A ARMADILHA DE TOM LIANSBURG
 
   Um paciente é apenas uma ferramenta para um determinado fim. Posso afirmar que todos aqueles que passaram por esta sala sempre fugiram da verdade, queriam que acreditasse nelas, mas neste ramo, poucos são aqueles que falam a verdade, a maioria enxerga no vazio de suas frustações uma brecha para se esconder na mentira que tentam acreditar. Lidar com loucos é um dom que herdei de meu pai e do pai dele. Na manhã de 15 de janeiro de 1938, o manicômio estava pouco mais lotado do que poderia suportar, observei os pacientes, Samanta, uma mulher britânica de cabelos ruivos me chamara atenção, ela havia chegado a pouco mais de uma semana com TDI, transtorno dissociativo de identidade, ela acreditava por vezes ser Tamires, uma holandesa chata e reprimida e também Rebeca Vasques, uma professora de matemática.

   Não pude garantir que não a usaria, afinal, um espécime como aquela deveria ser estudada. A terapia por eletrochoque tomava controle de minha mente, mas poucos sobreviviam ao procedimento. Nunca precisei me preocupar com os corpos, os cachorros faziam o serviço, e a maioria deles tinha sido abandonado pela família. A personalidade de Samanta estava praticamente em estado vegetal, e com isso suas outras identidades tinham a possibilidade de transitar por sua consciência quando bem queriam.

   Quando a levei para o quarto escuro onde realizava a maioria de meus procedimentos neurais, ela estava inativa, não havia ninguém no controle, quando a amarrei na maca, Rebeca gritou, queria saber o que estava acontecendo e se continuasse a gritar os outros descobririam, então a golpeei com um castiçal enferrujado, fazendo a desmaiar. Liguei os cabeços em seus lóbulos e em seguido girei a manivela do gerador. Samanta começou a estrebuchar, mas como estava em estado vegetal não entendia ao certo o que era dor. Desliguei o disjuntor um minuto depois. Saia um pouco de fumaça de suas têmporas, mas não estava morta, a carga não era tão potente para isso. Samanta acordou minutos depois, dizendo que estava perdida, perguntei seu nome, mas ela não me respondeu, disse que não se lembrava, então quando a desamarrei ela se jogou sobre mim e com conseguiu cegar-me do olho direto, usando as unhas.

   Ela fugiu de minha sala e correu pelo manicômio tentando fugir, os pacientes ficaram agitados. Vendo que não conseguiria escapar ela se trancou numa sala. Tentei arrombar a porta, mas provavelmente havia bloqueado com algum móvel. Samanta ou seja quem fosse, começou a gritar bem alto, todos ficaram com medo de seus gritos, parecia estar sendo estripada dentro da sala, até eu fiquei com medo que alguém já estivesse dentro da sala. Tendo conseguido abrir a porta, descobrimos que Samanta havia sumido e sob a escrivaninha havia uma inscrição talhada por unhas, dizia – Sangrais até que possa sangrar.

   Samanta apareceu dois dias depois próxima do canil nos fundos do manicômio comendo parte da comida dos cães, haviam marcas em seus braços e hematomas em suas costas como se alguém tivesse a surrado. Levei de imediato para uma sala improvisada que criei para o caso de algum paciente fugir de novo. Enquanto a carregava nos braços, Samanta sussurrou em meu ouvido, a verdadeira Samanta – Eles estão vivos.

Receio dizer que na noite seguinte após trancafia-la naquela sala, ouvi passos no meu quarto, pessoas rodeando minha cama, não sei de onde vinha aquele som, já que quando abri os olhos não vi ninguém. Mas, desde que retirei o cérebro dela após ter morrido dois anos depois, sinto que coisas estranhas me seguem, gemendo em meu ouvindo a noite, tenho medo de pensar que talvez esteja ficando louco.
Vinícius N Neto
Enviado por Vinícius N Neto em 26/01/2018
Reeditado em 27/01/2018
Código do texto: T6236916
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