Luz na Escuridão, uma busca pela verdade.

No final daquela tarde fria, um Senhor já idoso sentou-se no banco de madeira da praça e se pôs a olhar languidamente para o Casarão que se segurava sobre a colina, era uma casa bem antiga, já sem moradores há algumas décadas.

Paulo um jovem rapaz que passava pela rua o conhecia, e tão logo o identificou dirigiu-se até ele com um sorriso, dizendo:

-Poxa S.r. Manuel, não esperava revê-lo aqui! O Senhor era o caseiro da escola, me lembro muito bem, como está?

Silêncio...

-Nossa S.r. Manuel não está me reconhecendo?

O velho meneou a cabeça lentamente:

-Eram muitas crianças naquela escola, mas me lembro de você sim! Foi você que me deu aquela gravata vermelha, eu a usei no casamento da minha filha e a tenho até hoje guardada, Obrigado.

Ao dizer isso voltou a olhar para o casarão, ao que Paulo curioso perguntou:

-O que procura no casarão?

-Memórias querido, apenas memórias!

-O Senhor conhecia a família que morou alí?

-Sim querido, era minha família! mas agora só restou eu!

-Ora essas! Que surpresa, nunca souberam quem era o dono daquele casarão, porque não o vende?

-Nunca poderia fazer isso, eles moram lá!

-E-eles q-uem? - gaguejou Paulo

-Meus familiares! Pensei em um dia voltar lá para revê-los, mas não tenho coragem!

Paulo ficou calado por um instante observando finas gotas de chuva que se precipitavam, mas então resolveu falar:

-O Senhor acha realmente que mortos continuam vivos?

-Mas claro que sim! minha avó sempre dizia, e sempre acreditei nisso! é uma tradição milenar, todos sabem disso!

-Jesus disse uma vez S.r. Manuel: -Conhecereis a verdade e a verdade vos libertará!

-Bem, respeito Jesus, mas eu não preciso me libertar de nada, não sou pecador nem escravo.

-Desculpe S.r. Manuel, não quero deixa-lo constrangido, vou embora, um dia nos falamos, até mais!

-Calma rapaz! você insinuou algo que gostaria que provasse! afinal tenho 72 anos e você é apenas um rapaz de uns 16 anos, será que pode provar que as pessoas que faleceram estão de fato mortas?

-S.r. Manuel creio que independente da idade, ambos podemos tirar bom proveito de uma conversa honesta não acha?

-Sim, é claro!

-Posso lhe perguntar uma coisa?

-Pois diga logo!

-O Senhor acredita mais na bíblia ou nas tradições?

-Obviamente que na bíblia, ela é a palavra de Deus! mas confesso que ao longo da minha vida li muito pouco.

-Muito bem! Então proponho nos encontrarmos amanhã aqui mesmo a tarde, e a noitinha iremos ao casarão, o que acha?

-B-bem eu não tenho certeza. - estremeceu Manuel

-O Senhor tem que perder esse medo, bem amanhã se encontrar coragem iremos lá! boa tarde, está esfriando muito, acho que seria prudente se recolher!

-Sim filho, espere que lhe dou uma carona! Meu carro é velho mas funciona! (risos)

A noite, após chegar em casa o S.r. Manuel sentou-se na sua cama pensativo, sua filha o esperava:

-Papai, onde estava? fiquei preocupada!

-Estava passeando filha.

-Tudo bem, apenas me avise quando for demorar Papai.

-Está bem, agradeço, aliás amanhã talvez eu chegue tarde, bem tarde, não fique apreensiva.

-Tudo bem Papai, vamos à mesa, eu fiz uma sopa.

Manuel ficou olhando ao redor vendo a casa já um tanto desgastada, móveis velhos, janelas e portas em mau estado, seus netos tentando se aquecer numa lareira improvisada enquanto esperavam pela chegada do Pai. Manuel disse:

-Filha, gostaria de ajuda-la, sei que só dou trabalho!

-Ah! nunca mais diga isso Papai, nós o amamos e você sempre será bem vindo em nossa humilde casa, após o jantar o Senhor já pode ir dormir.

-Obrigado querida!

No meio da noite, no limiar da madrugada, ele acordou perturbado. A passos lentos acercou-se da janela da sala que estava bem fechada, um papelão grosso tampava uma parte do vidro quebrado, ele retirou o papelão cuidadosamente e se pôs a olhar o casarão imerso em sombras, seu coração acelerou-se por um instante ao ouvir um som na porta da sala, virou-se rapidamente e então viu seu genro.

-Acordado a essas horas S.r. Manuel? ainda com medo do desconhecido? gostaria de revê-los?

-N-não! - tiritou Manuel

-O S.r. me parece aprisionado numa barreira do tempo, nunca poderá viver enquanto não tirar o medo de seu coração! Eles não estão mais lá! devem estar com Deus ou no inferno! fique tranquilo!

-N-no inferno não! - gaguejou trêmulo

-Por que não? como sabe?

-B-bem na verdade eu não sei! M-mas espero que não! gaguejou Manuel

-Sim, eu sei- tornou o genro pegando uma garrafa com chá quente- ninguém quer que os seus se percam, bem enfim boa noite, o Senhor é um bom homem. Tenho que ir, amanhã acordo cedo.

-O-Obrigado Jovem! Manuel sentia as cordas vocais congeladas até então, após isso foi até o vitrô e recolocou o papelão, uma resposta as suas dúvidas era tudo que ele pedia a Deus.

Na tarde do dia seguinte, Paulo o encontrou no lugar combinado, era uma praça arborizada, cercada de mesas de cimento alguns com um tabuleiro de Xadrez, bancos de concreto e alguns balanços, o lugar estava vazio, ambos sentaram-se no banco e Paulo dispôs uma bíblia sobre a mesa. Manuel disse:

-Bem meu jovem, espero que tenha as respostas!

-Sim, eu as tenho, estão na bíblia Senhor!

-Pois bem, então vamos começar, sempre acreditei que nosso espírito sobrevivia a morte, onde a bíblia diz que não?

-Bem eu acho que devo começar desde o princípio, quando Deus criou o primeiro homem, isso deve ser de base pra nossa crença saber de onde surgiu o homem, o que acha?

-Interessante!

-Então vamos lá, vamos ler: E formou o Senhor Deus o homem do pó da terra, e soprou em suas narinas o fôlego da vida; e o homem foi feito alma vivente. Gênesis 2:7

Leia também estes textos: Eclesiastes 9:5,10 e Salmos 146:4. Manuel tomou a bíblia e se pôs a ler os textos minutos depois, o rapaz indagou: Baseado nessas informações S.r. Manuel eu lhe pergunto, onde estava Adão antes de ser criado?

-Bem, segundo a bíblia ele estava no pó da terra! E após a morte não há mais consciência de nada...

-Isso mesmo! E Deus disse que após sua morte ele voltaria ao pó da terra, olhe aqui, leia o texto de Genesis 3. Se o homem não pecasse viveria para sempre, mas como pecou herdou a morte.

-Então realmente ele não poderia viver após sua morte porque seria um prêmio e não um castigo! Além disso o criador passaria por mentiroso não é?

-Realmente, agora vejo que você entendeu a questão! Vamos marcar um outro dia para estudar as escrituras?

-Sim, sim, pode marcar! [...]

-Quer ir ao casarão agora?

-N-não.. gaguejou- verei isso outra hora!

-Tudo bem, nos veremos depois, até lá!

Naquela mesma noite após o jantar, Manuel ficou lendo e relendo os textos que aprendera. Nas breves nuances de lembrança de seus familiares, sentiu-se fortalecido com a esperança da ressurreição de seus entes queridos. Mas faltava algo, quando todos já estavam na cama, dormindo ele resolveu sair...

A noite estava fria, imagens estranhas se formavam entre as arvores grandes que balançavam com o vento.

Eram quase meia noite quando uma sombra se projetou no portão velho de madeira do casarão. A unica luz existente era da lua, passos vacilantes invadiram aquela antiga residência, a porta pareceu bater forte, uma forte corrente de ar entrava pela casa pelas janelas quebradiças, uma escuridão densa tomava tudo e um silêncio inquietante era rompido apenas pelo som do vento sibilante. A casa era grande, com porão, andar térreo e um andar superior com alguns quartos, ele aproximou-se da escada de acesso aos quartos superiores, então sentou-se num canto da escada, passeou o olhar por todos os cantos e chorou brevemente, era Manuel, o coração ainda entristecido, mas enfim feliz por ter tido coragem de voltar a sua antiga casa, tudo parecia calmo, fazia agora planos para sua volta, o terreno era muito grande e ele venderia a metade para custear as reformas. Certamente a verdade o libertou.

João 8.32

*** Fim ***

Mario B Duran
Enviado por Mario B Duran em 10/10/2017
Reeditado em 10/10/2017
Código do texto: T6138593
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