Microconto - Aquilo Que Vem Com a Tempestade
Chovia forte naquela noite e eu me apressei para entrar em casa e me proteger.
Meio aos atropelos e com dificuldade, esquivando-me da aguaceira que encharcava minha face, consegui encaixar a chave no buraco da fechadura e abrir a porta, mas não antes de minha mão escorregar na maçaneta e me proporcionar um dolorido encontro com a porta.
Já do lado de dentro, me recuperando do pequeno incidente, avistei na velha poltrona de balanço que encontrava-se de costas para a porta, de frente para a lareira, meu velho e solitário pai, vagarosamente se balançando, de modo que apenas era possível visualizar sua mão pendente ao braço da poltrona, como se em profundo sono estivesse.
O balanço compunha uma sinfonia de ferrugem a medida que acontecia.
“nheeeeen, nheeeeen, nheeeeeeeen”
Não quis acordá-lo, apenas lhe desejei em voz baixa um “boa noite pai”.
Quando me rumava ao meu quarto, no topo da escada, lá estava papai que me viu e disse, “boa noite filha, não ouvi você chegando”.
Atordoada, olhei para a cadeira de balanço, que agora estava imóvel e em silêncio sepulcral, não havia mais nada lá.