A CRUZ DE ANINHA

A CRUZ DE ANINHA.

GAMA GANTOIS

Esta história é pra quem tem nervos de aço. Se você não está incluído nesta categoria, por favor, não leia. Vamos aos fatos:

Pery nascera no Maranhão naquele bolsão de miséria. Negro, muito pobre, resolveu tentar a sorte na cidade maravilhosa. Achava ele que no Rio de Janeiro sua sorte iria mudar pra melhor. Como não tinha dinheiro pra trazer a família veio só, com a promessa que assim que arranjasse algum emprego mandaria buscar todo mundo.

Sozinho sem apoio de ninguém, de um amigo ou parente numa cidade cosmopolita, eivadas de problemas, não seria nada fácil arranjar emprego. Assim, foi morar na favela do Leme, num quarto úmido, escuro ao lado da boca- de- fumo. Vivia de biscate que de vez em quando arranjava. Desesperado e sem amparo dos governos, Municipal, Estadual ou Federal, caiu no vício das drogas. Da maconha inicial passou para a cocaína. O dinheiro que já não era muito começou a rarear. Pery se entregou a prática dos pequenos delitos. Assaltava idosos a porta dos bancos, CDs, MPs, estepes,de carros estacionados enfim, tudo que pudesse lhe dar alguns centavos para sustentar o seu vício. Até que caiu nas malhas da lei. Cumpriu pena num presídio do Estado, por um ano. Ao ser posto em liberdade começou a pensar em mudar de vida, pois, se voltasse delinqüir sua pena seria pesada.

Estava cismando quando passava pela porta do cemitério São João Batista. Nesse momento, uma idéia funesta lhe passou pela mente. O São João Batista, era cemitério dos ricos, portanto, ali poderia ter bastante material pra roubar, como cruzes, santos, letras de bronze. Os mortos não precisavam de riqueza que valeria uma fortuna no câmbio negro. Precisava apenas, reconhecer o terreno. Assim, percorreu as alamedas e ficou encantado com o que viu. Para maior segurança o roubo deveria acontecer á noite. Assim foi. Durante muito tempo o plano de Pery foi sucesso absoluto.

Ele passava lá durante o dia, escolhia o túmulo e á noite, por volta das 23h00 min. voltava fingindo ser parente ou amigo de um defunto que estava sendo velado.

Havia uma porta lateral que ligava as capelas ao campo santo, por onde passavam os féretros que levariam os corpos para serem enterrados. Era por ali que Pery passava pra assaltar os sepulcros.

Certo dia, como sempre acontecia Pery foi ao cemitério escolher o local do assalto. Descobriu um túmulo onde havia uma bela e enorme cruz de bronze. Pensou!. Este, vai me dar um bom dinheiro. Examinando bem jazigo viu que havia três retratos, todos com data de nascimento e de morte. Um retrato lhe chamou atenção. Era de uma jovem chamada Ana Maria de Albuquerque e Silva. Esta moça tinha falecido com 15 anos de idade. Pery olhou retrato e sentiu uma pena profunda da moça. Quinze anos não é idade pra se morrer, pensou.

À noite Pery estava de volta. Munido de um pé de cabra e de uma lanterna de bolso, lá foi ele em direção a sua próxima vitima. Como sempre o cemitério estava escuro como breu. O silêncio era tão profundo que Pery podia ouvir a batida do próprio coração. Lá ia o nosso personagem caminhando quando ouviu passos vindos da sua retaguarda. Muito assustado, pois, isto nunca tinha acontecido, foi virando o rosto lentamente. O que viu o fez ficar transtornado. Estava sendo seguido por um casal. Ela toda de branco, ele todo de preto. A principio pensou tratar-se de casal de assaltante de túmulos como ele. Olhando melhor logo percebeu que eles não eram desse mundo. Pery começou a correr. O casal também. Nisto Pery tropeçou caiu batendo com a cabeça no chão, perdendo os sentidos.

Despertou pela manhã quando o sol já ia alto. Fazendo um reconhecimento do local percebeu que estava próximo ao túmulo que ia roubar. Pra não perder a viagem resolveu praticar a pilhagem naquele momento. Meteu o pé de cabra na cruz que saiu com certa facilidade, guardando-a na sacola que levava pra esconder o produto do roubo. Olhando para as fotos, percebeu que aquele túmulo pertencia a mulher vestida de branco e do homem de preto. Sentiu um calafrio a percorrer todo o corpo. Algo lhe dizia que deveria deixar a cruz no lugar onde ela estava, mas, o vício falou mais alto.

Quando começava a andar na direção da saída, ouviu claramente alguém chamá-lo:

-Moço, essa cruz é da Aninha!.

Pery olhou pra todos os lados e nada viu. Continuando a sua jornada tornou a ouvir.

_ Moço, essa cruz é de Aninha!.

A voz lhe foi seguindo até a sua casa. Não parava um segundo. À noite não lhe deixou dormir. Pery estava desesperado. A voz continuava a martelar seus ouvidos. Pela manhã já beirando a loucura Pery voltou ao cemitério colocando a cruz no seu devido lugar. Imediatamente deixou de escutar a voz.

Pery nuca mais voltou ao cemitério para roubar. Aprendeu a lição de que os espíritos estão sempre a nossa volta.

Gama gantois
Enviado por Gama gantois em 21/12/2015
Reeditado em 30/01/2016
Código do texto: T5486680
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