O diabo lhe mandou lembranças
Tony retirou o carregador da pistola 9 mm e verificou as balas uma a uma. O recolocou e deixou a pistola sobre a mesa a sua frente. Apoiou o cotovelo sobre o tampo de granito e repousou o queixo no punho cerrado. Seus olhos se fecharam e seu maxilar se enrijeceu rapidamente.
Seus punhos estavam presos por grossas cordas no alto de sua cabeça, quando seus olhos se abriram. O lugar estava mergulhado numa densa penumbra, prejudicando sua visão. Sua cabeça ainda doía por conta da pancada que recebeu e o sangue já havia coagulado por toda a extensão de sua nuca.
Tentou libertar seus punhos, mas fracassou. Manchas advindas de uma explosão coloriam sua camiseta aqui e ali. Sua equipe estava morta e ele agora havia se tornado prisioneiro de seu alvo. Conseguiu visualizar a silhueta de uma cadeira alguns metros a sua frente e se esforçou para ver se havia alguém sentado ali. Estava vazia.
A porta metálica do lugar se abriu com um estalo e Tony ouviu passos se aproximarem. Um sujeito de cabeleira loira farta e olhar impiedoso surgiu em sua frente. Ele tinha um bastão metálico em mãos.
- Enfim a caça vira o caçador.
- Vai para o inferno. - Cuspindo as palavras.
- Talvez um dia eu vá, mas não antes de você.
- Por que você não me solta dessas amarras e me enfrenta como um homem?
- E perder toda a diversão?
O sujeito deu-lhes as costas por um instante, se afastando ligeiramente, e voltou a olhá-lo.
- Você cometeu apenas um erro, que acabou com toda a sua equipe e vai acabar com você também.
- Seu miserável desgraçado!
- Mas você ainda tem uma chance, basta entregar seu líder.
- Jamais faria isso. - Franzindo a testa.
- Então não tenho outra escolha.
O rapaz o golpeou com o bastão no abdômen, fazendo-o abafar um grunhido.
- Você tem a oportunidade de sair daqui vivo.
- Não vou trair minha facção.
Seu abdômen recebeu mais alguns golpes, em seguida foi a vez de seu rosto ser castigado. Um corte extenso, porém superficial, se abriu no alto de sua sobrancelha.
- Última chance. Entregue seu líder e eu o deixarei partir.
- Nunca. - Convicto.
- Você pediu por isso.
Ele apertou um botão discreto na base do bastão e uma lâmina de quase dez centímetros surgiu na ponta, mortal. Uma expressão de medo e surpresa passou pelo rosto de Tony. O rapaz aproximou a lâmina vagarosamente do peitoral de seu prisioneiro, com um sorriso que beirava a loucura. Tony sentiu um nó se formar em sua garganta e engoliu em seco.
O tecido de sua camiseta foi rasgado ao meio, deixando seus músculos definidos em evidência. A ponta da lâmina roçou sua pele e sentiu um calafrio amedrontador percorrer sua espinha, logo após um extenso e doloroso corte se abriu, de uma ponta a outra, em seu peito e ele urrou, cerrando os dentes.
- Fale. - Instigou seu algoz, observando o sangue escorrer.
No entanto Tony nada disse, apenas o encarava com o olhar furioso e os dentes trincados.
- Euq o obaid amoc aus augnil.
Perfurou seu abdômen com um violento golpe e deslizou a lâmina na vertical, causando-lhe uma dor estonteante. O rapaz sorria, prazeroso, enquanto escutava seus gritos. A cabeça de Tony pendeu para frente, inconsciente.
Seus olhos voltaram a se abrir e ele pegou a arma de cima da mesa, se colocando em pé. Ergueu a camiseta na altura do peito e encarou a extensa e pavorosa cicatriz em seu abdômen. Seu maxilar se enrijeceu. Deixou a sala e seguiu rumo ao destino que tanto esperava.
Tocou algumas vezes na porta e se posicionou ligeiramente para o lado, saindo do foco do olho mágico. Voltou o olhar para o chão. A porta foi aberta e Tony fitou o rapaz que lhe presenteara com as cicatrizes.
- Surpreso em me ver?
- Não pode ser. Você estava morto! - Dando alguns passos para trás. - Eu mesmo me certifiquei disso.
- O diabo lhe mandou lembranças.
Tony sacou a pistola e fez um único e mortal disparo na testa do rapaz. Adentrou a residência, passando por cima do cadáver, e pegou a maçã vermelha que estava em cima da mesinha de centro. Deu uma mordida generosa na fruta e deixou o lugar, fechando a porta atrás de si.