DESEJO DE EPIFÂNIA
Quando abriu os olhos, Epifânia sentia prazer.
Na sala envolvida numa penumbra macia, deitada nua, a pele molhada da moça tocava uma fina chapa de zinco.
Gradualmente, como se pela primeira vez, se deu conta da companhia do seu Benfeitor. Os passos dele eram ocas batidas de borracha em madeira.
Nessa atmosfera cardíaca, ele contorna a mesa e umedece os lábios dela com uma esponja umedecida em vinagre levemente ácido. O prazer aumenta, Epifânia geme.
Dois grandes grampos, interligados por um mesmo fio condutor, alongam os dedos indicadores bastante finos dela. O Benfeitor asperge delicadamente fina camada de água e óleo perfumado. A mistura recobre mais uma vez o corpo nu.
O perfume dele envereda por estreitas passagens na mente dela.
Outro fio conecta os calcanhares mas não há prendedores. Agulhas imantadas, fincadas na pele mais áspera, conduzem a eletricidade. O bronze das agulhas tinem à meia luz que evapora.
Epifânia suspira, afoga-se nessa densa matéria mais leve que éter.
O Benfeitor nada fala, circula capturando o instante. Toca o rosto, a branca tez. Epifânia desfalece vibrando, um brilho intenso no olhar fagulha. Crespam nos olhos do Benfeitor outra luz, são ondas letárgicas, sensações prolongadas de agonia e prazer.
Ardor extremo não se conhece.
Os grandes lábios avermelhados entreabertos e mais úmidos a cada instante recebem outras agulhas, os dentes do Benfeitor.
Ali, o beijo sangra micro rupturas porque conduzem energia.
O prazer intenso obnubila a vida pensada, a vida que poderia ter sido...
Epifânia não pensa, morre desejando outro beijo e mais nada.
Quando cerrou definitivamente os olhos, ainda sentia.
*
*
Baltazar Gonçalves