O Canto do Cisne
O Canto do Cisne (*)
Amanhã, dia 3 de agosto de 2018, às 15 horas, será a última transa de Jonatan como garoto de programa. Jonatan Leios juntara bastante dinheiro nos 15 anos de michê. Agora era curtir a vida e ser feliz na Suíça, país escolhido por ele para viver o resto de seus dias. A noite demorou a passar. Jonatan Leios não conseguia dormir de tanta ansiedade. Trinta minutos após tomar um calmante, adormeceu. No meio da madrugada, às 3h15min, Jonatan acordou aos gritos, suando frio e com o coração batendo tão forte que parecia que ia explodir. O garoto de programa tivera um pesadelo terrível, mas, apesar do esforço, não conseguiu lembrar do sinistro sonho. Após comer um pedaço de chocolate meio amargo e tomar um café com leite, voltou a dormir. Era meio-dia e meia quando o despertador tirou Jonatan do mundo dos sonhos e o trouxe para o dos vivos. Tomou um banho rápido e comeu um pedaço da pizza de calabresa que sobrara na noite passada. Era uma e meia da tarde quando o cliente confirmou o encontro. O local do programa seria na casa de Aldus Serenus. O valor combinado foi de 1000 reais por duas horas. Jonatan Leios chegou à casa de Aldus faltando cinco minutos para as três da tarde. Na verdade, a casa era uma mansão. “O cara é milionário!” pensou o garoto de programa antes de ser conduzido pelo sinistro mordomo (parecia o Tio Chico da Família Adams) até o quarto onde seria realizado o programa. Durante o trajeto, Jonatan viu quadros que deveriam valer centenas de milhares de dólares, esculturas lindas de mármore carrara e uma enorme biblioteca de livros raros. Mas a cabeça do garoto de programa estava focada em sua despedida. Seu “Canto do Cisne” do mundo da prostituição. Após cinco minutos de caminhada pelos numerosos corredores da mansão, o mordomo apontou o quarto em que Aldus esperava Jonatan e saiu sem nada dizer.
― Bem-vindo a minha humilde casa, Marius.
Por favor, tire sua roupa para que possamos começar o programa.
― Não me leve a mal, mas cobro adiantado. ― Disse Marius (nome de guerra de Jonatan na prostituição).
― É dinheiro o que você quer? Então tome! ― disse o milionário jogando dez notas de cem reais para o alto sem a mínima delicadeza.
Jonatan, bastante irritado com a atitude do milionário, fez menção de ir embora, mas desistiu quando viu o argumento de Aldus para não o fazer. O octogenário apontava-lhe um revólver e não parecia estar brincando.
― Tire a sua roupa, agora! ― disse Aldus Serenus quase gritando.
Jonatan Leios tirou a roupa assustado. Não esperava se ver na situação em que se encontrava nem em pesadelo. Mas logo, recuperou o equilíbrio. Esperaria o momento certo para reagir. O velho ia se distrair e ele então o desarmaria e sairia da sinuca em que se metera.
Aldus mexeu num candelabro na parede e uma passagem secreta se abriu. O octogenário ordenou que Jonatan entrasse no pequeno quarto revelado.
No recinto, havia cinco estátuas demoníacas em volta de um imenso pentagrama desenhado com sangue no chão. O milionário colocou uma música sinistra no mais alto volume e pegou um par de algemas para prender as mãos do garoto de programa. ― Por que eu? O que você quer de mim? Você vai me matar? ― perguntou Jonatan Leios tentando distrair o velho.
― Eu não quero a sua vida. Quero a sua alma! ― disse às gargalhadas o idoso que parecia um esqueleto de tão magro.
― Pois vai ficar querendo! Neste exato momento, Jonatan dá um pontapé no joelho direito do velho e o velho cai ao chão. Mas no instante em que Jonatan ia pegar a arma caída ao chão, o idoso, ágil para sua idade, pega uma outra arma escondida no paletó e dispara um tiro na direção de Jonatan. O tiro atinge o abdome do garoto de programa.
― Seu merda! Agora tenho que ser rápido, já que você tem que estar vivo para que meu pacto com o Príncipe das Trevas tenha efeito.
Jonatan Leios não conseguia falar. Sentia-se fraco. Seu sangue esvaia-se rapidamente de seu corpo, assim como sua vida. Aldus algemou o garoto de programa e, em seguida, cortou seu próprio pulso. Com o sangue canceroso que dele saía, desenhou alguns símbolos estranhos na testa de Jonatan. Em seguida, começou a invocação do demônio.
Palavras de uma língua estranha eram gritadas por Aldus Serenus como um louco dominado por sua loucura. As lâmpadas do quarto acenderam e apagaram repetidas vezes durante a invocação. Após longos minutos, o ritual se encerrou.
O corpo do octogenário jazia, sem vida, no chão, completamente seco, ou seja, sem sequer uma gota de sangue. Já o corpo de Marius estava mais vivo do que nunca, mas a alma que o habitava não era mais a de Jonatan Leios: era a de Aldus Serenus.
FIM
(*) Canção do cisne ou "Canto do cisne" é uma referência a uma antiga crença de que o cisne-branco (Cygnus olor) é completamente mudo durante toda a sua vida, mas pode cantar uma bela e triste canção imediatamente antes de morrer. (Fonte: Internet)