A menina sem Olhos.
Era um corredor escuro e frio. Havia uma luz que piscava volta e meia, mas parecia que iria apagar de vez logo. E foi o que aconteceu. A escuridão deixou-me sem reação, fui andando aos pouquinhos até chutar algo. Era uma lanterna. Dei algumas batidas até finalmente ela ligar. A luz iluminou entre a escuridão uma garotinha. De vestidinho branco e longas tranças negros que iam até o ombro, ela era linda, mas sua presença ali me deixava incomodado. O que fazia ela ali? Aliás, o que eu fazia ali? Andei até me aproximar da menina que começou a cantarolar uma canção antiga:
“Brilha, brilha, estrelinha, Quero ver você brilhar, lá em cima flutuar”.
Fui dando alguns passos, der repente minha lanterna começou a falhar, entre uma falha e outra mal podia ver a menina. Dei alguns tapas pra tentar concerta-la entre um deles a luz apagou completamente. Por alguns segundos a menina se silenciou. Dei mais alguns tapas e a maldita lanterna voltou a funcionar, voltei minha atenção novamente a menina que agora estava completamente diferente. Sua cabeça estava baixa e seus cabelos negros estavam em frente ao rosto, tapando completamente sua face. Caia de seu rosto um tipo de liquido, apontei a lanterna até o piso e pude ver que era sangue. Dei mais um passo. A menina parecia soluçar baixo. Entre um soluço e outro ela dizia, “Por que? Papai, porquê?”. Ousei me aproximar um pouco mais até que a menina levantou seu rosto mostrando estar mesmo chorando. Chorando lagrimas de sangue. Prestei mais atenção e pude ver que já não tinha mais olhos. Dei um passo para trás com o susto que levei mas a menina deu um passo em minha direção. Dei outro passo e ela seguiu meu movimento. A luz da lanterna voltou a piscar e antes que ela apagasse completamente virei-me e comecei a correr. O desespero começou a tomar conta de mim, visto que a cada passo rápido que eu dava podia ouvir o barulho dos passos da menina atrás de mim. Ao fim do corredor pude ver uma escada. Desci a mesma até chegar a ponta e olhar para trás. A menina havia desaparecido. Olhei novamente em volta e percebi que estava em uma espécie de porão. Havia somente algumas caixas. Nela um retrato de um homem e uma criança. Pareciam felizes. Espantou-me o fato da criança ser a mesma que havia me perseguido a pouco tempo atrás. A menina sem olhos. Enquanto olhava o restante dos itens na caixa ouvi passos na escada. Apressei-me para tentar correr, mas não foi necessário. Não era a menina, mas sim um homem. Não qualquer homem, mas sim o homem da foto. Ele terminou de descer as escadas e nem sequer olhou pra mim. Era como se eu não estivesse lá. Andou mais um pouco até uma porta e eu o segui. Fiquei logo atrás dele. Tentei chama-lo para ver se ele sabia o que estava acontecendo ali. Nem deu bola. Abriu a porta e ascendeu a luz do pequeno quarto. Lá dentro estava ela. Encolhida em cima da cama. A menina da foto. Prevendo o que iria acontecer, ela se encolheu ainda mais. O homem abriu o cinto de suas calças e andou dois passos até finalmente fechar a porta.
Corri para tentar abri-la, mas não pude. Lá dentro podia ouvir os gritos da pobre menina.
Desesperado corri até os limites do porão para tentar encontrar alguma coisa para tentar abrir a porta do quartinho, mas a única coisa que encontrei foi a resposta. A resposta do por que eu estava ali. Vendo tudo aquilo. A única coisa que havia naquele lugar era um espelho. E no reflexo desse espelho estava um mostro; eu. Sentei-me ali no chão e pude ouvir tudo. Tudo o que tinha feito. Tudo que teria que ouvir pela eternidade. Aquele era meu inferno. E eu era o único monstro daquele lugar.