Até Que Tudo Fique Escuro!
 
 
Desde que Laura me deixara saí por esse mundo a vadiar e encontrei pouso neste velho motorhome. Consegui chegar até essas velhas cavernas e me meti dentro de uma que cabia com folga indo até aonde as rodas puderam alcançar. Eram cerca de uns 200 metros em curvas sinuosas. A partir de um gerador e contando com a eletricidade do motor a diesel tirava dali minha eletricidade e sossego. Estava enfurnado no alto dessas montanhas e queria só paz e sossego. Que o mundo me esquecesse. Após vários dias de bebedeira, escondido do mundo, resolvi ligar o rádio. Instalara cabos também para a TV que iam até o lado de fora. Já devia ter passado uma semana da minha última saída. Notei que esfriara além da média para aquela época do ano. Os termômetros caiam absurdamente. Liguei o sistema de aquecimento enquanto me agasalhava o quanto podia. No rádio havia somente estática.

- PQP! – Disse.
- Está frio demais! Vou sair e ver essa m****!

Saindo, após me agasalhar ao estilo esquimó, percebi que estava escuro apesar do relógio indicar meio-dia.

- Que joça é essa? Será que essas porcarias quebraram?

Andei munido de lanterna na larga passagem e, após as três curvas que me separavam do mundo lá fora, vi que estava em completa escuridão. Saindo, procurei o Sol que devia estar a pino e estava...

Só que não era o Sol de antes. Uma bola azulada cintilava emitindo pálida e sinuosa luz. Em decorrência, tudo estava azulado e podia-se ver as estrelas cintilando por toda a abóbada como nunca antes.

- Grande m***** essa!

Corri para o trailer e tentei localizar uma rádio, uma estação de TV, qualquer coisa e... Nada!

Em pânico, busquei o celular. Tive que sair e com uma antena de satélite busquei sinal... Nada!

- PQP!

Procurei ouvir os pássaros, os bichos e não havia som algum!
A temperatura baixa e um vento gélido me fizeram tomar a ideia de sair em direção ao vilarejo mais próximo coma máxima urgência. O que acontecera durante meus dias de ressaca pesada? Peguei a moto, uma mochila com água e alimentos e saí feito um louco descendo a estrada sinuosa. Havia uma cabana no meio do caminho de um caçador, o Jonas. Parei e buzinei:

- Jonas!

Resolvi descer e verificar. Bati fortemente na porta. Jonas, como eu, costumava beber até cair. Testei a maçaneta. A porta abriu rangendo alto. Comecei a andar e, no meio da cabana, vi roupas do Jonas jogadas ao chão. Sua camisa típica, calça e botas estavam como que impregnadas por um tipo de gosma azulada. Parecia um tipo de alga. Aproximando-me lentamente vi que a gosma, de repente, pareceu mover-se. Assustado, parei. A gosma começou a se aproximar lentamente. Sem pensar, corri para a moto. A gosma veio se esgueirando. Apesar de ter batido com força a porta fazendo aquele estampido típico vi que a gosma deslizara por baixo da porta e por entre as laterais se avolumando na frente e vindo em minha direção. A maldita moto emperrara. Liguei, em um reflexo, o farol que iluminou aquela coisa medonha. Ela emitiu como que um alarido agudo e, nisso, retraiu-se entrando para dentro da cabana.

Em pânico, assim que a moto pegou saí em disparada. Parei para respirar quando me senti seguro. Comecei a pensar. Seja o que for que acontecera ao mundo, aquela gosma tanto podia ser o Jonas quanto algo que acontecera depois que o Sol mudara de cor e que agora dominava tudo. Foi então que passei a observar a floresta. Vi que pequenos nacos de gosma estavam nas árvores, no mato e até na estrada. Notei que um naco se movia, lentamente, vindo na minha direção. Peguei a lanterna e lancei sobre o que estava próximo aquele facho de luz. Ele se retraiu, virou uma bola ardente e se esfumou...

- Então, seus merdinhas, não suportam a luz branca?

Sabendo daquela defesa, disparei para o trailer em busca de mais pilhas e de uma outra e mais potente lanterna. Seriam minha armas. Ao tentar sair, vi que à entrada da caverna um grande volume de gosma já se formara e se aproximava. Havia um alarido, como se fosse o som de um isopor sendo esfregado no outro. Liguei a lanterna e ela recuou, mas a forma ia ganhando volume. Imagine se todas as formas de vida agora fossem aquela coisa? Deviam as formas de vida próxima terem me percebido e agora buscavam um membro novo ou alimento.

Entrei no trailer. Liguei os faróis. A gosma posicionou-se aonde pode e, como não podia passar pelo raio de ação à frente, foi-se espalhando e aproximando pelos pontos cegos. Em defesa, fechei as janelas, liguei toda a luz possível e esperei até que a bateria acabasse e tudo ficasse escuro quando, enfim, Laura não seria mais meu maior problema...