O ritual

Alysia é uma garota diferente. Visual excêntrico, cabelos roxos, não dava a mínima para a moda ditada pelas outras pessoas. Sem muitos amigos com quem pudesse sair, passava os dias dentro de casa. O que ela gostava mesmo era de festas esquisitas com gente estranha.

Recebeu um convite para uma festa gótica pelo Facebook e não pensou duas vezes antes de aceitá-lo. Calçou seus coturnos pretos com solados grossos e embarcou em um táxi. O taxista parou o carro em frente a um prédio abandonado há décadas em uma rua deserta.

A jovem saltou do carro e o taxista saiu apressado. Ela olhou ao redor rapidamente e deu de ombros. O vocal gutural e o solo de guitarra ecoavam altos dentro do prédio. Alysia olhou o palco, os músicos empolgados, lançavam os cabelos compridos no ar. Caminhou até o bar e pediu uma tequila.

Jogos de luzes coloriam a pista de dança apinhada de pessoas como ela.

- Moça, sua bebida. – Disse o barman, pela terceira vez.

- Desculpe.

Ele tinha piercings na sobrancelha, nariz e boca e tatuagens espalhadas pelos braços.

Olhou novamente para a pista de dança. Pela primeira vez não se sentia desconfortável em um lugar com tantas pessoas. Um homem com cabelos até o meio das costas e roupas pretas interrompeu a banda.

- Chegou à hora tão aguardada. – Entusiasmado.

Os convidados celebraram a notícia.

- Peço que todos se dirijam até o segundo andar.

Alysia tomou um generoso gole da bebida e deixou o copo sobre o balcão. O cheiro forte de álcool pairava. Uma mulher e um homem bloquearam seu caminho.

- Você pode nos acompanhar? – Disse o rapaz, com um sorriso.

- O que está havendo?

- Nada de mais, percebi que é nova aqui e os novatos tem que pegar um caminho diferente. – Respondeu a mulher. Ela usava lentes de contato vermelhas.

- Mas por quê?

- Por que é assim que as coisas funcionam aqui. – Disse o rapaz, impaciente com tantas perguntas.

Alysia os olhou por alguns instantes e por fim os acompanhou. Eles subiram um lance de escadas, alguns degraus estavam quebrados. Entraram em uma pequena sala sem qualquer móvel. O rapaz acendeu a única lâmpada. As paredes tinham um tom de verde decadente.

- O que estamos esperando? – Perguntou ela.

Ninguém respondeu.

Ela escutou a voz do rapaz de cabelos até o meio das costas anunciar o que ele chamou de “a última peça” e ela foi escoltada até o lugar onde todos estavam.

Os convidados da festa saudaram a sua entrada e ela olhou ao redor assustada. O rapaz de cabelos até o meio das costas a encarava com um olhar dúbio. Uma cortina vermelha pesada estava fechada atrás dele, dois rapazes estavam posicionados nos cantos.

- O que vocês acham? Será que Satã ficará contente com a oferenda? – Apontando para Alysia.

A multidão brandiu enlouquecida.

Ela sentiu seu coração se acelerar. A cortina foi aberta, revelando duas grossas pilastras de concreto, quatro correntes presas às pilastras se amontoavam no chão ao redor. O desenho de um pentagrama coloria o chão de vermelho e preto.

Seus punhos foram presos as correntes e um punhal foi entregue ao líder da seita. Ele o encarou sorridente e voltou o olhar para a jovem acorrentada. Uma tigela de metal com um líquido escuro foi entregue a ele pela jovem de olhos vermelhos, e a adaga foi mergulhada.

Alysia agarrou as correntes com força e soltou um rugido gutural. Farelos de cimento começaram a se soltar das colunas e o líder da seita a encarou espantado, toda a multidão ficou em completo silêncio. Ela se soltou e disparou entre a multidão.

- Atrás dela! – Ordenou o líder da seita, raivoso.

Quatro homens e duas mulheres começaram a persegui-la. Alysia cortou por uma rua à direita e olhou rapidamente para trás. Seus punhos estavam vermelhos e esfolados. Saltou muros e portões tentando despistá-los, mas seus esforços não surtiram resultados.

Atravessou a rua e escutou um dos perseguidores gritar algo que ela não entendeu. Não fazia ideia de onde estava indo, não conhecia aquela parte da cidade. Virou à esquerda e se deparou com uma rua sem saída. Pensou em dar meia volta, mas era tarde demais, eles já a haviam alcançado.

- Você não tem para onde correr. Se entregue e terá uma morte rápida. – Disse um rapaz de olhos negros.

A mulher de olhos vermelhos se aproximou, encarando-a sorridente.

- Não sabemos como você se soltou, mas não importa. Nós somos seis. – Disse um rapaz, com a voz era rouca.

Alysia cerrou os punhos, encarando seus adversários. Não se entregaria. Soltou um berro agudo e disparou em direção aos seus adversários. Desferiu vários socos, alguns deles não atingiram seus alvos. Atingiu o rapaz com a voz rouca no peito, jogando-o contra dois de seus aliados. A mulher de olhos vermelhos cerrou os dentes e desferiu um soco. Alysia bloqueou o golpe e a acertou no pescoço. Garras haviam surgido em sua mão, abrindo um corte fatal em sua adversária.

A mulher de olhos vermelhos levou as mãos sobre o ferimento e seu corpo desabou sobre o chão. O rapaz, que a escoltou junto com a mulher de olhos vermelhos, a golpeou no rosto e ela o contra atacou, jogando-o contra o muro e fazendo-o perder os sentidos. Sentiu alguém a golpear nas costas e desabou sobre os joelhos, em seguida foi golpeada pela mulher com um chute no queixo, suas costas encontraram o chão com um baque surdo.

Dois rapazes a levantaram sem qualquer cuidado. Sua cabeça pendia para baixo. Ela agarrou os braços dos rapazes, fazendo-os se chocarem entre si, em seguida soltou sobre os únicos ainda em pé e os golpeou no abdômen, abrindo um enorme rasgo.

Os corpos desabaram e ela olhou para as mãos sujas de sangue, as garras haviam desaparecido, mas seus olhos ainda tinham o mesmo tom de verde da fera que vivia dentro dela.

O dia mais feliz de sua vida havia se transformado em mais uma mancha vermelha em sua história.

Alice Moraes
Enviado por Alice Moraes em 12/05/2017
Reeditado em 25/11/2017
Código do texto: T5997337
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