I
 
Quando aluguei aquele quarto barato no segundo andar de um prédio caindo aos pedaços e com a pintura desgastada pelo tempo. De fato, estes prédios antigos têm suas histórias e, as vezes elas são assustadoras.
Alguns dirão que minhas noites regadas a bebidas fortes e remédios para dormir foram os culpados pelas coisas que comecei a escutar no andar de baixo daquele antro de bestas malcheirosas.
Nunca cheguei a conhecer os inquilinos do andar de baixo, o de número 220, mas as coisas que escutava, as vezes perto do anoitecer e, muitas vezes altas horas da noite me tiravam o sono.  De algum modo os remédios controlados que tomava não estavam fazendo mais efeito, e ficava noites inteiras de olhos vidrados escutando as blasfêmias e gargalhadas demoníacas que vinham do andar de baixo. Algumas vezes tomava coragem e descia as escadas mal iluminadas e poeirentas cobertas de mofo, com tabuas apodrecidas que rangiam sinistramente mesmo com meus passos cautelosos. No entanto, quando me aproximava da porta do estranho quarto, tudo que ouvia, era o silêncio do silêncio.
Não pense você que estou louco, muitas noites eu desci aquelas escadas sorrateiro, tentando ver alguma coisa pela janela de vidro coberta por um lençol escuro, ver quem morava naquele apartamento logo abaixo do meu. Fazia isso quase todas as vezes que voltava do trabalho depois do anoitecer.
Lembro bem da noite que tomei coragem e, resolvi descer e tomar satisfação com aqueles amaldiçoados, as risadas hediondas e as blasfêmias até altas horas da noite não me deixava dormir. Eu desci as escadas pela vigésima sétima vez, mas desta vez não me preocupei com o barulho que faria, nem com os rangidos sinistros ou de cair com o pé sobre alguma tabua solta ou podre.
 No entanto, naquela madrugada pareceu que alguma coisa estava errada e, quanto mais me aproximava da porta do quarto, as gargalhadas pareciam mais distantes, os gritos e as blasfêmias, as risadas zombeteiras pareciam ecoar do andar de cima. Olhei em meu relógio de bolso as horas, eram três horas da madrugada. Voltei rapidamente para o meu andar e entrei a passos rápidos sentindo um ligeiro arrepio sobrenatural.
Na manhã seguinte mudei daquele lugar; disse ao proprietário do prédio sobre as coisas que escutava no andar abaixo do meu. Mas, aquele sujeito gordo e insensato mostrou seus dentes num sorriso sarcástico balançando a cabeça. Em seguida apenas disse que eu estava louco.
Não pense você que estou louco, muitas noites eu desci aquelas escadas sorrateiro, tentando ver alguma coisa pela janela de vidro coberta por uma cortina azul escura, ver quem morava naquele apartamento logo abaixo do meu. Fazia isso quase todas as vezes que voltava do trabalho depois do anoitecer.
 De algum modo os remédios controlados que tomava não estavam fazendo efeito, e ficava noites inteiras de olhos vidrados escutando as blasfêmias e as gargalhadas demoníacas que vinham do andar de baixo.
 
Fim