Desejos Malignos - Parte 2 (Parte Final)
Parte 2
Abruptamente suas mãos largaram o pescoço da jovem. Ele não sabia o que estava fazendo, nem porque estava fazendo aquilo. A única coisa na qual ele tinha certeza é de que naquele momento eles não estavam sozinhos. Havia mais alguem naquele quarto.
Ambos estavam estáticos. Ela inconsciente, com a respiração fraca, lutando inconscientemente pela vida. Ele admirado e assustado, vislumbrando o limiar da vida e da morte. Vislumbrando o poder de Deus.
Uma baforada e vapores saíram de sua boca. A temperatura baixava drasticamente quando ele escutou um ruído. Não era um ruído qualquer, era uma respiração! Uma respiração ofegante que vinha diretamente de suas costas. Rapidamente então ele se afastou e se deparou com uma criatura.
A criatura lhe era por demais familiar, e por isso foram necessários alguns segundos até que sua mente assimilasse as coisas. Assimilar que a criatura ao qual ele observava era ele próprio, porém ligeiramente com suas particularidades. Em suas mãos cresciam garras e em sua testa chifres. Seus braços eram recobertos por uma espécie de escama e seus olhos brilhavam uma luz rubra terrível.
A criatura então falou com ele. Não com palavras, não com a boca. Isso seria algo por demais humano, e aquele que se mostrava a sua frente não era um simples macaco evoluído. Aquele era a estrela da manhã. O anjo mais belo que já fora o preferido do senhor e que fora abandonado por seu pai para por fim ser renegado aos domínios inferiores. Aquele era Lúcifer.
Poucas são as pessoas que suportariam se defrontar com tais visões. Dessas poucas, a grande maioria se encontra internada em grandes hospitais, presas a camisas de força e camas reforçadas. Ele porém não era louco e nem era um fraco para sucumbir ante a visão.
Lúcifer, o próprio anjo da luz estava diante dele. Em sua mente ele escutava a melodia angelical que lhe dizia que sua mãe não estava morta. Não, apenas sua missão na Terra havia sido cumprida e que agora ela havia retornado ao seu lar no inferno, assim como ele faria ao completar a sua própria missão.
Sua mente estava confusa. Afinal, o que era essa missão? Ele era apenas um homem comum, com uma vida comum! Lúcifer riu e pediu para que ele não fosse tolo. Ele não era apenas um homem, ele era o escolhido dos reinos inferiores. Ele deveria comandar as forças do inferno em direção a vitória final. Ele seria o destruidor do trono de São Pedro e o restaurador do império!
Seu coração lhe dizia, e sua alma confirmava. Tais palavras eram a mais pura verdade. Agora ele entendera porque sua amada mãe obrigara a perder tantos anos de sua juventude enfurnado em atividades religiosas que ele nunca cumprira. Não era o seu desejo converte-lo a deus! Sua intenção era propiciar ao rapaz o maior quantidade de conhecimento possível sobre o inimigo, para que este pudesse enfrente-lo quando chegasse o momento, e bem, aquele era o momento!
Lúcifer sorriu. Ele dizia diretamente na sua mente: Traga as as suas tropas para este plano. Abra os portões do inferno e inicie a nova era da humanidade! Visões apocalípticas passaram então por sua mente.
Por fim ele escutou em sua mente: Sangue! Sangue é a chave para os reinos de fogo e dor! Ele olhou para a garota cujo semblante demonstrava claramente ter conhecimento prévio de seu papel naquele jogo. Portanto aquilo era o que devia ser feito e seu sangue seria o primeiro a ser utilizado.
A cama onde ambos faziam amor, agora se transformara em um altar. O sangue fluía como um rio por entre o piso do quarto. “Mais”, ele ouviu em sua mente. Eram necessários mais trinta e dois corpos, mais trinta e dois escolhidos para que os portões se abrissem. Isso porém não seria difícil, pois ele passou a convidar os vizinhos da jovem, a se tornarem peças fundamentais naquele jogo sobrenatural que ocorria. Feliz ele constatou que todos os vizinhos, sem exceção, aceitaram o convite de bom grado.
Trinta e três corpos prontos. Era hora de os arrumar no altar, e os marcar com os devidos símbolos arcanos. Isso consumiu tempo, todo este muito prazeroso. Lúcifer por fim o convidou a contemplar o nascer do sol, e com ele o inferno que se ergueria por sobre a terra.
Enquanto aguardava, ele pensava orgulhoso. “Mãe. Honrei tua vida. Honrei teu nome. Honrei tua missão!”. Minutos então se passaram e o sol se ergueu. Com ele veio o inferno.
O inferno porém não eram harpias voadoras, gárgulas e outros demônios. O inferno chegou em forma de carros da policia que cercavam o prédio, e homens da elite que invadiam o apartamento. Desesperado ele olhou para Lúcifer, que já não estava mais lá. Em seu lugar havia apenas um espelho e um cabide com fantasias velhas.
Desesperado, ele ficou olhando a sua criação... “mas então...”, ele pensava.
Um tiro fora disparado em seu peito. Fulminante.
Antes de cair porém ele então começou a gargalhar, e nos seus últimos instantes de vida ele finalmente entendeu toda a verdade. Não havia Lúcifer, não havia o inferno. Havia apenas um homem que descobrira tardiamente que a morte era o verdadeiro prazer da vida.