A brincadeira da luz
— É uma brincadeira bem idiota, eu nunca fiz. Me disseram isso. Mas é uma brincadeira de criança – disse a garota.
Olhou para Jamile e olhou para os seios dela debaixo da camisola lilás.
— Que brincadeira é essa?
— Ela se chama “a brincadeira da luz”.
A garota caminhou com os pés descalços no piso do quarto e parou atrás da amiga.
— Você apaga a luz e diz “apareça, diabo!” e acende a luz. Na terceira vez que você fizer isso e acender a luz – BUM! Ele aparece na sua frente.
— Quem aparece?
— Ora, Jamile, o diabo, mas é claro!
— Duvido.
Ela respirou fundo e se deleitou com o perfume de Jamile.
— Duvida é?
Caminhou até o interruptor de luz.
— Vamos ver então.
Apertou o botão do interruptor e a luz apagou.
— Apareça, diabo!
Acendeu a luz.
— Não precisa fazer isso.
A garota apagou a luz mais uma vez.
— Apareça, diabo!
Acendeu a luz.
— Para! Não mexa com essas coisas.
Apertou o botão e na escuridão a garota disse pela terceira vez:
— Apareça, diabo!
Acendeu a luz.
Jamile viu a garota rindo.
— Falei que era uma brincadeira idiota.
Ela foi até Jamile e pegou em suas mãos.
— E você morrendo de medo.
— Eu não estava com medo, eu só não queria que... Deixa pra lá.
— Que tal se a gente aproveitar que estamos só duas em casa e fazer outro tipo de brincadeira? Meus pais só vão voltar daqui uma hora.
— Que brincadeira?
— Verdade ou desa-
Ela parou de falar ao ouvir a batida na porta do quarto.
Jamile viu os olhos de sua melhor amiga se arregalarem para ela e sentiu suas mãos esfriarem.
A garota virou-se para a porta.
— Quem está aí?
Ninguém respondeu, mas havia alguém do outro lado batendo forte na porta.
A garota soltou-se das mãos de Jamile e caminhou até porta.
— O que vai fazer?
Ela não respondeu. Girou a maçaneta e abriu a porta. Jamile viu a sua amiga ficar parada diante da porta aberta.
— O que foi?
A garota caiu de joelhos no chão e Jamile viu duas linhas de fumaça subirem por sua cabeça.
Jamile andou até ela e ficou a sua frente. A garota permanecia com a cabeça erguida, mas seus olhos eram buracos negros fumegantes. Ela tinha os ombros desabados e os braços caídos como se fossem de pano. Não respirava.
— Oh, meu De-
Uma mão quente pousou em seu ombro e a fez engolir a palavra. Olhou de relance para o lado e viu uma mão com unhas negras e pontudas.
— Não se vire para trás ou a sua alma queimará com as chamas do inferno, assim como aconteceu com a alma de sua amiga.
Ela escutou essa voz doce e pausada. Uma voz que ela não soube dizer se era de homem ou de mulher.
— Quem é você?
— Um dia, você irá me ver e me conhecer. Porém, até a sua morte, não cometa o mesmo erro que a sua amiga.
A mão saiu de seu ombro e depois ela ouviu passos caminhando pelo corredor e ouviu os passos descendo as escadas e a porta da frente se abrindo e fechando.
E por um bom tempo Jamile ficou ali parada sem mover um músculo, sem olhar para trás.