Circo dos Horrores
Nota da Diretoria do Hospital psiquiátrico de São Paulo.
"As informação que estão a seguir não são de responsabilidade deste hospital, visto que acreditamos que a narrativa foi composta por uma mente que não mais possui a sanidade necessária para ser considerada normal."
28/08/2015
Me pediram para contar a minha história, porém, antes de tudo, gostaria de alertá-lo, não creio que sou louco e se defender a verdade seja considerado um ato de loucura, então, somente nessas circunstâncias, serei louco até o final. Não sei o que te fez me procurar, quem te indicou e apontou minha história como curiosa o bastante para lhe despertar interesse e fazer você vir atrás de mim, nem me importo com isso, para mim o que basta é que escute minha voz e entenda minha versão.
Era fim do mês de novembro de 2013, um misterioso circo havia se instalado na cidade, anúncios haviam sido espalhados por diversos pontos estratégicos, bastava virar uma esquina em alguma rua qualquer que encontrávamos com facilidade um pôster anunciando o grande show que iria ocorrer naquele mesmo fim de semana, e eu, um jovem de apenas 20 anos, me programava junto com meus pais para testemunhar o grande espetáculo que o circo propunha à todos.
No dia estávamos pontuais e ainda lembro o fascínio que me invadia enquanto me aproximava e via a grande estrutura que o circo possuía, e quanto mais perto eu ficava, mais impressionado me sentia. Ao entrarmos fomos procurar um lugar para sentarmos e ficamos por lá até o show começar. Por dentro o circo não possuía muita coisa de impressionante, víamos apenas o poste onde os acrobatas deveriam fazer seus números e uma rede logo abaixo.
De repente as luzes se apagaram e um holofote se dirigiu ao mestre de cerimônias:
- Respeitável público, sejam bem vindos ao nosso show, que todos tenham uma boa noite e apreciem nossos artistas! Iremos abrir o show com a apresentação da nossa bela acrobata.
Logo a luz do holofote iluminou a acrobata já encima do poste, mas algo havia de errado, ela estava amarrada com braços nas costa e seu rosto estava em profundo sinal de desespero, rapidamente, uma mão saiu do escuro que havia nas suas costas e cortou-lhe a garganta, a acrobata caiu em direção ao chão, sempre seguida pela luz do holofote, e chocou-se na terra dura que se encontrava logo abaixo fazendo soar um baque horrível quando o atingiu, a rede que estava lá antes havia desaparecido. Após isso as luzes se apagaram e todos começaram a correr pelo medo que sentiam, tentei ir junto com a multidão sempre segurando as mãos dos meus pais para não nos perdemos, mas algo atingiu com força a minha nuca que me fez perder a consciência.
Acordei amarrado com os braços nas costas em uma cadeira, havia um intensa luz em meus olhos que me dificultava enxergar, mas algo dentro de mim dizia que eu ainda estava dentro no circo. Tentei me desamarra, mas foi em vão. Percebi que a luz nos meus olhos diminuíram de intensidade e reparei que havia uma cadeira na minha frente com uma pequena caixa surpresa por cima dela. Logo uma música começou a soar dela, que era mais ou menos assim:
"1, 2, 3, 4, isso aqui não é um teatro!
5, 6, 7, 8, corre, corre, jovem garoto!"
A caixa fez um estralo e um palhaço de brinquedo saltou de seu interior soltando uma risada terrível, mas não era um palhaço comum, ele estava com a rouba respingada de sangue e em uma das mão segurava uma faca. Tentei me soltar novamente, e dessa vez consegui, meus olhos já estavam um pouco mais acostumados e confirmei minha suspeita de que estava dentro do circo.
Quando me levantei, a luz do holofote saiu de cima de mim e iluminou uma porta que havia um pouco adiante, e eu, como atraído por alguma força magnética, fui em direção a porta. Ao entrar por ela vi que estava em uma extensa sala cheio de espelhos por todos os lados, no fim do corredor vi que havia uma pessoa, ela olhava para o chão e não produzia nenhum barulho, tentei falar algo:
- Oi, voc.. - não consegui completar a frase pois ela logo me atacou tentando me acertar com uma faca, mas desviei com facilidade e percebi, quando ela virou o rosto, que em lugar de seus olhos havia uma venda suja de sangue.
- Ele me disse que preciso mata-lo! - gritou a mulher
- Mas ele quem? - tentei falar, mas tomando cuidado para não ser atacado novamente.
- Não o conheço, acordei faz pouco tempo e já estava com essa venda horrível nos olhos e essa dor intensa, estou cega e creio que sem meus olhos, já perdi o bastante e não desejo perder também minha vida.
Ela tentou me atacar novamente, mas desvie novamente com facilidade, dessa vez avistei uma porta no final do corredor, como nada me impedia de ir até ela, deixei a pobre garota para traz prometendo a mim mesmo voltar para resgata-la. Logo entrei pela porta e fechei-a.
Estava em uma sala totalmente escura, algo rapidamente me chamou a atenção, uma pequena luz iluminava um malabarista e percebi, com grande horror, que os objetos que ele usava para fazer malabarismo eram pedaços de corpos humanos, do seu lado havia alguns pessoas claramente mortas junto com um facão sujo de sangue. Com um sorriso macabro ele parou de fazer malabarismo, deixou os pedaços de corpos no chão e se dirigiu a mim, eu estava paralisado de medo:
- Hahahaha. Engraçado, tenho aqui comigo duas pernas e dois braços, sentia falta de algo, curioso, você assim surge do nada e me fez perceber finalmente, sim, era disso que estava precisando, de uma cabeça, da sua cabeça. - Pegou o facão que estava do seu lado e tentou me atacar, desviei rapidamente e tentei, num ato de desespero, lhe acertar um golpe que acabou que atingindo o meio de seu rosto. Ele ficou ligeiramente desnorteado, tomei o facão de suas mãos e num ato de desespero o ataquei, repetidas vezes, quando percebi que ele se encontrava morto, joguei o facão longe, me curvei sobre o chão e comecei a chorar, será que estava preso dentro de um pesadelo e nunca iria acordar? Mas era impossível, era real demais.
Depois de uns cinco minutos chorando de desespero, recuperei as forças e a coragem e continue minha terrível jornada por aquela sala mal iluminada, encontrei uma pequena escada depois de um tempo andando, no fim da escada avistei uma cadeira iluminado por uma lampada que se encontrava logo acima, sobre ela havia outra caixa surpresa e por traz dessa cadeira uma porta, parei em frente a caixa que logo começou a tocar:
"1, 2, 3, 4, cuidado com quem está no quarto!
5, 6, 7, 8, O pobre menino logo estará morto!"
Dessa vez nada saiu da caixa, mas logo ao final da canção a porta deu um pequeno estralo e abriu, fui em direção a ela e entrei. Percebi que estava em uma espécie de escritório, por todos os lados haviam vidros encima de prateleiras, e dentro desses vidros havia pedaços de corpos humanos como orelhas, olhos, nariz e etc. No fundo do quarto havia uma imensa pintura que logo reconheci ser o famoso quadro "A lição de anatomia do doutor Jan Deyman" de Rembrant, claro que não se tratava da obra original, mas isso não me veio a mente naquele momento, porque detrás da mesa que ficava no fundo dessa quarto vi que havia uma pessoa sentada olhando para mim, era um homem com uma máscara de palhaço:
- Vejo que conseguiu chegar ao meu quarto , pena que não poderá ir muito longe - Enquanto ele falava eu buscava forma de escapar daquela sala, reparei que havia uma janela um pouco ao lado dele, constatei que se tivesse uma chance poderia chegar a essa janela, pular e escapar desse circo, mas como deveria fazer isso, se por meu azar havia esquecido o facão na sala anterior? Foi quando olhei para os vidros que estavam na prateleira e cheguei a seguinte conclusão, se pegasse um dos vidros, poderia jogar na direção do palhaço e nesse momento de distração tentaria fugir pela janela, enquanto pensava nesse plano ele continuava a falar.
- Pois veja, de todas as vezes fazendo esse maravilhoso show, e olha que foram vários shows, você foi a segunda pessoa a me ver, a outra foi aquela jovem garota que você viu mais cedo, esfaqueada para aquele grande e maravilhoso público, pois bem, dessa vez não terei tanta misericórdia, queria aumentar um pouco a minha coleção que tenho nesse quarto, como você pode muito bem ver nesses vidros, creio que o Senhor seria perfeito, ou melhor, um de seus ouvidos seria perfeito, veja bem, acabei de aumentar um pouco a minha coleção, creio que o Senhor encontrou a dona desses lindos olhos - e mostrou dois olhos que boiavam no vidro, cheguei a conclusão que fosse da garota da sala dos espelhos - Bom, sem mais enrolação, tem algo a dizer antes que se cale eternamente? - dito isso ele sacou um revolver e deixou por sobre a mesa.
- S-sim, tenho apenas um pedido, me dê apenas dez segundos p-para poder me preparar para m-minha morte.
- Pois bem, te darei esse tempo valioso - ergueu as mão e começou a contar levantando lentamente cada dedo - 1, 2...
Fechei meus olhos como me concentrando para a morte, quando o tempo chegou aos 5 segundos avancei rapidamente para um dos vidros que estava na estante, agarrei um e joguei em direção ao palhaço. O vidro o acertou em cheio no rosto o deixando um pouco desnorteado, fui em direção a janela e olhei para a queda que me esperava, um salto de uns 5 metros. Quando estava prestes a pular reparei que o palhaço havia se recuperado do golpe e estava segurando o revolver, ouvi um grande barulho no mesmo momento que saltei pela janela.
Ao atingir o solo senti uma terrível dor na minha mão, reparei que o tiro tinha me acertado e levado dois dedos, o anelar e o mindinho. Fui correndo sem direção por uns dez minutos, mas a constante perde de sangue me deixou muito fraco e logo desmaiei.
Não sei quantos dias passaram, nunca me informaram sobre isso, mas o que sei foi que acordei um hospital, logo que recuperei os sentidos fui visitado por delegados que queriam saber minha história, contei minha versão, mas me chamaram de louco e se recusaram a acreditar em mim, disseram que seria encaminhado rapidamente a um hospital psiquiátrico.
Naquele mesmo dia descobri a versão da história que estavam circulando na imprensa, haviam me encontrado desacordado com um facão na mão, diversos corpos estavam espalhados a minha volta, da acrobata, a moça da sala de espelhos, agora morta, e do malabarista com um revolver nas mãos e suas vítimas, mas do palhaço não havia nenhum sinal.
E o que mais me atormenta até hoje, ninguém nunca confirmou que havia acontecido um show naquela cidade, meus pais foram dados como desaparecidos e pareciam que todos haviam sofridos uma lavagem cerebral. As vitimas eram pessoas desaparecidas a alguns meses e inclusive eu havia estado desaparecido por um tempo.
Desde de então estou preso nesse hospital, não sou louco, acredite na minha história quem quiser, mas parece as vezes, quando me é permitido olhar no espelho, que não vejo o meu rosto mas sim uma máscara de palhaço.