O Encontro no Cemitério
Apesar de ser componente de uma família numerosa vivia isolado.Era comum estar no quarto-que apesar de ser coletivo-tinha as horas de solidão que aguardava.Vivia ás vezes por entre os arbustos e árvores do vasto quintal da casa,como de costume lendo livros ou gibis. Apesar de possuir singela beleza física não era comum estar enamorado,ou falando de mulheres,com os poucos amigos que cultivava.Jogava futebol-era o seu esporte predileto.Mas, o seu grande lazer era a leitura de livros.Lia quase de tudo,até mesmo livros de conteúdos da medicina e os contos de terror ou policiais,de autores quaisquer-Não lia o que apontava a mídia,ou a febre literária.
Observava o bailhado das borboletas quando no quintal.O canto dos pássaros,e até as visitas dos pombos que funçavam o lixo residencial.
- O que está fazendo? O almoço está pronto.Venha almoçar.
Era interpelado pela sua mãe quando desaparecia-ela sabia onde encontrá-lo.
Era fácil encontrá-lo quando usava o quintal como refúgio.Havia descoberto outro local.Era mais deserto e de extrema solidão.Era o cemitério que ficava a duas quadras de sua casa.
Entrava ali no fim de semana,no sábado,preferencialmente-ficava ali por toda a madrugada.Levava uma luminária que era acoplada no piso de uma lápide.Lia um livro.Olhava histórias em quadrinhos.Tinha os mortos por companhia.O silêncio da madrugada de sinfonia.
Agora,podia observar que os morcegos bailhavam por entre as tumbas e árvores.O vento açoitava os galhos.Jamais imaginaria que uma coruja velha caçava pequenos ratos por entre as covas.
¨Não gosto de viver.Não gosto da vida."
Os adolescentes de sua rua gostavam de namorar,fumar maconha e tomar cerveja.Ouviam a grande merda da música da Bahia.Mantinham-se alienados do desastre da política praticada no país.Sabia da irresponsabilidade com a educação,feita sem qualidade alguma.Parcos investimentos no ensino superior,na reciclagem dos mestres e na pesquisa. Prédios escolares de duvidoso conforto.Mestres mal pagos e nada treinados na arte de educar.As adolescentes querendo apenas mostrar a bunda,enquanto se esquecem em desenvolver o intelecto.
"O meu pai se preocupa mais em pagar as contas da família do que o carinho com os seus.¨
optemperou para os seus botões.Naquele noite levou um litro gelado de vinho barato e um copo descartável.Sorvia fartos goles gelados.Tinha consigo um livro de contos de terror que falava de vampiros.
¨Pagamos muitos impostos.A vida fica muito cara.trabalhamos para pagarmos impostos para sustentar uma burguesia política que so sabe gastar e leva vida de altos burgueses.¨
Não queria viver num país desse.Então decidiu:
"Vou me matar.¨
Tinha a certeza de que os amigos não lhes davam alegria,bem menos a família.A escola não o deixava satisfeito-logo ele que buscava o enriquecimento intelectual,e se deparava com professores idiotas,alienados-,alguns que promoviam os secretários de educação que pretendiam tirar proveito do alunato para fazer uma carreira política mais ampla.
"O carnaval não é uma festa popular e cultural é o desfile dos idiotas,alienados.Estúpidos e ignorantes que a política faz o que quer.¨
Ele custava a aceitar que um povo sofrido e tão desprotegido pelos poderes públicos,sabendo que chegariam ao fim do ano com mais de 50 ooo assassinatos por armas de fogo tivesse disposição para fazer em fevereiro o carnaval.Custava a acreditar que o mesmo povo que ao procurar o atendimento médico num hospital público ou numa UPA morresse sem ter o atendimento devido,e em fevereiro pensasse em carnaval,sem a mesma disposição para cobrar dos poderes públicos mudanças.
"A marcha da maconha quando marcada aparecem milhares de jovens.Quando se marca um protesto político não aparece ninguém,e quando se vê na tv uma grande multidão num protesto político,ali estão os mascarados contratados por um copo de refresco,um cachorro-quente e mais R$50,00 pelos que estão no poder. O país em que vive custa pouco para eles.
-Ola,como está?
Soou a voz sombria às suas costas.Pensou que estava sozinho.Era uma noite escura e de calor infernal-
-Quem é você?
O estranho não se identificou,Olhou-o com um olhar de intenso brilho que lhe passou tranquilidade.
- Não temos na Terra um paraíso,e se quer existe esse paraíso num Brasil,que é um país atrasado e se situa numa América latina que entrou para a história da humanidade,como um continente de ditaduras e de tiranos do poder.
-Eu sei disso.Não quero viver na merda.
-E o que pretende fazer?Acha que nos demais países é diferente daqui?
-Claro que não.As correntes políticas do mal funcionam em cadeia.
-E hora de ir,vamos.Existe uma coisa que precisava descobrir e não se deu a chance.
-O quê?
-Deus está no comando.Esteja o mundo como estiver.E todo esquema oferecem fissuras,onde se pode sobreviver sofrendo menos.
-Poderei descobrir as fissuras.
-Agora é tarde.O que pensava de Deus?
Não cultivara uma religião.Via a vida religiosa com desprezo.Mais uma forma de dominação e de exploração econômica.A sua resposta foi seca:
- Acho que era ateu...depois fui descobrindo que Deus pode existir,sim.Mas parece não estar muito preocupado conosco...
-Quando desacreditamos numa força maior do que a dos homens seguimos para uma ruína sem fim...
-Mas estamos numa ruína sem fim.O mundo acabou.Temos forças maiores do que o nazismo,temos de volta o comunismo assassino-o que domina tudo,empobrece,mata,escraviza.
-Não temos mais tempo.Vamos.
-Como assim?Vou para minha casa.A madrugada extrapolou.Minha mãe deve estar acordada me esperando chegar.
O estranho enlaçou-o com um dos braços e o levou por entre as muitas covas,por ali existentes.A coruja os sobrevoou.Os morcegos desenvolviam um bailhado nervoso em volta deles.Os santos de estátuas pareciam vigiá-los.Para sua surpresa havia uma cova recente,muito bem cuidado com flores frescas depositadas ali.Uma foto trazia o seu rosto jovial.O estranho lhe resenhou,com ponderação:
-Houve precipitação de sua parte em descobrir que não morremos,e que a vida quando apresenta dificuldades não devemos oferecer uma fuga,mas a luta incansável.A morte não existe,perdemos,apenas o corpo físico.