[7º Desafio Contadores de Histórias - 3º Conto] - Rainha Luciana

LUCIANA

"As fadas não são uma fantasia, mas sim uma conexão com a realidade"

Brian Froud

As fadas mais bonitas moravam nas lindas flores que um dia meu irmão,Gabriel,me ensinou a colher. Cada fada carregava o perfume e a cor da flor em que morava. Elas tinham asas de borboletas e vestidos de pétalas.

As fadas mais sérias moravam nas árvores, elas eram primas distantes das que moravam nas flores e eram também maiores em tamanho, porém menos divertidas. Essas fadas eram responsáveis por cuidar dos animais e das outras fadinhas menores. Seus vestidos, feitos de folhas e suas asas de borboletas não tinham tanto brilho quanto as outras.

Eu preferia aquelas mais novas e menores, gostava de brincar com elas de pega-pega nas campinas, apesar delas sempre ganharem por causa de suas asas.

As fadas das árvores não eram tão chatas. Com elas aprendi um pouco sobre os segredos da floresta e dos animais. Não gostavam de brincar, apenas de conversar e contar histórias. Meu irmão sempre estava por perto tomando conta de mim. Jamais via seu rosto, mas sentia seu amor, através de sua doce voz e de seus abraços. As fadas falaram que ele era um anjo sem asas e diziam que eu tinha sorte de tê-lo como irmão.

Um dia, diferente dos outros, as fadas me encararam felizes e falaram que tinham uma surpresa para mim. A chefe delas era a Fada vermelha,e esta fez um sinal para as outras que vieram carregando uma coroa toda feita de flores. Com todo cuidado do mundo colocaram esta coroa sob a minha cabeça.Outras criaturazinhas como elas vieram da floresta carregando uma capa toda bordada com as estrelas e flores do campo.

Depois de coroada, estava tão feliz que corri para os braços de meu irmão. Contei toda a maravilhosa coroação e como agora eu era rainha das fadas. Ele me abraçou e as fadas que moravam nas flores, comovidas pelo momento,nos rodearam voando. As que moravam nas árvores começaram a cantar meu nome ao vento. Aquele momento foi mágico, queria que meu irmão tivesse visto aquela magia também.

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GABRIEL

“Uma criança, cega de nascença, só sabe de sua cegueira se alguém lhe conta.”

Stephen King

Quando nasci meus pais me chamaram de Gabriel, porque achavam que eu tinha cara de anjo. Além disso, minha mãe sentiu no coração que eu viria a ser um anjo na vida de alguém. Essa previsão se confirmou quando minha irmãzinha, Luciana, nasceu.

A Luciana nasceu cega. Nos dias que seguiram ao nascimento consultamos vários médicos, mas todos falaram que era irreversível. Cada um dos meus pais agiu à sua maneira. Minha mãe, desde os primeiros meses, superprotegia minha irmãzinha, mesmo quando ela já estava maior, não a deixava fazer nada sozinha e a cercava com seus cuidados. Com meu pai foi uma história totalmente diferente.

Meu pai não gostava da Luciana. Ficava com ciúme de toda atenção que minha mãe dispensava para ela. Ele gostava de ser tratado como o Sol da casa, gostava que tudo girasse ao seu redor, quando isso mudou, sua personalidade também mudou. O clima de paz foi quebrado e foram brigas e mais brigas, até que um dia foi embora e nunca mais voltou. Ficamos melhores sem ele.

Voltando a minha irmã, nossa relação era diferente de tudo. Não a superprotegia como a mamãe, ao contrário, a ajudava a descobrir o mundo. Brincava com ela sob o olhar atento da mamãe. Íamos a campina perto de casa, descrevia toda paisagem e a guiava até as flores, para que ela as conhecesse e apreciasse o doce aroma. Com o tempo ela conseguia colher as flores sozinha, apenas guiada pelo cheiro delas.

Devido a nada de mal nunca ter acontecido enquanto estava por perto, e por necessidade de trabalhar, mamãe passou a confiar deixar minha irmã sob a minha vigilância. A deixava livre para brincar, mas sempre ficava por perto caso precisasse de ajuda, caso corresse perigo. Agia como um verdadeiro anjo da guarda, pronto para lhe oferecer ajuda.

Ficava observando minha irmã correr sozinha pela campina, conversar com as flores e simplesmente sorrir. Com o tempo descobrir que a Luciana via as coisas com os olhos da alma. Com eles é possível ver com maior nitidez do que com os olhos normais. Com o coração ela conseguia ver fadas.

Na primeira vez que ela me falou dos seres mágicos, lembro que a abracei e elogiei a sua imaginação.Mas com o tempo comecei a me questionar se era apenas imaginação. Os questionamentos começaram no dia em que ela correu até mim falando que tinha sido coroada rainha pelas fadas. Sorri para ela. Enquanto estávamos abraçados, fechei os olhos para sentir a magia do momento. De olhos fechados senti uma doce presença no local nos rodear, como se pequenas borboletas nos cercassem batendo suas pequenas asas de muitas cores. O vento nas árvores parecia chamar o nome da minha irmã. Abrir os olhos e estava tudo normal, e o vento era apenas o vento, mas algo havia mudado dentro de mim.

Mas tarde naquele dia, contei tudo para minha mãe, até a parte do vento chamando o nome da minha irmã. Após ouvir tudo com atenção, mamãe sorriu e disse para mim que talvez eu tivesse pegado carona na imaginação da minha irmã, que fadas não existem. Resumindo, todo o episodio era apenas conseqüência de minha dedicação a Luciana.

Mas as palavras de minha mãe não me convenceram, depois de tanto observar minha irmã, alguma voz dentro de mim passou a dizer que as fadas realmente estavam lá, e ainda estão. Mas a gente que não consegue as ver por causa de nossos olhos cegos pela razão.Acho que talvez os verdadeiros cegos sejamos nós, que não conseguimos enxergar o mundo mágico que a Luciana vê.

Ana Carol Machado
Enviado por Ana Carol Machado em 22/06/2015
Reeditado em 15/01/2019
Código do texto: T5285584
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