Por Deus, tive um pesadelo daqueles!
— Ahhh!
Gritou.
— O que foi, Júlio? – perguntou a esposa, já acendendo o abajur.
Viu o marido pingando de suor.
— Por Deus, tive um pesadelo daqueles!
— Quer um copo d’água?
— Não, amor, tudo bem. Foi só um pesadelo!
Leandra afagou o cabelo do marido e comentou que ele parecia ter corrido por mais de dez quilômetros sem parar tamanha a canseira que exibia.
Por fim, não se agüentando de curiosidade, perguntou como foi o pesadelo.
Com as mãos no rosto, ainda se recuperando de um susto, Júlio receou.
— Não sei se posso falar sobre isso.
— Vamos, meu bem, sou sua esposa e quero ouvir.
Júlio olhou bem nos olhos de Leandra.
— Eu estava no pesadelo, não estava?
— Eu sonhei que matei você, Leandra – respondeu Júlio e calou-se. Mas, a mulher quis saber mais detalhes.
— Foi só um pesadelo, esquece! Esquece! – pediu Júlio, dando as costas para a esposa e sentando-se à beira da cama.
— Vai, amor, eu quero saber. Como você me matou? E por quê?
O policial ergueu as sobrancelhas e buscou as imagens na mente. Respirou fundo, se tranqüilizou, e foi dizendo, devagar:
— A gente começou a discutir. Não sei qual era o motivo da discussão. Sei que eu estava nervoso por uma intimação que recebi no fim de tarde. Em certo momento, você ameaçou contar tudo o que sabia para a corregedoria e que eu iria acabar preso. Ameaçou que iria contar que eu participei da morte do comandante da UPP no final de abril. Perdi a cabeça e dei um murro em seu olho, depois em sua boca e dei murros no seu rosto até meus dedos doerem. Seu rosto ficou um pastel, cheio de sangue, inchado, dentes quebrados, uma coisa horrível de se ver. E você ainda estava viva e eu disse algo do tipo “eu até pagaria uma cirurgia plástica, pena que defunto não precise” e grudei no seu pescoço e apertei até o fim. Então a campainha tocou e eu arrastei você para o quarto e a escondi debaixo da cama. Quando abri a porta da sala, acordei.
Júlio abaixou a cabeça e esperou para ouvir algum comentário de Leandra.
— Foi isso, amor! Você não queria saber do meu pesadelo?
Ele virou-se para trás e não viu Leandra. Olhou para a janela e para a luz do sol passando por entre as frestas da cortina e ouviu a campainha tocar mais uma vez.