Maerli, a boneca demoníaca

Véspera de natal, Louise Madalena está indo para o lar sem levar um presente para sua filha de sete anos. A poucos metros de sua casa, ela revira a caçamba de lixo para ver se acha algo de valor. Sua curiosidade é recompensada: ela encontra uma linda boneca. No pescoço da boneca, um colar revela seu nome: Maerli. Louise agradece a Deus pelo presente que dará a sua filha, Cristina.

Assim que chega em casa, Louise procura Cristina. Ela está na cama, dormindo como um anjo do senhor. A catadora de lixo não a acorda. Deixa a boneca do lado de sua filha e também vai dormir. Amanhã é natal, mas para Louise Madalena é também mais um dia de trabalho. Um dia de trabalho duro.

O amanhã chegou com sol e muito calor. Louise não acordou com o nascer do Astro-rei. Acordou bem antes, às quatro da madrugada. Ela tomou um café de uma marca vagabunda, comeu o antepenúltimo biscoito cream cracker do pacote e foi trabalhar. A catadora de lixo não tinha hora para chegar no lixão municipal, mas quanto antes chegasse melhor, já que poderia escolher o material (lixo) para reciclagem antes de seus colegas de profissão.

Enquanto a mãe madrugou, Cristina acordou às nove horas da manhã. Quando viu a boneca ao seu lado, abriu logo um sorriso. “Mamãe não esqueceu de mim!”, pensou a inocente criança. Era seu melhor natal. Comeu os dois biscoitos restantes do pacote de cream cracker e tomou um café com leite bem quente. Cristina era nova, mas safa. Estava no segundo ano do ensino fundamental e já sabia ler e até cozinhar, mas sempre faltavam alguns ingredientes. Após o café da manhã, foi brincar com seu presente. Cris, como a chamava carinhosamente sua mãe, leu o nome da boneca, no colar que pendia de seu pescoço, e gostou. Maerli era um bom nome para chamar “sua filha”. Um nome curto, mas lindo. A boneca estava com um lindo vestido amarelo. Era feita de pano, tinha olhos azuis brilhantes e cabelos loiros, tipo palha. O sorriso da boneca era como o do boneco Smile, um sorriso bem amigável. Cristina pegou a boneca e, sem querer, deixou cair café na mão do brinquedo. Nada de grave. Colocou água no local e deixou-a secar ao sol. A brincadeira estava adiada.

Eram 19 horas, quando Louise retornou do trabalho. Cristina veio correndo lhe dar um beijo. A mãe abriu um sorriso, que seus dentes restantes permitiam, e perguntou a Cris se ela gostou do presente. “É claro que sim, mamãe! Eu adorei!”. A catadora de lixo foi fazer a comida. Mas, antes, pegou o estojo de primeiros socorros. Precisava fazer um curativo na mão esquerda. Louise cortou-se com vidro ao deixar cair uma garrafa durante o trabalho. Nada grave. O jantar da família Madalena foi batata frita com ovos fritos. Cristina mastigava bem devagar cada porção de comida. Não era todo dia que seu Natalino bancava o bonzinho com sua mãe. E aquela ótima refeição merecia ser saboreada ao máximo, pois outra igual podia demorar. E Cristina sabia bem disso.

Passados dois meses, a vida de Cristina e sua mãe mudou… para pior! Louise Madalena estava muito doente e não conseguia mais trabalhar. Cristina estava desesperada. O médico do posto disse que sua mãe só precisava de descanso, mas, mesmo sem fazer nada há dias, o estado dela só piorava. E Cris, não aguentando mais ver sua mãe definhar, foi até a vizinha mais próxima procurar ajuda. No caminho, uma velha senhora com um vestido rodado e todo bordado a segurou pela mão e lhe disse as seguintes palavras: “sua aura está negra, minha doce criança! Você precisa vir comigo imediatamente.” Cristina suplicou que a mulher fosse até sua casa, pois sua mãe estava muito mal. A velha senhora a seguiu até lá. O lugar estava imundo. Baratas e ratos circulavam pelos cômodos sem ser incomodados. Assim que entrou, a idosa se benzeu e gritou bem alto: “saía em nome de Deus, demônio!” Cristina se assustou e Louise abriu os olhos. “Este lugar está amaldiçoado! Eu sinto esta energia do mal… aqui! Bem aqui!” A mulher, que era cigana e especialista em bruxaria, pegou a boneca vodu e o sorriso, antes amigável do brinquedo, transformou-se num esgar de raiva e medo. A cigana não larga a boneca, apesar dela se debater sem parar em suas mãos. A velha senhora sabia que só tinha uma coisa a fazer. E fez! Tacou fogo na vil boneca Maerli e, enquanto ela queimava, uma tempestade irrompia do lado de fora da casa. O ribombar de trovões e os clarões dos relâmpagos acompanhavam a destruição da demoníaca boneca, que foi se desfazendo junto com toda sua maldade e negatividade. Após uma risada satânica ecoar por todo o recinto, o último sopro de vida da boneca amaldiçoada, a tempestade cessou e a casa ficou em paz. Passados vinte anos, num beco do Harlem norte-americano: “Que boneca linda! Vou levar para minha netinha!”

FIM

Luciano RF
Enviado por Luciano RF em 14/06/2018
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