------Vingança Amaldiçoada------Parte Seis------

Novamente, Balcon foi o último a chegar na casa para os últimos conselhos. Não só pelo medo a turma se reunia, mas também pelo incentivo que Tomás lhes dera um pouco antes. De súbito, ouve-se barulhos vinho das escadarias do corredor. Miguel e Bill aparecem completamente vestidos de caça-vampiros: uma pseudo-armadura improvisada que protegia o peito e o pescoço, dentes de alho pendurados, juntamente com crucifixos e uma estaca, também improvisada, em cada mão, deixando mais meia dúzia amarradas na cintura. Ambos pareciam prontos para uma seita de bruxaria.

- Estamos prontos - disseram os dois em um mesmo tempo.

- O...o que é isto? – disse Balcon não segurando o riso – acha mesmo que essa parafernália e esses objetos vão deter os vampiros?

- Vão! – exclamou o padre – Todos são de muita utilidade, de fato. Porém, seria muito peso para levarmos. Em uma fuga, quem usasse essa armadura ficaria para trás. Mark já nos conseguiu antigos frascos de perfume com spray, será muito bem vindo.

- O senhor diz que tudo em que vemos nos filmes e lemos nos livros são reais? Digo, as fraquezas dos vampiros são as mesmas que conhecemos?

- Todas são exatamente iguais, caro Jason. Muitos dos que já escreveram sobre vampiros, ou passaram por uma situação com eles, ou ouviram de uma vítima direta.

- Padre, estamos perdendo tempo – disse Johnnantan.

- Certo, certo, é claro. Estão todos prontos?

Vários potes de vidro e de plástico foram preenchidos com uma mistura de água benta e alho. Tomás distribuiu dois para cada, junto, deu-lhes um pouco da química que seria usada no círculo de magia, uma cruz do tamanho de duas mãos e pedaços de madeira pontuda (todas feitas pelos empregados no mesmo dia).

O céu estava escuro. A lua era completamente acobertada pelas nuvens negras que viajavam sem rumo. As corujas cantavam seu hino de horror, preparando o cenário. As estrelas também haviam abandonado completamente a paisagem. O ar era pesado e temeroso. Água parecia querer descer ferozmente de cima, o cheiro da chuva, ora delicioso e esperado, estava desagradável. Algo como uma substancia fétida pairava no ar. Era difícil de respirar, até se acostumar. “É o enxofre que os demônios deixam”, dizia o padre enquanto todos se agrupavam já fora da casa.

A umidade fez-se formar uma névoa, parecia proposital todos aquele efeitos que apareceram sombriamente. O reio do inferno se intrometia no mundo dos vivos para que suas criaturas prosperassem e vencessem. Monstros seriam bem vindos à cidadezinha naquele momento, uma festa os esperava, sangue os esperava. Humanos, tolos bravos que entravam em seu novo domínio sem um convite.

O tabuleiro estava pronto, as peças já estavam montadas e separadas.

Saíram todos juntos. A noite, juntamente com a neblina formada, os impossibilitava de enxergar muito longe. Tomás ia guiando a tropa, e logo atrás ia Mark, Jason e Megy. Os empregados cuidavam da parte do meio, sendo protegidos por trás por Johnnantan e Balcon pelo fim. Nada lhes era positivo naquele momento. Nem o calor da noite de verão era perceptível. Seguiram caminho por uma estrada solitária, bordada pelos dois lados de grandes e grossas árvores. Na verdade, só se podiam distinguir as árvores pela fraca iluminação dos perdidos postes de luz.

Todos estavam atentos para qualquer coisa fora do normal que pudesse acontecer. Miguel sente um calafrio e grita, apontando as mãos para a entrada do cemitério. Imaginavam ser um homem agachado em cima de uma das colunas do portão, mas só se via sua sombra. Repentinamente, a figura voou, adentrando em meio às tumbas. As luzes começavam a piscar. “Foi isso, foi assim que aconteceu antes de...”, disse Bill antes de ser interrompido pelas muitas vozes que surgiram. Elas emitiam gemidos de horror. Assombrando por completo todo ambiente.

Estavam cercados. Dezenas de sombras se espalharam ao redor da comitiva.

- Corram! – gritou Tomás. – Preparem os spray’s.

Um banho de água benta era dado a toda parte. Alguns seres foram certamente atingidos, mas o máximo que conseguiram foi atrasar o inevitável. Tomás, mesmo baixinho e gordinho, mostrou um grande poder na hora da fuga, corria como um atleta.

De súbito, alguém pula na frente do padre dando-lhe um soco na barriga e um empurrão, fazendo-o cair inconsciente aos pés de Balcon. O vampiro pára na frente de Johnnantan e tenta desferir outro soco, mas o médico agilmente se esquiva abaixando-se e soprando o jato de água benta no rosto do adversário.

- Vocês não poderão escapaaar! – gritou ameaçadoramente ele, enquanto o grupo voltava a correr.

Tomás tropeça levando Jason e Balcon, que o ajudavam, ao chão. Ambos caíram sob algumas pedras pontudas deixando que um pouco de seu sangue os deixasse. O cheiro atraiu o demônio ainda um pouco cego, para perto. Foi voando para cima dos três e num golpe inesperado e rápido, padre Tomás molha seu cajado e levanta-o transpassando o vampiro bem no peito.

- É prata seu verme! – disse Tomás ofegante – Meu cajado é feito de prata e molhei-a com água benta. Volte para onde veio e receba o castigo de seu mestre por sua falha.

O grito ecoou por todo lado e o corpo já a muitos dias morto, se transformava em algo frágil e cinza, para em seguida se reduzir a pó. Quando todos deram por si, não só sombras os encurralavam, mas também quase uma dezena de homens mortos, banhados em sangue com partes do corpo desfiguradas.

- Humanos idiotas – falou uma voz atrás de um grupo de vampiros.

- Quem é você? Mostre-se!

- Sou aquele que vai destruir este mundo que conhecem e deixarei para meu mestre este legado. Quem são os tolos que ousam nos enfrentar.

- Ele está usando o corpo do Zeek, o outro empregado que veio comigo – disse Miguel aos tremores.

O homem morto tinha um dos olhos perfurados o seu braço esquerdo estava cordado estranhamente ao meio, mas bem no centro da carne, parecia nascer um minúsculo outro membro no lugar. Seu pescoço ficara estraçalhado e sua face ia se transfigurando a cada minuto. “Hahaha”, ele ria.

- Vocês todos irão morrer pelas mãos dos seus próprios amigos – disse o vampiro, porém com a voz do verdadeiro dono do corpo.

- Não, seu desgraçado! – gritou Bill aproximando-se, mas sendo segurado pelo padre.

- Senhor, o rosto... O rosto que está se formando. Eu conheço, me é familiar...

- Sim Jason. Penso ser o maldito que lhe massacrava, e provavelmente o que possuiu Megy. Fale seu desgra...

- Levem-nos para as ruínas – disse o morto-vivo Zeek sob voz de comando.

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Por dentro, parecia tudo, menos ruínas. Os destroços antigos eram apenas um disfarce para esconder a verdadeira face do que se encontrava no local. Era impressionante o tamanho da cripta e a singular forma com que local era projetado. Dezenas de colunas sustentavam o peso do teto. Cabeças de seres humanos em formatos distorcidos estavam esculpidas nas paredes e tochas de chama, várias delas, davam uma pouca luz. Todo o conjunto foi colocado trancado dentro de uma cela já existente. Nela, muitos ossos descansavam no chão de areia, não só de homens, mas também de animais.

A cabine, com grades de aço em três lados, não tinha iluminação. Todos estavam sentados pensando no que fazer, alguns, pensavam se iriam sofrer muito na hora da morte. Eram vigiados constantemente pelos vampiros, sem contar com a provável presença dos demônios ainda em forma de espíritos.

- Eles tomaram o corpo dos meus empregados. Será que todos?

- Sim! – disse o homem que surgia da escuridão. Sua face mudara quase que completamente, o sangue havia sumido e um novo braço crescera. Apenas era visível uma penumbra projetada em seu rosto. – Todos aqueles estúpidos e fracos agora são vampiros.

- Revele-se, maldito!

- Como quiser, sacerdote – continuou com um ar de esnobação – Me chamo Lucian, nasci em 1902 e fui morto em 1947. Meu mestre me libertou das limitações carnais. Agora, venha humano, precisamos de você!

Lucian se aproximou da cela munido de uma chave banhada a prata, no entanto muito antiga. Abriu-a e, sem que ninguém ousasse fugir, ele puxou o xerife Balcon para fora trancando-a em seguida.

- Você! Seu traidor de merda – vociferou Mark – Seu traidor sangue sujo! Matar, eu vou te matar!

Depois de um tempo, prosseguiu.

- Então era ele o tempo inteiro? Por isso sempre chegava tarde em casa. Em uma cidadezinha não havia como exigir tanto cuidado quanto a segurança.

- Padre... – continuou Miguel – Foi o xerife quem nos ligou para que fôssemos à casa nos reunir com os senhores. Foi ele quem...

- Eu sei, meu caro. Estou ciente disso. – disse Tomás encarando Johnnantan.

A prisão era agora guardada apenas pelos espíritos, visto que as vozes ainda continuavam e eram bastante próximas. Todos os vampiros tinham, por algum motivo, se ausentado. Johnnantan vestia um sobre-tudo, e como tal, era excessivamente repleto de bolsos. De um deles, pegou um pote, até grande demais para se carregar, também em modelo de spray. Essa nova mistura possuía o líquido já usado com um pouco de um poderoso combustor, algo semelhante ao álcool comum.

- Abaixem-se e fechem os olhos – disse o padre – e preparem-se para uma nova corrida.

De um bolso da frente, puxou um isqueiro preparou-o na frente de seu corpo apontando-o para cima. Apertou o aparelho e veio a chama azulada, ejetou o líquido. O fogo ia se espalhando em todo volume que podia atingir na medida em que o médico balançava o braço. Uma enorme labareda surgia. Pelos ruídos ensurdecedores e agudos vinhos dos demônios, via-se que estavam sofrendo, pelo novo ambiente que se apossara da grande gruta.

- Rápido! Não temos muito tempo, os vampiros já vão chegar!

Com duas enormes estacas de madeira, eles batiam no cadeado que os mantinha trancados. Conseguiram depois de pouco tempo quebrá-lo. Fugiram em uma corrida desesperada pela vida. Mark segurava a mão de Megy e Johnnantan ia atrás para acionar novamente a labareda, atrasando qualquer perseguição.

- Não se separem, não se separem! – gritava o padre.

A caverna era muito escura e ninguém se recordava com perfeição o caminho de volta. Até aquele momento não havia problema, pois o único lado a se seguir era o da frente.

Eles tinham a impressão de estarem descendo. Sempre descendo. “É por aqui, eu tenho certeza. Continuem juntos”, disse o padre. Os vampiros chegavam perto, já se podiam ouvir seus rugidos. O spray para fogo havia terminado. A comitiva corria o mais rápido que suas pernas suportavam. Para o desespero de todos, a única saída se dividia em quatro mais ao fundo. Ainda corriam. Na frente, viam um salão iluminado, possibilitando a visão das subcavernas. Chegando lá, viram ser um enorme buraco ao ar livre, e olharam para cima, vendo a aurora que chegava. “Não se separem”, gritou mais uma vez Tomás, ainda correndo.

Os gritos monstruosos estavam muito presentes.

- Luz do sol, padre, os vampiros não suportam luz do sol!

- Ainda está muito fraca! – exclamou ele em resposta – eles conseguirão passar.

Nesse momento, algo pula bem em cima de Tomás e desfere-lhe vários golpes no rosto. Johnnantan imediatamente chuta o monstro e joga-lhe diretamente o spray e o empala com uma estaca. Mostrando o mesmo fim já visto antes.

- Corram!

O desespero impede o grupo de pensar e mesmo com os berros de súplica do padre, que se levantava com a ajuda de Bill, todos eles seguem por caminhos diferentes.

Mark corria segurando uma das mãos de Megy, porém Jason segurava a outra, vencendo e levando-a em sua direção. Foram pela entrada do meio à esquerda com Johnnantan, enquanto o velho, ainda gritando o nome da filha, foi guiado por Miguel pelo meio à direita. Tomás Ezequiel ficou para trás e, desesperado por não saber qual direção tomar, optou pela última entrada, sendo seguido por Bill aos tremeliques.