O túnel

Me lembro de estarmos em frente ao velho túnel abandonado, onde ninguém se aventurava a entrar e muito menos deixar seus filhos pequenos se aproximarem.

Mas eu e meu grupo de amigos éramos destemidos, queríamos descobrir o que havia de tão misterioso naquele túnel. Tudo o que sabíamos é que todos tinham medo de se aproximar daquele local.

Era um sábado, o sol estava muito quente e todas as pessoas da vizinhança estava entretidas com os preparativos de uma quermesse da igreja.

E foi então que nos aproveitamos, nos reunimos e fomos discretamente até o túnel.

Eu, mais dois amigos e uma amiga. Tínhamos entre 14 e 16 anos. Eu era o mais jovem e líder do grupo e mentor das ideias que nem sempre saíam como nós queríamos.

Perguntei se estavam com medo. Eu estava.

Eles responderam que sim, mas que queriam descobrir o que havia além do túnel.

O túnel dava a impressão de que não era usado há muitos anos. Todo coberto de mato, e ficando em total escuridão conforme ia sumindo pela distância.

Eu senti que não devíamos entrar ali, mas era tarde demais, eu não podia amarelar naquele ponto da aventura.

Tomamos coragem e caminhamos em direção ao túnel, mas antes de entrarmos nele realmente, uma voz nos chamou. Olhamos para trás e vimos um senhor já bem velho.

Usava uma roupa muito velha e bem gasta, estava barbado e sujo.

Na hora nos pareceu ser apenas um mendigo.

Com uma voz rouca e cansada ele disse:

-Não entrem no túnel. Voltem e vão para casa. É o melhor que vocês tem a fazer. Não entrem!!

Ao mesmo tempo em que ele parecia real, parecia também uma visão, um ser imaginário.

Nos assustamos com essas palavras e nos olhamos um para os outros com medo. Mas quando olhamos novamente para onde o homem estava não havia mais nada lá. Ninguém.

- E aí? Ainda vamos entrar? Perguntei.

Silêncio...

- Sim, vamos. Alguém falou. E fomos, devagar, com medo.

Na verdade sabíamos que deveríamos ter seguido o conselho do velho senhor. Infelizmente sabíamos mas entramos.

A cada passo a escuridão ficava mais intensa, mesmo com as lanternas que havíamos levado.

E de repente elas se apagaram nos deixando na escuridão total.

Nos seguramos uns nos outros e continuamos seguindo. Nunca sentimos tanto medo como naquele dia.

Não dá para descrever aquilo, não em palavras.

Começamos a andar sem rumo, não sabíamos para que lado estávamos indo e o túnel que parecia estreito visto de fora, agora parecia um enorme salão, um grande espaço aberto.

Começamos a ouvir vozes ao fundo, que pareciam vir de bem longe. Lamentos, gemidos, choros abafados.

Eu não podia me desesperar pois sabia que meus amigos confiavam em mim e entrariam em desespero também, mas eu sentia que algo muito errado estava acontecendo.

- Vocês estão vendo algo? Um dos meus amigos perguntou?

-Nada. Só uma escuridão. Foi a resposta.

Mas não era a verdade. Havia mais alguém ou algo lá dentro.

Dava para sentir, para ouvir uma respiração baixa, um odor estranho. Nunca soube o que era, mas havia algo naquele túnel ou o que fosse aquilo.

Tive a sensação de que andamos por horas sem encostar em nada, era como já falei, um espaço enorme sem paredes, sem nada em que pudéssemos bater o sentir.

Exaustos. Sim, estávamos exaustos.

- Vamos nos sentar. Falei. Nos encostamos um no outro para descansar um pouco.

E assim fizemos. E Ficamos ali por algum tempo sem falar uma só palavra.

Me lembrei do homem lá fora. Quem era? Ele teria entrado alguma vez ali? Teria conseguido sair?

Mesmo através da escuridão me pareceu ver algo na minha frente. Vultos. Grande vultos pareciam andar de um lado para o outro. E Pareciam nos olhar.

- Vamos. Eu falei já me levantando.

- Pra onde? Perguntaram.

- Sair daqui. Agora.

Voltamos a caminhar sem rumos. Estávamos chorando agora. Mas era preciso sair. Ficar parados não ia ajudar.

Senti a alguma coisa roçar em meus braços, parecia um tecido. Algo suave.

- Todos bem? Perguntei.

Todos responderam sim.

Continuamos caminhando em linha reta até a exaustão.

As vozes pareciam mais intensas agora, mais próximas, mais reais.

- É para o outro lado. Eu disse.

- Vamos.

Certifiquei-me de que todos haviam virado para o mesmo lado. E que estavam uns segurando nos outros e começamos a andar mais depressa.

Pude sentir que algo se arrastava em nossa direção.

- Vamos. Mais rápidos.

Num período de tempo que nos pareceu uma eternidade avistamos uma luz bem franca em um ponto bem distante.

Eu sabia que era a entrada do túnel, enfim, estava lá.

Estávamos muito cansados e com medo, mas não podíamos parar, a saída estava na nossa frente, bem distante mas estava lá.

O alívio tomou conta de nós ao nos aproximarmos da saída.

Ao sairmos com dificuldade através do mato agora mais fechado do que quando entramos, tudo estava escuro, a noite havia chegado.

Íamos levar uma bela bronca por ter deixados todos preocupados com nosso sumiço com certeza.

Caminhamos e entramos na vila mas algo estava diferente. Tudo parecia estranho. Era como se o tempo tivesse passado. As casas pareciam bem antigas, e haviam muitas coisas de que nem nos lembrávamos.

Algo havia acontecido, só não sabíamos o que era.

Corri para minha casa e bati na porta. Não tinha noção de que horas eram, mas como as ruas estavam vazias e as casas apagadas, devia ser muito tarde.

Meus amigos foram juntos comigo.

Bati mais 2 vezes, quando notei que alguém se aproximava para abrir a porta.

Um senhor abrir e levou um susto dando um passo para trás.

Também levei um susto, pois aquele homem era meu pai, mas estava muito mais velho. Ele ficou me olhando ali, imóvel, parecendo que vira um fantasma.

Quando conseguiu falar, chamou pela minha mãe.

Levei um choque quando vi aquela senhora que era minha mãe se aproximando. Era minha mãe, mas estava como meu pai, muito mais velha.

E como meu pai também ficou nos olhando, parecendo estar aterrorizada.

- Pai? Mãe? O que houve?

Eles se afastaram mais ainda. O medo estava em seus olhos.

Meu pai olhou nos com medo e surpresa.

- Não é possível. Não é...

Onde vocês estavam crianças?

Comecei a chorar. E meus amigos também. E começamos a nos desculpar.

- Desculpe pai. Nós só entramos no túnel e nos perdemos. Desculpe.

Eles ficaram ali nos olhando. Houve um silêncio sepulcral.

Minha mãe se aproximou de nós, tocou em meu rosto.

- Filho, crianças...sabemos que vocês entraram no túnel.

Mas isso...isso aconteceu há mais de 20 anos...

Eles se afastaram e fecharam a porta devagar.

Ficamos na rua. Estamos na rua.

Nas madrugadas rondamos as casas.

Algo aconteceu naquele túnel e ele ainda está lá, aberto, nós sempre tentamos avisar as pessoas para não entrarem, mas elas quase sempre não dão atenção.

Paulo Sutto
Enviado por Paulo Sutto em 29/01/2016
Código do texto: T5527417
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