Pelotão da Morte
Depois de percorrer pela margem do rio Mei Cong várias milhas, os soldados do pelotão C (Charlie) adentram a floresta percorrendo a trilha de volta ao ponto de encontro onde devem aguardar o helicóptero para voltar ao acampamento. Várias armadilhas postas pelos vietcongues nos atrasaram a marcha de volta. Um soldado, Purcel, caiu em um buraco cheio de estacas depois de ficar olhando para cima, para um lenço pendurado no galho de uma árvore alta, e perdemos o cabo Smith e o soldado Jones para as minas terrestres.
Ouvimos sons de metralhadoras de repente. Um morteiro atinge Robertson e eu vejo vários pedaços dele voando pelos ares, próximo de mim. O Sargento dá a ordem para espalhar e agachar, respondendo ao ataque. Parece que vários soldados vietcongues estão atacando protegidos pelas árvores da floresta fechada.
Muito tiroteio e muita gritaria. O tenente se dá conta de que há muito mais soldados inimigos atirando ao mesmo tempo em frente, talvez uma compania inteira, mais do que podemos dar conta. Ele chama o homem do rádio e, protegendo sua retaguarda, telefona para o comando pedindo um bombardeio de saturação, para os Charlies finalmente poderem voltar para o acampamento depois de mais esta missão.
- Folkstrot, Oscar, Delta, Alfa, para estação Sierra, solicitando napalm no quadrante sessenta e cinco, norte do Mei Cong.
Depois de alguns minutos de espera respondendo aos tiros, os congs correm em fuga quando um avião supersônico passa voando em rasante e soltando um líquido que queima a floresta e todos os seres vivos pelo caminho. Muitos de nosso pelotão pereceram pelo ataque dos congs, enquanto esperávamos o ataque de saturação. Uma vez que o tenente certificou-se da segurança da trilha, nos pusemos em marcha novamente em fila indiana, todos os quinze que sobraram do pelotão Charlie. Rodrigues segue na frente inspecionando cada nuance do terreno, sempre devagar em busca de mais armadilhas. De repente para. Agacha-se e faz sinal com a mão levantada. Todos param de imediato, até o tagarela do Vásquez, que vinha contando vantagem novamente sobre sua gangue nos subúrbios de Seattle.
Rodrigues, com seus olhos de águia, havia visto uma pequena linha no chão, e com cuidado todos passamos por cima dela.
No sol de fim de tarde, quase anoitecendo, o calor ainda é insuportável e os mosquitos atacam meu rosto atrapalhando minha visão. Quase ao acaso, enquanto escutava o som de insetos barulhentos e bebia mais um pouco de água em meu cantil, eu vejo à esquerda uma figura grotesca. Foi apenas por um instante, enquanto todos estavam distraídos procurando por mais vietcongues. Rapidamente aponto minha metralhadora M-16 para o local onde vi a estranha figura de relance. Suspeitando tratar-se de algum inimigo, lanço uma granada naquela mesma direção, que ecoa fazendo barulho pelas árvores, e mesmo com a recriminação do sargento mandando economizar munição e fazer menos barulho para não atrair a atenção de mais vietcongues perdidos pela mata, eu me sinto mais seguro.
Depois de alguns quilômetros mata adentro enquanto anoitece, o tenente e o sargento ordenam uma parada para verificar no mapa nossa posição atual. Eu sou designado para montar guarda no perímetro enquanto alguns de meus companheiros aproveitam para pegar suas latas de ração na mochila. Pego um tablete de sal e ponho na boca chupando aos poucos como se fosse uma bala, enquanto sorvo mais alguns goles de água. Ficar desidratado nessa selva cheia de mosquitos pode significar a morte.
Um tiro ecoa pela mata, de repente, acertando um dos nossos. Imediatamente respondo ao tiro, mas a figura que disparou escondeu-se depressa na mata, desaparecendo de vista, enquanto eu ouço alguém atrás de mim chamando o médico. Era só o que faltava, um maldito franco atirador cong. O tenente ordena que Rogers e eu procuremos por ele, e empunhando minha M-16, com Rogers ao lado, corremos em direção das árvores. Ao chegar à posição de onde veio o tiro, nos deitamos no chão e descobrimos na penumbra da noite, um alçapão que se abre para um túnel. Comunicamos ao sargento que em resposta nos ordena abrir a tampa enquanto ele lança duas granadas para dentro. A fumaça cheia de poeira que sobe pelo respiradouro do alçapão, nos dá a certeza de que acertamos.
É quando estamos voltando para o resto do pelotão que começa a chover, uma garoa fina e gelada, que logo se transforma num aguaceiro. Maldito lugar, quente, úmido e cheio de insetos. No meio da floresta vejo uma criatura atrás de uma árvore, de aparência bestial, como que saída de meus piores pesadelos, com tentáculos a brotarem de sua cabeça, asas membranosas e vários olhos. Foi só por um instante que eu vi tal criatura e ela logo desapareceu da minha frente num piscar de olhos, mas foi o suficiente para me deixar aterrorizado. Percebo que ninguém mais do pelotão viu a coisa, e com medo de parecer paranóico e medroso pelos outros, acabo concluindo, depois de uma varredura pela mata, que foi só minha imaginação. E foi enquanto permanecia pensando sobre a visão que Rogers me chamou a atenção e eu pude aos poucos focar minha mente para a trilha que deveríamos percorrer, logo depois do chamado do tenente.
Seguimos novamente pela trilha coberta de mato, com Rodrigues à frente prosseguindo a golpes de facão.
Logo chegamos a uma aldeia escondida na floresta. Todos os habitantes das pequenas casas de palha permanecem escondidos, espiando-nos das frestas de suas janelas. Prosseguimos procurando por soldados inimigos nas cabanas sem encontrar nada de suspeito além de um porco grande que assustou Vásquez de maneira que atirou com raiva no pobre animal. O aguaceiro dá uma trégua e para tão repentinamente como havia começado, dando lugar ao coaxar de muitos anfíbios. Sob a luz de uma lanterna, o tenente verifica mais uma vez o mapa enquanto nos sentamos e Vásquez tenta chamar a atenção dos aldeões com uma barra de chocolate, em vão.
O tenente e o sargento, depois de nos deixar fazer uma rápida refeição em nossos enlatados de ração, nos põem a caminho novamente. Partimos da aldeia e, depois de andar com cuidado por mais alguns quilômetros, damos de cara com uma patrulha dos soldados vietcongues. Eles nos pegam de surpresa, e mais alguns dos nossos são atingidos.
Em meio ao caos de gritos e tiros para todo lado, corro para sair do campo visual dos congs, caio em um barranco amolecido pela lama trazida pela chuva e sinto uma imensa dor. Acho que quebrei uma perna na queda. Fico ali esperando por algum tempo enquanto começo a sentir a dor aumentar até se tornar quase insuportável. Com receio de chamar o médico durante a troca de tiros, aguento como posso.
Depois de alguns minutos que parecem uma eternidade, o silêncio toma conta da selva. Devagar, me ergo de meu esconderijo e rastejando procuro por meus companheiros do Charlie. Enquanto prossigo dou de cara com um corpo à minha frente. É Rogers. Ele parece estático, e depois de chamar por ele sem resposta, dou-me conta de que está mesmo morto.
Há outros corpos dos soldados de meu pelotão espalhados próximo de Rogers. Dois vietcongues mais a frente reviram os bolsos e mochilas dos soldados mortos em busca de cigarros e chocolate sem notar minha presença. Parece que a patrulha cong foi embora, deixando para trás alguns soldados. A dor em minha perna quebrada me impede de partir para cima dos congs. Finjo-me de morto, e espero que venham até mim. Então, projetando-me em um salto, equilibrado pela perna boa e dominado pela adrenalina, ataco os dois congs desavisados, com minha faca, um após o outro.
O sargento e o tenente jazem mortos assim como todo o restante de nosso pelotão. Evitando ser descoberto por mais congs, rastejo para o mato. Se der sorte talvez consiga chegar até o helicóptero no ponto de encontro.
Deixando para trás aquele ninho de congs, improviso um torniquete na perna e, mancando, atravesso a floresta, percorrendo o que parece ser a trilha pela qual o tenente nos levava. É quando dou de cara novamente com aquela criatura aterrorizante, que me encarando com seus olhos vermelhos, parece acenar para mim o que parece ser um tentáculo. Atiro na criatura, mas ela apenas se desfaz sem deixar vestígios. E eu penso que talvez tenha ficado maluco. Entretanto, na penumbra da noite abafada eu escuto um murmúrio que parece com um disco arranhado. Nesse momento, dominado pelo cansaço e pela dor, lembro de minha casa na fazenda em Montana e fico com receio de ter mais uma visão causada pela tontura.
Nesse meio tempo o líder da patrulha vietcongue já notou os dois congs mortos que estavam pilhando os cadáveres, e eu escuto as vozes me procurando em meio a gritos e tiros. Tenho pouco tempo, sinto a visão começar a faltar. Fico apavorado. Parece que escuto ao longe um leve ruído de hélices do helicóptero. Nesse meio tempo, antes de escurecer a visão aos poucos, tenho mais uma alucinação da estranha criatura. Atiro naquela figura saída de pesadelos como um louco, e é quando me vejo cercado por armas dos congs. Num ato desesperado, sabendo ser esta a minha última ação ainda vivo, atiro para todos os lados com um brado de guerra.
...
No estreito corredor comprido da nave de excursão invisível pela camuflagem, uma criatura que estava discursando para uma platéia atenta, nota a ausência de uma das “crianças”. Vasculhando entre o grupo com seus três olhos vermelhos, vê o pequeno Zaar debruçado sobre os controles da imagem tridimensional que ocupa todo o espaço em volta.
- Mocinho, quantas vezes já disse para não mexer em nada, estamos aqui apenas para observar as criaturas, não devemos nos mostrar a eles, sabe-se lá o que pode pensar uma mente primitiva como dos terráqueos se nos virem ou à nossa nave camuflada, enquanto são estudados. Saiba que eles são selvagens e muito perigosos.
A criatura chamada Zrum apaga os controles de projeção de imagem holográfica, enquanto observa no monitor um soldado gritando em meio a uma guerra. Ele dá de ombros e, esticando seus tentáculos, segue em frente para terminar esta visitação no planeta Terra.
- Tsc, tsc, são tão primitivos esses humanos.
Fim