UMA FAÇA ENSANGUENTADA, UMA TRILHA DE SANGUE E UMA JANELA QUEBRADA [Especial Halloween]
Era dia das bruxas e na cidade de Younghills, assim como em todo o país, as crianças preparavam suas fantasias junto com os pais, Andrea e Denzel não conseguiam entrar em consenso, sua mãe comprou fantasias ridículas de Chewbacca e Darth Vader e os dois tentavam transformá-las em alguma coisa melhor com a ajuda do irmão mais velho Tyler, quando da janela do quarto algo lhe chamou atenção.
— Puta merda! — Tyler disse ao perceber que um carro parara em frente a casa velha que um dia havia pertencido aos Weber, ninguém morava lá há anos.
Os dois pequenos correram até a janela para espiar junto do irmão a novidade do dia.
Um homem forte, robusto de cabelo lambido descera do carro sozinho, o caminhão da mudança chegou em seguida, já começava a escurecer quando começaram a tirar suas coisas do caminhão e pôr para dentro da casa. Andrea e Denzel voltaram a trabalhar em suas fantasias, não parecia haver nada de mais em ter um novo vizinho e Tyler começava a pensar o mesmo até ver dois homens carregando um caixão.
— Que porra é essa?! — Resmungou e o vizinho olhou em sua direção no mesmo instante, como se tivesse ouvido.
Tyler fechou as cortinas rapidamente.
— Tyler James Watson! Quantas vezes eu vou ter que falar para você não dizer palavrões na frente dos seus irmãos? — Sua mãe disse aparecendo de repente cheia de sacolas.
— Foi mal mãe.
Estava tão distraído que não a tinha visto chegar.
— Vá até o carro e me ajude com as sacolas. — Ordenou.
Tyler foi até o carro com sua mãe, Lucy, ela havia comprado muitas abóboras, doces e outras coisas para o jantar e decoração do Dia das Bruxas, teriam que carregar tudo aos poucos, Tyler já havia levado quase tudo quando voltou ao carro e pegou sua mãe conversando com o novo vizinho.
Parou para observá-la.
Ele se movia como alguém incrivelmente sexy, estavam flertando?
Podia apostar que sim. Precisava intervir, mas aquele homem não era normal, ele lhe metia medo.
—Tyler! Não fique parado aí, venha me ajudar. — Ela gritou e o homem esquisito o encarou erguendo as sobrancelhas e um sorriso no rosto que estava longe de ser simpatia.
O jovem atravessou o gramado até o carro olhando para o chão, não queria encarar aquele homem, sua mãe continuava flertando com ele.
— Não seja mal-educado, cumprimente com o Sr. Johnson!
— E aí? — Tyler disse ainda sem encará-lo.
— É um prazer conhecê-lo Tyler, Lucy querida, me chame apenas de Matthew, já somos bons amigos e ainda somos jovens demais! — Disse o vizinho com uma voz incrivelmente sedutora, tanto que até o próprio Tyler teria se apaixonado.
Sua mãe riu com as bochechas vermelhas, mas o garoto a cortou.
— Então você tem um caixão de verdade... — Tyler disse e examinou sua reação.
— Tyler não seja indiscreto! — Lucy o repreendeu ainda mais vermelha.
— Não tem problema. É claro que tenho rapaz, afinal é Dia das Bruxas e eu gosto de comemorá-lo à risca. — Explicou.
Irritado, Tyler pegou a última abóbora e saiu dali, mas antes de chegar na cozinha ouviu sua mãe encantada dizer:
— Por que não vem jantar conosco Sr. Johnson... quer dizer Matthew?
— Será um prazer imenso. — Ele respondeu.
A abóbora caiu no chão e espatifou-se.
Às oito e meia da noite, Lucy havia conseguido esculpir as abóboras e espalhá-las por toda a varanda, dentro de casa também estava tudo perfeito, fumaça artificial pelo chão, luzes oscilantes, teias de aranha falsas e muito ponche cor de sangue.
No quarto Tyler compactuava com os irmãos. Eles não puderam cortar as fantasias de Star Wars, pois haviam sido caríssimas, então vestiram-nas, Tyler se limitou a usar uma faca de verdade e uma máscara do Jason. Espiaram da janela, o vizinho chegaria logo.
— É o seguinte, vocês vão ser amáveis com o tal Matthew, assim vão me dar cobertura, ligarei o chuveiro e fingirei que estou no banho. Mamãe sabe que eu demoro no banho, então vou sair pela janela e vou até a casa dele para descobrir tudo que eu puder, fiquem de olho nele, se o vizinho for a qualquer lugar da casa, sigam ele, até no banheiro se for preciso. E se por algum motivo ele decidir voltar para casa, vão até o meu quarto e pisquem a luz várias vezes sem parar. Entenderam? — Tyler disse nervoso, temia que os irmãos pequenos botassem tudo a perder.
— Sim. Eu entendi. — Disse Denzel.
— Eu também! — Andrea confirmou.
Tyler sorriu para os dois, o suor frio escorria por sua testa.
— Ele está saindo, protejam a mamãe e não esqueçam do plano. — Tyler disse e entrou no quarto, observou da janela o vizinho saindo de casa, não trancou a porta. Ótimo!
A campainha soou pela casa, assim que ouviu o ranger da porta da
frente, abriu a janela e se aproveitou da árvore para descer. A rua estava escura, a vizinhança toda decorada e as ruas cheias de gente, não havia perigo real. Ou havia? A casa do vizinho era a mais sombria, por mais que as outras tentassem parecer assustadoras, eram apenas alegorias do dia das bruxas, enquanto a que Tyler acabara de entrar era como o túmulo de um demônio, ninguém devia entrar e quem entrasse... não devia sair.
Tirou a máscara do rosto e apertou os olhos para enxergar assim que fechou a porta, estava tudo escuro e empoeirado, na mão esquerda empunhara uma faca, continuou a explorar a sala de estar, não havia nada, estava vazia! Como pode? Ele viu o caminhão de mudança, viu alguns móveis, como podia a sala estar completamente vazia, exceto por ele e a poeira.
Passos na calçada, Tyler quase defecou na calça, batidas na porta, seu coração disparou. Deitou-se no chão e esperou que os visitantes fossem embora.
— Doces ou travessuras? — Alguém perguntou.
— Cala a boca idiota, não tem ninguém aí. — Outro disse.
Tyler os ouviu se afastar, mas deitado no chão ouviu passos ocos que vinham de um nível abaixo de onde se encontrava. Tinha alguém ali! Ficou de quatro, ajoelhou-se e saiu do caminho o mais rápido que pôde sem fazer barulho, andou até a primeira porta que encontrou, estava trancada, sua única opção era a lareira, ficava de frente para a porta, se espremeu ali e torceu para que quem quer que estivesse ali, não o notasse.
Os passos tornaram-se mais evidentes e logo ele viu a silhueta cruzar a sala até a porta, que se abriu, ela estava de costas para ele. Uma sombra negra, mas dava para perceber que era uma mulher, tão linda que o próprio tinha vontade de sair dali e beijar seus pés.
— Entrem queridos! — Sua voz doce disse, e os garotos entraram.
A porta fechou outra vez e os garotos seguiram a mulher para algum lugar. Por que não sentiam medo? Por que nem hesitaram em segui-la? Não importava, Tyler queria segui-la também, estava prestes a sair quando algo acima de si o perturbou, parecia algo se movendo pela chaminé, o que quer que fosse estava indo direto ao seu encontro.
Pôs as mãos na boca para não emitir qualquer tom que fosse, mas nesse movimento deixou a faca cair e fez um pouco de barulho ao bater no chão sujo de cinzas. O barulho ecoou e logo a mulher estava de volta ao cômodo, Tyler não sabia onde, mas ela estava bem perto.
Algo molhado pingou em seu nariz, uma gota, duas gotas, cinco. Logo algo escorria por seu rosto, ele tremia, não podia se mover. Estava próximo demais, em algum lugar na escuridão, sentiu um sopro quente em seu pescoço, um calafrio lhe dominou, não tinha como ter alguém ali, tinha? O espaço mal o cabia. Sentiu o sopro novamente e quase gritou, se preparava para olhar para trás, mas olhou para cima em vez disso, olhos vermelhos acenderam no escuro, algo tocou sua cabeça e antes que conseguisse pensar, foi puxado para cima.
De fato, Matthew havia sido adorável, mas quando ele saiu de lá, os gêmeos entraram em pânico, não conseguiram fingir, assim que o vizinho deu o fora, saíram correndo escada a cima, entraram no quarto e apertaram o interruptor até a lâmpada quase queimar.
— Vamos contar à mamãe! — Andrea apavorou-se.
— Não vamos não, sua estúpida. Vamos até lá ajudá-lo! — Denzel retrucou.
Sua mãe apareceu no quarto naquele instante.
— Ajudar quem? — Perguntou com a mão na cintura.
Estavam encrencados.
— O Matt mamãe! Vamos ajudá-lo a decorar a casa dele, está muito apagada... — Denzel mentiu.
Lucy sorriu, feliz pelos filhos terem gostado do seu novo pretendente, e concordou que eles fizessem o que quisessem, até lhes deu algumas abóboras. Ela não se fantasiou, se preocupou em limpar a cozinha enquanto seus filhos se divertiam lá fora.
Depois assistiu um filme de terror e caiu no sono no sofá mesmo, quando abriu os olhos já era dia. Alarmou-se ao perceber que dormiu demais, não lembrava de ter visto os filhos voltando para casa, correu até o quarto, Tyler estava enrolado na cama, foi ao quarto dos gêmeos, também estavam enrolados, se acalmou com a mão no peito, olhou pela janela para a casa de Matthew, dois homens carregavam um caixão para dentro do caminhão de mudança. Não havia mais vizinho.
Um medo, uma intuição tomou-lhe conta e só então resolveu checar os filhos, sentou à beira da cama e puxou o lençol devagar lá estavam dois corpos ensanguentados. Desesperou-se, pôs-se a chorar, mas ainda tinha esperança de que talvez Tyler estivesse bem, voltou ao quarto do jovem, ele não estava mais lá, havia em seu lugar uma faca ensanguentada, uma trilha de sangue e uma janela quebrada.
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