------Vingança Amaldiçoada------Parte Cinco------

------Vingança Amaldiçoada------Parte Cinco------

Um grande estrondo na porta principal atrapalha a reunião da grande casa. Mark corre, mais assustado do que raivoso, para averiguar quem batia tão ferozmente. Abre o enorme portal, se deparando com dois seres tremendamente pálidos e ofegantes. Mal conseguiam respirar. Seus olhos, ainda arregalados, mostravam pavor. - Miguel? Bill? Meu Deus, vocês estão suando frio. Entrem, entrem rápido.

Balcon e Johnnantan levantam-se do sofá cedendo seus lugares para os recém chegados. Foram se recompondo, porém nenhuma palavra ainda saía das suas bocas. Respeitando a situação dos dois, ninguém ocupou-se a nenhum tipo de interrogatório. Esperavam pacientemente até que alguém, por vontade própria, se expressasse. O tempo passava sem nenhuma novidade. Então, os sons fantasmagóricos emitidos pelas perdidas rajadas de vento serviram de chamado à intervenção do padre.

Pediu que Megy, já lúcida e envolvida, fosse à cozinha pegar sal. A garota obedeceu voltando segundos depois. Tomás seguiu com um tipo de ritual muito simples, mas não deixando de ser estranho. Fizera um círculo com o sal ao redor de toda a sala.

- Isto se tornará um escudo contra qualquer espírito escuro dos abismos do inferno. Dentro desde perímetro, o mal não nos invadirá, muito menos nos escutará.

- Estamos completamente seguros – finalizou o padre levando seu olhar de Megy à Jason, em seguira parando-os nos empregados.

Por sua vez, eles se entreolharam duvidosos e receosos, pois a lembrança era muito perturbadora. Finalmente, Miguel ergue-se e, entre longas respirações, começa:

- Atendendo ao chamado do xerife, me dirigia, junto de Bill e outros cinco colegas, à esta casa. Seguimos pelo caminho do Beirágua, o pequeno rio, direto no cemitério...

- Não esqueça das ruínas, não esqueça – interrompeu Bill ainda aturdido.

- Claro! Quando atravessamos o cemitério, vimos, ou pelo menos pensamos ver, diversas sombras entrando nas antigas ruínas. Meu coração tremeu acelerado, mas pude ver que tinham forma singularmente humanas.

- Sim, sim! – completou o outro – ao menos que meus olhos tivessem me traído, tinham exatamente a forma de seres humanos, flutuando sob o chão frio. A princípio, pensei tratar-se de um bando de malucos encapuzados, mas também não se via suas pernas e pés. Atravessavam a estrada da cripta abandonada em fila.

- Creio que ninguém tenha dito nada, pois podia ser apenas uma alucinação provocada pela noite. O pior ainda está por vir.

Um novo trocar de olhares entre ambos. Temiam a continuação, além de malíguina, se não fosse os atuais eventos, iriam ser passados por loucos. De repente, e fazendo os poucos cabelos de Mark subirem, vozes, muitas delas, e sussurros invadiram todo o local. “Flashs” de cor preta passavam como um raio pelas paredes e teto.

- Tardaram mas chegaram, seus canalhas – disse Tomás – são espíritos, provavelmente os que entraram em Jason. Acredito que o possuidor de Megy também vagueia com eles. Mas não se preocupem; como os jovens não voltaram a ser apenas corpos sem alma, previ que cedo ou tarde os demônios atacariam.

Padre Tomás Ezequiel colocou a mão em sua manta revelando o que buscara no jardim do parque; uma bela flor azulada. Dizia o padre balançando-a no ar, que ela nascera o local e momento da ressurreição de Jesus Cristo. Possuía uma formosura única e exalava um cheiro com efeito poderosíssimo. Todos na sala se sentiram fortes, protegidos e bravos.

A pequena porção de solo na qual permanecia a flor fora protegida por muitas gerações de padres. Tendo seu primogênito como responsável por uma amostra dela que já descansava no mesmo terreno por décadas.

Tratou ele de retirar todas as pétalas espalhando-as de forma separada pelo círculo. Derramou um óleo incolor em uma delas iniciando uma labareda de chama azul que como numa torrente, envolveu toda a área. As rápidas sombras tomavam forma e gritavam. As criaturas das trevas sofriam. Seus novos surgidos e negros braços giravam na medida em que seus corpos se contorciam. Momentos seguintes o silêncio volta.

- Que espécie de milagre foi esse? Um poder incrível – disse Johnnantan.

- Sem explicações, eles não foram destruídos, ainda. Mas estão fracos agora e possuem aspecto humano. Precisamos nos apressar.

Miguel conhecia seu dever de continuar a sua narração, era de direito de todos saber o ocorrido. Não disfarçava o seguido olhar para Bill, implorando que o companheiro terminasse a história. Todos agora o encaravam, sabiam que o grande medo do outro o impedia até mesmo de se mover. O efeito da flor já havia terminado. A pressão era insuportável.

- Uma das sombras nos viu – começou Miguel quase num engasgo – as fracas luzes das luminárias da estrada que beirava o cemitério começaram a se apagar, uma a uma. Ouvimos gritos, uivos, à medida em que o escuro ia se aproximando de nós, esses sons do inferno ficavam mais altos e medonhos. Fredy, um dos nossos, gritou para que todos corrêssemos, mas o “nada” crescia depressa. Corremos, corremos como animais chicoteados pelos donos.

O falante tremia. A cena ia ascendendo em sua memória enquanto o suor gelado escorria-lhe no rosto. Bill encarava o chão, temeroso de que alguém o obrigasse a continuar. Ele sabia que devia, mas temia, era como se ao sons de suas palavras, a terrível morte viria pegá-lo.

- Nós não fomos rápidos o suficiente. A sobra era uma boca gulosa com presas esmagadoras, que devorava a quem ela encontrasse. Muitos definharam. O desespero os fazia tropeçar para serem sugados pelo esquecimento. Se fôssemos resgatá-los, morreríamos também. E como vêem, de muitos bravos, apenas Bill e eu sobramos.

- Eu lamento – disse Mark, sacando do bolso de sua jaqueta um velho pote de uísque e oferecendo-o ao empregado.

Megy e Jason estavam a observar atônitos, tudo o que se passava. Nenhum pensamento lhes vinha. Não sabiam o que poderiam fazer, porém ainda estavam aliviados pela segurança que Tomás os havia dado.

- O que o senhor supõe que façamos, padre?

Tomás encarava Balcon, porém, ignorou completamente sua pergunta. Algo passava pelo seu pensamento, uma possibilidade que não era absolutamente de seu agrado. Virou-se para observar o resto da turma. Estudava seus medos e a disponibilidade de cada um para o que seria um último sofrimento.

- Vim a esta vila com um propósito. Não podia revelar isto a ninguém, a menos que fosse necessário. Fui ordenado destruir todo mal aqui concentrado. Uma mancha negra que cai numa pequena poça de água, se espalha muito rápido. Estou aqui, não para ser seguido por ninguém, mas peço ajuda. O destino não está ao nosso favor. Essa história pode não ter um final feliz. Saibam, meus amigos, nenhuma vitória existe, sem sacrifícios. Sacrifícios estes, que já começaram. Os demônios já destruíram, ou fizeram algo pior, a alguns dos nossos.

- Pi...pior, padre? – perguntou Megy.

- Sim, minha filha. Seus empregados podem ter sido transformados. Se seus corpos foram destruídos, suas almas foram “marcadas”, caso contrário, eles se tornarão vampiros, mortos vivos.

Tudo era silencioso. O antigo salão principal da casa de Mark tinha um tom amarelado nas paredes e um belo tapete indiano cobria quase toda área do chão. O ambiente se tornava denso, todos ainda esperavam (ou queriam, pois receavam falar) uma continuação de Tomás Ezequiel. O que não se demorou.

- Creio que seja hora de todos aqui descansarem. Ficarei aqui mais um pouco. Amigo Mark, peço que nos separe nos seus aposentos agora. Jason, Megy, não temam, estarão seguros por esta noite.

Ninguém levantou até as dez horas da manhã, devido ao tamanho cansaço e o fato de não terem conseguido dormir no momento em que se deitaram. Quando Tomás desceu para tomar café, se surpreendeu com a falta de seus empregados. Pelo insciente ter sido muito recente, ainda não tinha se acostumado. Apenas algumas das serviçais trabalhavam e foram instruídas pela avó a não fazerem perguntas. Miguel e Bill, apesar do cargo, dormiram sem acanhamento em um dos quartos de hospedes da mansão. Balcon ao seu lado, Mark junto de Megy e Jonnantan com o padre na sala, em duas camas feitas na hora. Ambos pareciam não ter dormido muito bem.

Após o café, que foi tomado com muita vontade, cada um foi cuidar de suas tarefas. Tomás, rejeitando a vontade de todos de invadir as ruínas de dia, prometeu uma explicação no fim da tarde.

O céu estava vermelho, sangue tinha sido derramado no dia anterior. Nada de pássaros nem de vento. Até o calor do sol parecia ter sumido. O movimento da vila nunca foi muito grande. Os trabalhos eram normalmente feitos em casa.

O vermelho sumia, abrindo espaço à sombria escuridão. Escuro total. Se por um lado, a lua cheia permite uma grande carga de energia negativa, por outro ela pode refletir os poderosos raios do sol, dando alguma luminosidade e esperança aos homens. Pe. Tomás Ezequiel, acompanhado por um lado de Johnnantan Duares e do outro de Tio Mark, esperava a chegada de todos. Os jovens e os empregados passaram todo o dia na casa. Apenas Balcon foi trabalhar fora.

Com a completa reunião, Tomás se levantou, apontando seu cajado para debaixo de uma cômoda.

- Vêem a sombra formada por esta cômoda? – perguntou ele vendo todos balançarem suas cabeças em sentido de negação– o que há nela? Vocês conseguem distinguir? Creio que não, mas se algo estivesse lá, como um rato ou um morcego, ele os veria. Á luz do dia estaríamos mais expostos do que eles. Não podemos simplesmente fazer sumir com todas as ruínas, não toneladas de pedra e concreto. Mas o motivo principal que me levou a ignorar a opinião de todos, foi que, em minha mente, penso que não há como nos encontrarmos com estes seres quando o sol domina. Eles são criaturas que reinam plenamente apenas a noite. Não notaram que os dias estão ficando escuros? É seu domínio que cresce.

- Receio que não serão apenas com os espíritos demoníacos que devamos nos preocupar. Espíritos sempre existiram, bons ou maus, porém, por uma lei divina, são proibidos de interagirem conosco. Há aquelas que desobedecem, à eles, cabe a desolação....

- Como então..? São tantos deles... – interrompeu Bill.

- Magia negra. Um círculo de magia negra, para ser mais preciso.

- Então tudo o que temos que fazer é destruir ou apagar este símbolo?

- Sim, caro amigo. Mas receio não ser tão simples. A magia foi e tem que ser feita por intermédio de um humano.

- A princípio, pensei ser Jason sob domínio, não espiritual, mas psíquico, dos demônios – continuou recebendo do Jovem um olhar apreensivo – Logo esta idéia foi descartada já que a magia ou feitiço é de fonte fraca, ou seja, deve ser refeito dos os dias, ou seu efeito morre. Jason não deixou a casa nos últimos dias, deixou? Devemos inabilitar este traidor, assim, nada mais do vale das sombras poderá se libertar. John...

- Se me permite, padre, pesquisei algumas formas de destruir o círculo mágico. Uma dela era com a flor que o senhor ontem usou. Com ela, bastávamos mistura a água sagrada e derramar no local. O outro meio é um tanto complexo. Uma química inventada por um tal de “Dr. Helsing” – fazendo alusão ao personagem de Bran Stoken - deve entrar em contato com o criador da magia. Em contato químico. Com seu sangue.

Megy deixou escapar um gritinho e os murmúrios aumentaram pela sala.

- Mata-lo? – se expressou Miguel – iremos matar o pobre desgraçado? E se ele tivesse possuído, como os jovens?

- Impossível! – exclamou o padre – Neste caso, a magia não funcionaria. Johnnantan está certo, precisamos do sangue dele, mas não é necessária sua morte. Não é necessária nenhuma morte. O criador disto irá pagar por meios humanos.

A noite se extinguiu com uma demorada discussão de todo o grupo sobre o plano que iriam seguir. Jason e Megy se espantaram ao ouvir da boca de todos, inclusive de Mark, que sua presença seria essencial. “Dois sensitivos podem chamar atenção, podemos usar isso”.

Novamente, todos dormiram na mansão. Tomás chamou-os em duplas e individuais para executar o que parecia ser uma singular bênção...

- Para proteção – dizia ele – durmam bem!

Continua...