O canibal de Guarapiranga

A família de Deoclécio já tinha percorrido todo o calvário de praxe: hospitais, abrigos e necrotério, agora distribuíam panfletos com a foto do desaparecido.

Se encheram de esperança quando um pescador viu um panfleto e se apresentou na delegacia. Afirmava ter visto aquele homem entrando na mata, à beira da represa de Guarapiranga, tarde da noite e sozinho.

A polícia refez o caminho indicado, mas nada encontrou a não ser uma tapera isolada no meio da trilha que terminava em lugar nenhum.

O delegado bateu na porta que se abriu. Não tinha tranca mas tinha mobília, que era sinal de morador. Resolveram então esperar.

Pouco depois, saindo da mata avistaram um homem idoso, parecia saudável apesar dos trapos que usava e da aparente falta de higiene pessoal.

Sem paciência, o delegado perguntou se ele morava ali. Respondeu que há mais de 30 anos. 28 desde que sua mulher morreu. Segundo ele, a esposa não se acostumou com o lugar, ficou doente por vários dias até que morreu e, ele mesmo a enterrou próximo dali.

Mas o que interessava era o que ele sabia de Deoclécio. Como era o único morador da trilha o sujeito só podia ter ido à sua casa, concluiu o delegado.

Vendo a foto o "véio" soltou uma risada banguela e disse que o viu sim, mas não se falaram. “Ele passou apressado pela tapera, aliás, como todos os outros antes dele".

A declaração deixou o delegado "puto". Que "porra" de história era aquela se a trilha terminava na mata fechada. Onde esse povo iria?

Tava claro que o "véio" sabia muito mais do que dizia. O tom de deboche complicou ainda mais sua situação. O "doutor" mandou recolhê-lo para ser ouvido na delegacia, lá ele ia explicar tudo bem direitinho.

O coitado foi pressionado pelo experiente delegado. Na tentativa de assustar continuava afirmando que ele tinha matado a esposa e também Deoclécio.

Apavorado, o "véinho" resolveu contar o que sabia não se importando se iriam acreditar.

Muito firme explicou que os homens passavam por ali para se encontrar com uma mulher que vive escondida na mata. A esta altura, o delegado estressado berrou: " Escuta aqui, meu tio, tá achando que sou otário?"

Calmamente continuou. Disse que desde que se mudou para lá sabe da existência dela. Já viu muitas vezes a beldade tomando banho no riachinho, perto de sua casa e nunca se meteu com ela, porque sabe o fim de quem comete este erro. “ Em algumas noites sai pela trilha e atrai homens que viram o seu jantar. Sobram só os ossos que enterra na mata".

O delegado estava louco de raiva, nunca interrogou ninguém tão "cara de pau". Mesmo assim mandou fazer uma busca completa no lugar.

A mulher não foi encontrada, mas as ossadas chegaram as dezenas.

O "véio" sempre jurando que não mentiu, se enforcou meses depois de ser condenado e preso. Sua fama continua bem viva, afinal, quem não se lembra do Canibal de Guarapiranga?

Os desaparecimentos de homens na região ainda lideram as estatísticas.