A MULHER DO CEMITÉRIO
Sete e meia da noite.
Sai do trabalho muito cansado. Não via a hora de chegar em casa e tomar aquele delicioso banho. Entretanto, estava sem carro e, obrigatoriamente, deveria voltar de ônibus.
Quando cheguei ao ponto, tive uma ingrata surpresa: os motoristas tinham entrado em greve.
Não havia táxi por perto, muito menos algum conhecido para me oferecer carona. Como não moro muito longe, resolvi ir embora a pé. Calculei que chegaria em casa as nove e meia.
No meio do trajeto, bem próximo da minha casa, havia um cemitério cujo os portões estavam abertos. Lembrei que lhe atravessando, pouparia um bom tempo de caminhada e sairia numa rua acima da minha.
Estranhei um pouco o cemitério estar aberto às oito e meia da noite, mas como estava muito cansado para raciocinar, entrei e caminhei em direção ao outro portão.
A entrada desse velho cemitério era iluminada, mas conforme fui me deslocando, o breu já tomava conta de todo jardim e dos túmulos. Não estava tão escuro, pois a luz da lua ajudava a amenizar o negrume daquele ambiente assustador.
O silêncio era inquietante e a todo momento olhava para trás para ver se tinha alguém me seguindo.
Quando cheguei no outro portão, encontrei-o fechado. Senti meu coração bater mais forte, mas não sei se batia por medo ou por cansaço. Talvez uma mescla das duas coisas.
Ficar preso naquele lugar é angustiante!
Olhei para os lados à procura do zelador, mas não vi ninguém. Na verdade, a casa do zelador ficava na entrada pela qual eu vim. Não estava disposto a voltar de maneira alguma ao meu ponto de partida.
Quando procurava por uma solução, notei algumas pedras cintilantes em cima de um túmulo. Fui vê-las o que era por curiosidade.
Peguei-as na mão e verifiquei o quanto brilhavam. Era algo incomum, coisa de outro mundo. Nunca tinha visto coisa igual! Pensei na possibilidade de ser algo raro e de alto valor.
Pensei na sorte, pensei na possibilidade de ter alguns milhões em minha conta.
Agarrei-as forte em minhas mãos e coloquei-as na mochila. Decidi pular o muro, não voltaria todo o percurso de modo algum.
Assim que coloquei as duas pernas do outro lado para pular o muro, uma mulher cadavérica, sem rosto, usando um vestido branco em farrapos e pairando sobre a lousa do túmulo, gritou.
- Devolva-me!
Com o susto que eu tive, pulei o muro, caindo de mal jeito na calçada fria e corri sem olhar para trás direto para minha casa.
Nesse dia, a madrugada foi extremamente tenebrosa. Nunca mais esquecerei!
Despertei às três da manhã com algumas pancadas dentro do meu guarda roupa. Eram pancadas fracas, cogitei na possibilidade de ser baratas. Mas baratas não batem, não dão pancada!
Então meu receio despertou.
Acendi o abajur para verificar o que era, mas as pancadas cessaram.
Assim que desliguei a luz, a porta do guarda roupa abriu com tudo e a mulher, que eu vira no cemitério, saiu de dentro dele, dizendo-me:
- Devolva-me, Devolva-me!
Fiquei lívido. Não conseguia mover meu corpo, muito menos gritar. Meu coração batia alucinadamente e gotas de suor frio caiam salgadas de medo em minha boca.
Num golpe instintivo e intrépido, alcancei o interruptor e liguei a luz. A mulher continuará lá, me pedindo para que eu devolvesse seus pertences. Perguntei-lhe, encostado na parede, por que as queria de volta. Ela, muito objetiva, disse-me:
- Não são pedras brilhantes, são meus dedos!
Estranhei essa afirmativa. Abri a mochila pronto para mostrar que eu estava certo e tive uma surpresa: encontrei pedaços de dedos de defunto no lugar das antigas pedras.
Quando fui procurar pela mulher, ela havia sumido. Olhei novamente para a mochila e os tocos de dedos também haviam se evaporado.
Lá se foi meu dia de sorte e os milhões que sonhara em ter, mas aprendi uma lição: tudo o que você achar, não foi perdido por acaso, devolva-lhe ao dono.
Não dormi o resto da noite e, também, nunca mais cruzo aquele cemitério à noite.
Obs: Nunca entendi porque aqueles dedos cadavéricos brilhavam como um diamante.