— Vontade Assassina —
Passei o restante da tarde te observando de cima da cama, o ângulo da janela atrás da escrivaninha é perfeito. Como sempre achei que estava mais magra que o normal, tive vontade de tocar sua porta, olhar em seus olhos e perguntar o motivo, mas não consegui. A razão pela qual não consigo ficar sem te observar é que eu te amo, e meu mundo só funciona quando você é o meu centro. Depois das nove, sempre que acordo, espero você sair do chuveiro, molhada, o calor explodindo de sua pele em jatos quentes de fumaça, me arrepio sem conseguir parar de te olhar e a primeira coisa que faço é consumir sua imagem com a única vontade que um homem na minha situação tem.
Pontualmente depois de se trocar você toma o café da manhã, não sei muito bem o que você come porque minha janela não tem campo de visão para parte leste da sua casa, mas tenho quase certeza que come torradas toda segunda, e um copo de leite desnatado já que sempre acho uma caixa de leite no seu lixo. Tenho te esperado, sei que nunca notou porque tento me esconder de você, mas sempre estarei lá te observando. Me deixa angustiado as vezes quando tenho que esperar você sair. Preciso ouvir sua voz, mesmo que apenas um oi. Acho que você me viciou rápido demais. As 13h20 seu ônibus chega, as vezes você se atrasa, então eu sempre tenho que inventar alguma desculpa para convencer o motorista a te esperar. Da última vez deixei que me atropelasse, acho que foi demais porque você teve de esperar o próximo ônibus de qualquer jeito.
Sento sempre três poltronas atrás da sua, faço de tudo para que não me perceba. Costumo abrir todas as janelas do ônibus, assim não importa onde esteja sentada, o vento fará seus cabelos castanhos esvoaçarem, e isso me deixa louco. Não acho que deva continuar sendo uma operadora de telemarketing, não vale apena. Consigo até imaginar todo tipo de merda que deve ouvir. Mas, não fique triste, quando estiver comigo a única coisa que vai precisar fazer é sorrir todo dia de manhã.
Essa noite quando te vi saindo daquela empresa notei de relance que estava chorando, não pude me aproximar mais ou acabariam desconfiando. Sei que tem problemas com seu chefe, aquele desgraçado sempre quer mais de você, e não posso deixar que isso continue. Vejo as coisas que posta no Facebook e no Twitter, seus desabafos são como pregos e os esta enfiando numa ferida inflamada e isso me deixa nervoso.
Suplico que me perdoe, mas esta segunda precisei deixa-la ir embora sozinha para casa. Seu chefe sai regularmente uma meia hora depois do seu expediente. Estive pesquisando um pouco sobre ele, Muay Thai as terças e quintas, esgrima de quarta e musculação de sexta e sábado. Não tenho chance no cara-a-cara, mas descobri esses dias que ele tem um namorado, isso mesmo seu chefe é Gay. Consegui invadir o apartamento dele antes de chegar em casa. Acho que o nome do outro cara era Daniel, não tenho certeza e também não me importo, ele estava no sofá, só precisei cortar a garganta, as veias romperam como fios de macarrão solto, depois tudo ficou quente e molhado. Foi mais fácil que pensei. Forcei a cabeça dele para trás enquanto ele se debatia até que finalmente se engasgou com o próprio sangue. Depois foi fácil, só tive de arrastar o corpo para o quarto. Você não sabe como foi maravilhoso ver a expressão de horror no rosto do seu chef quando viu o corpo do namorado. Só precisei de força e velocidade, o golpe com o facão decepou parte do seu crânio e ele caiu, como quando um lenhador derruba uma arvore. Alguns espirros de sangue voaram no meu rosto, mas não fique com nojo, tomei o melhor banho da minha vida naquela noite.
Acho que não consegui segurar a felicidade quando notei que tinha descoberto sobre ontem. Tive de ser paciente, demorei um tempo para acompanhar sua rotina. Sei que uma vez ficou desconfiada quando me viu mechando no seu lixo, mas isso não importou muito já que só precisei dizer para você que estava ajudando a separar o lixo reciclável. Foi a primeira vez que conversamos, não acho que foi romântico. Quem se importa, quase tive uma ereção quando ouvi sua voz me chamando.
Não tenho costume de entrar na sua casa durante a semana, só aos sábados quando não está em casa. Sei que gosta de música gospel, mas não ouve em público, porque tem vergonha dos outros te rotularem. Você tem uma bíblia, mas pela poeira na capa não abre a um bom tempo. Precisa comprar roupas novas, já vi você usando cada uma dessas roupas pelo menos oito vezes. Não que uma operadora de telemarketing tenha dinheiro para gastar com roupas toda semana, mas você não tem nenhum vestido elegante, é só aquela coisa amarela. Meu coração está aberto para o seu gosto, e nisso acho que você tem se aproveitado.
Tentei cumprimentá-la quando chegou em casa, mas você me ignorou e isso realmente doeu. Esperei você dormir e invadi sua casa. Te estuprei porque era o único jeito de acalmar minha vontade tão obsessiva.
Esperei nos últimos meses que fizesse o aborto, sei que pensava nisso já que durante a semana visitou duas clinas diferentes. Nosso filho nasceu em setembro, um garoto forte, não pude acompanhar o parto, mas sei que deve ter sido espetacular. Nosso filho parece comigo, os olhos lembram os seus, mas ele é literalmente minha cara.
Faz um ano, mas ainda me lembro quando consegui que saísse comigo. Nos casamos quatro meses depois e os últimos seis meses foram extraordinários, bem... tive de te matar quando descobri que estava me traindo, mas não importa, ainda te amo.