesmo horário que sempre a encontrava, dessa vez ficou por horas esperando e nada, o guarda estava em sua cabine esperando Edgar voltar, ele havia o deixado ficar lá por algum tempo, mas com a promessa de que essa seria sua última noite por lá.
Após um longo período de espera, Edgar começou a acreditar que Catrina estava realmente morta, isso o deixava bastante incomodado, mas não era somente isso, a dor em seu peito também não cessava desde seu último encontro com ela em seus sonhos, Edgar se levanta com o pensamento de ir embora, quando ele menos espera, uma forte vertigem o derruba no chão, sua barriga parecia corroer por dentro, vômitos foram inevitáveis na circunstância que se encontrava, suas pálpebras começavam a pesar, fazendo seus olhos se fecharem lentamente, em uma última visão, Edgar vê aquela linda moça se aproximando com um vestido preto se arrastando pelo chão, com essa imagem, Edgar fecha os olhos se entregando a morte, porém, um belo sorriso pode ser visto em seu rosto.