Paralisia.
Fugêncio Phascoal mora num sobradinho de quatro andares. Seu apartamento fica no quarto andar, as janelas possuem duas vistas diferentes.
As janelas são separadas por um ângulo de noventa graus: uma fica voltada para uma grande avenida com duas pistas e canteiros centrais, a outra fica voltada para uma ruazinha secundária, com pouco movimento de carros e pessoas.
Pela janela que é voltada para a ruazinha sem movimento, há um pequeno bazar. O dono do bazar é o senhor Etifânio, de uma pachorra com seus clientes, ah meu Deus! Como pode um homem ser assim.
Segunda feira seria feriado, então senhor Etifânio recomendou a seus clientes para comprarem o que precisassem até sexta feira, pois não abriria o bazar no final de semana, só na terça feira.
Sexta-feira à noite, por volta das nove horas, Fugêncio lembrou que o boteco só abriria na terça feira, olhou pela janela e viu a venda ainda aberta.
Desceu correndo para alcançar o bazar de nome, “Utilidades Para a Vida” estava aberto, mas quando chegou em frente à porta do bar, senhor Etifânio estava terminando de baixar a porta.
Fugêncio Phascoal ficou estático, não conseguiu falar, mover qualquer parte do corpo ou dar qualquer sinal. O proprietário olhou para seu cliente na porta e esperou que o mesmo falasse alguma coisa.
Tomado por uma paralisia, Fugêncio foi ficando irritado, começou a sentir ódio de tudo aquilo, não conseguia mover um dedo, nada, nada, nada, apenas tinha a visão de tudo com os olhos vidrados na porta, a audição e a consciência.
Senhor Etifânio após tentar várias vezes se entender com Fugêncio, desistiu. Foi até a portaria e pediu para chamar a esposa do seu cliente estático. Passados cinco minutos, Malvina, esposa de Fugêncio aportou na calçada ao lado do marido.
Malvina chamou, chamou, falou, falou e nada, nada parecia chegar aos ouvidos de Fugêncio. Tentou puxá-lo pelo braço. Um espasmo muscular contínuo mantinha o homem travado no lugar, nada removia aquela estátua humana do local!
Passada das dez e meia da noite, uma multidão rodeava o esposo de Malvina. De repente, alguém teve a ideia de levantar e carregar Fufú, como era chamado pela esposa. Quando dois colegas de prédio tentaram aproximar para levantar Fugêncio, todos ouviram um grunhido horrível sair pelo canto da boca de Fugêncio.
Os colegas se afastaram rapidamente, mais de susto do que de medo. Alguém na multidão gritou:
-- Não toquem nele, ele pode ter um ataque de fúria, conheço este rapaz deste que ele era um guri. Lembro que uma vez, Fugêncio aos vinte anos teve um ataque desses, esbofeteou cinco homens, comeu uma orelha de cada um e quando a fúria passou, chorava como uma criancinha de colo.
Ali, estático, tinha plena consciência de tudo. Começou a soltar uma baba esbranquiçada pela boca de ódio: era raiva ao ouvir algo que nunca aconteceu. Como pode alguém inventar tal coisa?
Fugêncio conseguiu observar o ódio, a ansiedade e todas a emoções que lhe suscitavam. Como um observador acompanhava atentamente como os sentimentos chegavam e depois se esvaíam.
As duas da madrugada, um frequentador do bazar falou baixinho para um colega, entremetes Fugêncio ouviu:
-- Ele é retardado! Isso acontece com frequência dentro do apartamento dele! Foi a mulher dele que me disse.
Outros ouviram e se olharam. Um muxoxo ressoou entre todos, depois miravam para Fugêncio e diziam: Coitado!
As três e meia da madrugada, desistiram. O cansaço abateu todos os curiosos, todos foram para casa. Uma leve chuva caía.
As quatro da manhã, do nada! Fugêncio voltou a ter o controle total do corpo e suas vontades voltaram ao normal, estava livre. Tomado por uma indignação, cansaço e uma irritação desproporcional açoitava lhe corpo e mente.
Voltou para o apartamento, entrou, trancou a porta com a chave, foi até a cozinha. Olhou por cima do ombro esquerdo e viu a mulher em pé com as mãos na cintura e um olhar cínico.
-- Fugêncio seu palhaço! Já passou o faniquito?
O marido olhou para o armário e viu seu corrião. Como num passe de mágica, a esposa não viu o marido pegar a cinta, percebeu após a terceira lambada. Após surrar a esposa ao ponto de parar devido ao cansaço, sentou na primeira cadeira que viu.
Malvina levantou lentamente e perguntou:
Fugêncio seu palhaço! Já passou a raivinha?
Numa velocidade louca, o esposo atirou a panela de pressão na cabeça da mulher e no afã atirou os pratos também. Quinze no total. Todos quebraram na cabeça da esposa.
Outra vez, ela se levantou, embebida em sangue, com o rosto todo cortado, sem as orelhas, um olho pendurado pelo nervo óptico, perguntou:
-- Fugêncio seu palhaço! Já passou o ódio?
Fugêncio levantou lentamente da cadeira, foi até o armário e pegou três facas e dois garfos para churrasco: fincou um garfo em cada olho da mulher até vazar pela cabeça, uma faca no pulmão direito, a outra a segunda faca no pulmão esquerdo e a terceira faca no coração da esposa.
Voltou lentamente para a geladeira, pegou três ovos e começou a fazer uma omelete.
Malvina levantou de novo, e perguntou ao marido:
-- Fugêncio seu palhaço! Já passou a estupidez?
O esposo, muito calmo, abaixou o fogo, foi até a dispensa, voltou com linha e agulha, costurou os lábios da esposa e com o rolo de abrir massa, quebrou o queixo e o nariz dela.
-- A patroa se levantou e com o sangue que esguichava por um dos olhos, escreveu na parede:
-- Fugêncio seu palhaço! Já passou a ignorância?
Fugêncio terminou de comer sua omelete com bacon e couve flor olhando para aquele traste esbagaçado que tinha à sua frente.
Quando terminou de comer, foi até o banheiro, escovou os dentes, trocou de camisa e trocou o sapato por um tênis. Foi até a cozinha, decepou a cabeça da mulher com uma faquinha de mesa.
Colocou a cabeça da mulher no forno, o acendeu e saiu pra comprar cerveja. Era cerveja que queria comprar no bazar do senhor Epifânio.
As dez e meia da noite do mesmo dia, Fugêncio retornou para seu apartamento. Ao entrar percebeu que a cozinha estava limpa, os pratos estavam no lugar, a panela de pressão, as facas, os garfos, tudo nos seus devidos lugares.
O corpo de Malvina não estava em casa e sua cabeça também não estava no forno. Com a certeza de que era um viúvo, seguiu direto para o quarto, tirou o sapato, as meias, as calças, camisa e se deitou de cueca, deixando todas as peças de roupas jogadas pelo caminho do quarto.
Deitou na cama, desligou a luz e tentou puxar um segundo travesseiro para dormir. Não conseguiu, uma voz soou em seu ouvido. Todo o corpo de Fugêncio gelou: tentou falar não tinha voz, tentou movimentar, não conseguiu. Preso sem nenhuma corda, o corpo livre, mas sem mover um centímetro.
O abajur acendeu e a escuridão deu lugar a penumbra. Uma sombra foi se aproximando da cama, lentamente o vulto abriu os braços e as pernas de Fugêncio deitado de costas. Foi devorado lentamente por Malvina.
As janelas são separadas por um ângulo de noventa graus: uma fica voltada para uma grande avenida com duas pistas e canteiros centrais, a outra fica voltada para uma ruazinha secundária, com pouco movimento de carros e pessoas.
Pela janela que é voltada para a ruazinha sem movimento, há um pequeno bazar. O dono do bazar é o senhor Etifânio, de uma pachorra com seus clientes, ah meu Deus! Como pode um homem ser assim.
Segunda feira seria feriado, então senhor Etifânio recomendou a seus clientes para comprarem o que precisassem até sexta feira, pois não abriria o bazar no final de semana, só na terça feira.
Sexta-feira à noite, por volta das nove horas, Fugêncio lembrou que o boteco só abriria na terça feira, olhou pela janela e viu a venda ainda aberta.
Desceu correndo para alcançar o bazar de nome, “Utilidades Para a Vida” estava aberto, mas quando chegou em frente à porta do bar, senhor Etifânio estava terminando de baixar a porta.
Fugêncio Phascoal ficou estático, não conseguiu falar, mover qualquer parte do corpo ou dar qualquer sinal. O proprietário olhou para seu cliente na porta e esperou que o mesmo falasse alguma coisa.
Tomado por uma paralisia, Fugêncio foi ficando irritado, começou a sentir ódio de tudo aquilo, não conseguia mover um dedo, nada, nada, nada, apenas tinha a visão de tudo com os olhos vidrados na porta, a audição e a consciência.
Senhor Etifânio após tentar várias vezes se entender com Fugêncio, desistiu. Foi até a portaria e pediu para chamar a esposa do seu cliente estático. Passados cinco minutos, Malvina, esposa de Fugêncio aportou na calçada ao lado do marido.
Malvina chamou, chamou, falou, falou e nada, nada parecia chegar aos ouvidos de Fugêncio. Tentou puxá-lo pelo braço. Um espasmo muscular contínuo mantinha o homem travado no lugar, nada removia aquela estátua humana do local!
Passada das dez e meia da noite, uma multidão rodeava o esposo de Malvina. De repente, alguém teve a ideia de levantar e carregar Fufú, como era chamado pela esposa. Quando dois colegas de prédio tentaram aproximar para levantar Fugêncio, todos ouviram um grunhido horrível sair pelo canto da boca de Fugêncio.
Os colegas se afastaram rapidamente, mais de susto do que de medo. Alguém na multidão gritou:
-- Não toquem nele, ele pode ter um ataque de fúria, conheço este rapaz deste que ele era um guri. Lembro que uma vez, Fugêncio aos vinte anos teve um ataque desses, esbofeteou cinco homens, comeu uma orelha de cada um e quando a fúria passou, chorava como uma criancinha de colo.
Ali, estático, tinha plena consciência de tudo. Começou a soltar uma baba esbranquiçada pela boca de ódio: era raiva ao ouvir algo que nunca aconteceu. Como pode alguém inventar tal coisa?
Fugêncio conseguiu observar o ódio, a ansiedade e todas a emoções que lhe suscitavam. Como um observador acompanhava atentamente como os sentimentos chegavam e depois se esvaíam.
As duas da madrugada, um frequentador do bazar falou baixinho para um colega, entremetes Fugêncio ouviu:
-- Ele é retardado! Isso acontece com frequência dentro do apartamento dele! Foi a mulher dele que me disse.
Outros ouviram e se olharam. Um muxoxo ressoou entre todos, depois miravam para Fugêncio e diziam: Coitado!
As três e meia da madrugada, desistiram. O cansaço abateu todos os curiosos, todos foram para casa. Uma leve chuva caía.
As quatro da manhã, do nada! Fugêncio voltou a ter o controle total do corpo e suas vontades voltaram ao normal, estava livre. Tomado por uma indignação, cansaço e uma irritação desproporcional açoitava lhe corpo e mente.
Voltou para o apartamento, entrou, trancou a porta com a chave, foi até a cozinha. Olhou por cima do ombro esquerdo e viu a mulher em pé com as mãos na cintura e um olhar cínico.
-- Fugêncio seu palhaço! Já passou o faniquito?
O marido olhou para o armário e viu seu corrião. Como num passe de mágica, a esposa não viu o marido pegar a cinta, percebeu após a terceira lambada. Após surrar a esposa ao ponto de parar devido ao cansaço, sentou na primeira cadeira que viu.
Malvina levantou lentamente e perguntou:
Fugêncio seu palhaço! Já passou a raivinha?
Numa velocidade louca, o esposo atirou a panela de pressão na cabeça da mulher e no afã atirou os pratos também. Quinze no total. Todos quebraram na cabeça da esposa.
Outra vez, ela se levantou, embebida em sangue, com o rosto todo cortado, sem as orelhas, um olho pendurado pelo nervo óptico, perguntou:
-- Fugêncio seu palhaço! Já passou o ódio?
Fugêncio levantou lentamente da cadeira, foi até o armário e pegou três facas e dois garfos para churrasco: fincou um garfo em cada olho da mulher até vazar pela cabeça, uma faca no pulmão direito, a outra a segunda faca no pulmão esquerdo e a terceira faca no coração da esposa.
Voltou lentamente para a geladeira, pegou três ovos e começou a fazer uma omelete.
Malvina levantou de novo, e perguntou ao marido:
-- Fugêncio seu palhaço! Já passou a estupidez?
O esposo, muito calmo, abaixou o fogo, foi até a dispensa, voltou com linha e agulha, costurou os lábios da esposa e com o rolo de abrir massa, quebrou o queixo e o nariz dela.
-- A patroa se levantou e com o sangue que esguichava por um dos olhos, escreveu na parede:
-- Fugêncio seu palhaço! Já passou a ignorância?
Fugêncio terminou de comer sua omelete com bacon e couve flor olhando para aquele traste esbagaçado que tinha à sua frente.
Quando terminou de comer, foi até o banheiro, escovou os dentes, trocou de camisa e trocou o sapato por um tênis. Foi até a cozinha, decepou a cabeça da mulher com uma faquinha de mesa.
Colocou a cabeça da mulher no forno, o acendeu e saiu pra comprar cerveja. Era cerveja que queria comprar no bazar do senhor Epifânio.
As dez e meia da noite do mesmo dia, Fugêncio retornou para seu apartamento. Ao entrar percebeu que a cozinha estava limpa, os pratos estavam no lugar, a panela de pressão, as facas, os garfos, tudo nos seus devidos lugares.
O corpo de Malvina não estava em casa e sua cabeça também não estava no forno. Com a certeza de que era um viúvo, seguiu direto para o quarto, tirou o sapato, as meias, as calças, camisa e se deitou de cueca, deixando todas as peças de roupas jogadas pelo caminho do quarto.
Deitou na cama, desligou a luz e tentou puxar um segundo travesseiro para dormir. Não conseguiu, uma voz soou em seu ouvido. Todo o corpo de Fugêncio gelou: tentou falar não tinha voz, tentou movimentar, não conseguiu. Preso sem nenhuma corda, o corpo livre, mas sem mover um centímetro.
O abajur acendeu e a escuridão deu lugar a penumbra. Uma sombra foi se aproximando da cama, lentamente o vulto abriu os braços e as pernas de Fugêncio deitado de costas. Foi devorado lentamente por Malvina.