O DUPLO
No dia seguinte, ia prestar o ENEM. Minha tia viajou para a Europa, como frequentemente fazia, e quase todos os dias, ia ao seu apartamento, localizado num prédio antigo, de um bairro nobre, de São Paulo, para molhar as plantas.
Como o local das provas era mais próximo do apartamento dela, resolvi dormir por lá na noite anterior. E, não dormi bem. Acordei com uma velha me enforcando, não sei se foi algum pesadelo que se propagou até um pouco depois que acordei, ela foi enfraquecendo e sumindo aos poucos. Tive aquele sono entrecortado, talvez pela preocupação em me sair bem, ou não perder a hora. De madrugada, olhei para a porta e me vi me olhando com um olhar maligno, senti medo de mim e não conseguia me mover, e a minha outra alma saiu do corpo. Fiquei eu ( posso chamar de "eu" a consciência que habita o meu corpo) querendo que ela voltasse e ela querendo voltar para o corpo e me sacudia e saltava por cima, de frente, de costas, para entrar. Até que acho que realmente peguei no sono.
Estava um pouco moída de manhã. Mas jovem tem pique, tem disposição. Tomei café, um banho, coloquei a roupa e saí. Peguei o elevador antigo, daqueles que têm grade, porém na descida, subitamente parou. Até a luz apagou. Gritei, soquei, apertei o alarme que não soou, tentei o celular, mas estava fora de área. Pronto, já não dava mais tempo de tentar o sonho de ir para a faculdade. Então, sentei no assoalho, chorando e abraçando as pernas, com a cabeça enterrada entre os joelhos.
Horas depois, escutei um barulho e a porta do elevador se abriu de repente. Olho para frente e me vejo chegando. Tinha ido prestar os exames. Só que só eu a via.
Depois de um tempo não a vi mais circulando pela casa da minha tia. Estava apenas eu. Depois fui para a minha casa.
Participei da segunda etapa e me saí muito bem, só que desta vez repousei na minha casa mesmo, Deus me livre! Estou na melhor Universidade Pública do Estado. Claro, eu me esforcei para obter êxito, só que não senti o gosto da vitória. Sinto que o mérito da primeira fase não foi meu!
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Muito obrigada pela leitura!